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sábado, 21 de maio de 2011

CANNES 2011: PRIMEIROS PREMIADOS FORAM DIVULGADOS

Os primeiros prêmios já foram entregues em Cannes, nessa noite de sábado:

ALMODÓVAR LEVA O PRÊMIO DA JUVENTUDE
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MOSTRA "UM CERTO OLHAR" PREMIA O COREANO "ARIRANG" E O ALEMÃO "HALT AUF FREIER STRECKE"
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"LE HAVRE", DE AKI KAURISMÄKI, LEVA PRÊMIO DA CRÍTICA INTERNACIONAL
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JÚRI ECUMÊNICO PREMIA FILME SOBRE CANTOR GÓTICO ESTRELADO POR SEAN PENN
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"LES GÉANTS" GANHA PRÊMIOS NA QUINZENA DE REALIZADORES
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E TEVE PRÊMIO PARA GAYS E CACHORROS TAMBÉM
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Confira:


ALMODÓVAR LEVA O PRÊMIO DA JUVENTUDE

"A Pele que Habito", de Pedro Almodóvar, ganhou neste sábado (21) o Prêmio da Juventude em Cannes, que foi recebido por seu irmão Agustín Almodóvar, produtor e roteirista do longa.

Getty ImagesO produtor e roteirista Agustín Almodóvar

O filme, protagonizado por Elena Anaya, Antonio Banderas e Marisa Paredes, foi escolhido como o melhor da seleção oficial por sete jovens cinéfilos de 18 a 25 anos.

Agustín Almodóvar dedicou o prêmio "ao que a juventude representa" e ressaltou que "certamente são os jovens o futuro do cinema e da sociedade".

Ele revelou em seu twitter que prefere não criar grandes expectativas para domingo, quando serão anunciados os prêmios do júri oficial:
"A concorrência é duríssima e estamos muito satisfeitos com o trabalho feito até hoje".

O prêmio da juventude é entregue há 30 anos em Cannes e é organizado pela Secretaria de Estado da Juventude em colaboração com o festival.


MOSTRA "UM CERTO OLHAR" PREMIA O COREANO "ARIRANG" E O ALEMÃO "HALT AUF FREIER STRECKE"

A primeira grande cerimônia de encerramento desta 64ª edição aconteceu hoje à noite, na Sala Debussy.

O diretor da programação, Thierry Frémaux, abriu a noite de gala convidando, para subir ao palco, os seguranças e recepcionistas com quem, nas palavras de Frémaux, "muita gente se desentendeu nestes dias".

Depois de afagar os funcionários, Frémaux chamou ao palco o júri da mostra
"Un Certain Regard", presidido pelo diretor Emir Kusturica.

O primeiro prêmio, de melhor direção, foi entregue à mulher do diretor iraniano Mohammad Rasoulof - o cineasta foi preso, no ano passado, com outros de seus colegas, como Jafar Panahi, e não pode deixar o país. Ao subir ao palco, sua mulher foi fortemente aplaudida.

Getty ImagesO diretor irtaniano Mohammad Rasoulof

A outra estrela da premição foi o diretor coreano Kim Ki-Duk, que dividiu o prêmio de melhor filme com o alemão Andreas Dresen.

Ki-Duk, para agradecer, cantou uma canção - quando o tom subiu e ele, cineasta e não cantor, deu uma desafinada, Kusturica fez uma careta no palco.

Os ganhadores do "Un Certain Regard" recebem um diploma.

O filme brasileiro "Trabalhar Cansa", exibido no "Un Certain Regard", não recebeu nenhum prêmio hoje, mas os diretores Juliana Rojas e Marco Dutra ainda concorrem à "Camera d'Or", atribuída aos realizadores que estão em seu primeiro filme.

Confira os ganhadores do "Um certo Olhar":
Arirang, de Kim Ki-Duk
Halt Auf Freier Strecke (parada em pleno vôo), de Andreas Dresen

Prêmio Especial do Júri
Elena, de Andrey Zvyagintsev

Prêmio de direção
Bé Omid É Didar (adeus), de Mohammad Rasoulof


"LE HAVRE", DE AKI KAURISMÄKI, LEVA PRÊMIO DA CRÍTICA INTERNACIONAL

"Le Havre",
do diretor finlandês Aki Kaurismäki, recebeu neste sábado o prêmio da crítica internacional - Fipresci -, que também distinguiu a produção franco-belga "L'Exercice de l'etat", de Pierre Schoeller.

Com esse prêmio, Kaurismäki tenta, pela quarta vez, ganhar a Palma de Ouro, prêmio que o júri presidido por Robert de Niro entregará amanhã e para o qual ainda não há um favorito.

GettyO diretor Aki Kaurismäki em Cannes

"Le Havre" é um conto mágico sobre emigração que, apesar de ser filmado na França, tudo nele remete à Finlândia, graças ao trabalho de iluminação tênue e parcial e o código de conduta dadaísta dos personagens.

Por sua vez, "L'Exercice de l'etat", de Pierre Schoeller, foi destaque na seção
"Um Certo Olhar" desta 64ª edição do festival, enquanto na Semana da Crítica, o júri Fipresci coincidiu com o júri oficial e distinguiu o americano "Take Shelter", de Jeff Nichols.


JÚRI ECUMÊNICO PREMIA FILME SOBRE CANTOR GÓTICO ESTRELADO POR SEAN PENN

Outro prêmio entregue em Cannes foi o do Júri Ecumênico, que premia os filmes
“paz e amor” da seleção – aqueles que melhor desenvolvem questões humanistas.

O prêmio principal ficou com o italiano “This Must Be The Place”, de
Paolo Sorrentino, estrelado por Sean Penn.

Divulgação
O ator Sean Penn, em cena de “This Must Be The Place”

Segundo o júri, o filme “é a viagem interior e a odisséia de um homem em busca de suas raízes judias e de maturidade, reconciliação e esperança”.

Mais duas menções especiais foram dadas: uma para o finlandês “Le Havre”, “uma ode à esperança, à solidariedade e à fraternidade”; e o francês “Et Maintenant on va où?”, da libanesa Nadine Labaki, sobre “os habitantes de um pequeno vilarejo dispostos a tudo para preservar a paz entre as duas comunidades que vivem no mesmo espaço”.


"LES GÉANTS" GANHA PRÊMIOS NA QUINZENA DE REALIZADORES

"Les géants", do belga Bouli Lanners, ganhou na mostra paralela
"Quinzena de Realizadores" do Festival os prêmios da Sociedade de Autores e Compositores - SACD - da França e o da Confederação Internacional de Cinemas de Arte e Ensaio - Art Cinema Award.

O objetivo do Art Cinema Award é ajudar o filme premiado a encontrar seu público na rede de 3 mil salas de Arte e Ensaio de 31 países da Europa, América Latina, Estados Unidos e África.

Por sua vez, o austríaco Karl Markovics ganhou com seu filme "Atmen" o prêmio Label Europa Cinema, que busca estimular a promoção de filmes europeus em uma rede de 816 salas de toda a Europa.


E TEVE PRÊMIO PARA GAYS E CACHORROS TAMBÉM

Cannes é um festival tão grande que tem até prêmio para o melhor cachorro que tenha aparecido em algum filme do evento: a Palm Dog, trocadilho com a Palme d’Or - Palma de Ouro.

Neste ano, não teve pra ninguém: o vencedor foi Uggy, um terrier que “interpreta” o melhor amigo de um astro decadente do cinema mudo no filme francês “The Artist”, de Michel Hazanavicius.

Confira o trailer de “Skoonheid”:


A Queer Palm, prêmio para o melhor filme gay de todo o festival, foi para o franco-sul-africano “Skoonheid”, de Oliver Hermanus, sobre um homem de meia idade e pai de família que se apaixona por um rapaz de 23 anos, filho de um velho amigo.

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Com Reuters e Getty Images

sábado, 14 de maio de 2011

CANNES 2011: "TRABALHAR CANSA" FAZ MARATONA, MAS CRÍTICA INTERNACIONAL NÃO GOSTA - PEDOFILIA E COMÉDIA, BRASILEIRO E IRANIANO, DESTAQUES DO SÁBADO

A MARATONA DO BRASILEIRO "TRABALHAR CANSA" - E CRÍTICA INTERNACIONAL NÃO GOSTA

Depois de três dias absolutamente intensos, os jovens diretores brasileiros Juliana Rojas, 29, e Marco Dutra, 31, puderam, enfim, respirar.

Aconteceu no sábado (14) a quarta projeção de "Trabalhar Cansa", único filme brasileiro da seleção oficial de Cannes 2011.

Aconteceram também as últimas rodadas de entrevistas e, além disso, foram publicadas as críticas, não só nos jornais brasileiros, mas também na imprensa internacional.

O filme teve sua primeira exibição mundial na quinta (12), durante uma sessão de gala da mostra "Um Certo Olhar" - que também tem filmes de Gus Van Sant, Robert Guédiguian e Hong Sangsoo, entre outros.

Ontem, com olheiras que denunciavam a noite passada quase em claro e a tensão acumulada, Rojas e Dutra não se cansavam de lembrar o som dos aplausos ao fim da sessão, e mais agitada que a dupla estava a produtora Sara Silveira, que já estivera com eles aqui, em 2007, apresentando o curta "O Ramo".

Divulgação
Marat Descartes e Helena Albegaria em cena de 'Trabalhar Cansa', único longa brasileiro na seleção oficial de Cannes 2011

De tanto falar nas últimas 24 horas, Silveira quase não tinha mais voz - na noite de quinta-feira, ela, que é piadista e despachada, perdeu o traquejo e foi tomada pela emoção, ao apresentar o filme no palco do Grand Théâtre Lumière.

Dutra, por sua vez, confessou, meio sem jeito, que o momento de maior nervosismo foi a passagem pelo tapete vermelho, e Rojas sentiu as lágrimas saltarem quando, no palco, foi agradecer os pais, que estavam na plateia.

A emoção à flor da pele se justifica: a mostra "Um Certo Olhar" - a segunda mais importante de Cannes depois da competição - é um daqueles funis pelos quais pouquíssimos diretores conseguem passar.

Além de concorrer ao prêmio "Um Certo Olhar", "Trabalhar Cansa" disputa o
"Camera d'Or" - que premia filmes exibidos em todas as seleções e destina-se a realizadores que estão aqui com seu primeiro longa-metragem - e o presidente do júri da Camera d'Or 2011 é o sul-coreano Bong Joon-ho, autor de "O Hospedeiro" e "Mother", filmes que, claramente, têm algum parentesco com o estilo que a dupla brasileira, desde seu primeiro curta, vem desenvolvendo.

Filme arriscado, por brincar com o cinema de gênero e desafiar as convenções do realismo - mesmo sendo realista -, "Trabalhar Cansa" foi, de modo geral, recebido com respeito, mas com algumas ponderações, pela crítica internacional.

Ajay Wissberg, da "Variety", leu o filme pela chave simbólica: para ele, o filme brasileiro traz implícita - e até explícita - uma mensagem contra os efeitos do capitalismo sobre as relações sociais e pessoais.

"Incapaz de induzir a verdadeiros calafrios [como aqueles que os espectadores dos filmes terror espera sentir] com sua filosofia econômica, o filme terá dificuldades para encontrar seu público", antevê o crítico da "Variety".

Apesar de a indefinição de gêneros - "entre o horror o comentário social" - também ter sido vista com certo pé atrás por Wissberg, ele elogiou os aspectos visuais do filmes, capazes de criar uma atmosfera de opressão, e também a música, utilizada com o máximo cuidado.

O texto da "Screen" chama a atenção para a história bem construída, "cheia de paralelos e espelhos irônicos", e para a qualidade do elenco, mas faz algumas ponderações.

"[O filme] é, simplesmente, menos envolvente e menos urgente que outros filmes de arte que lidam com o real e o sobrenatural, como 'Deixe Ela Entrar' ou 'O Hospedeiro", escreveu Lee Marshal.

Dentre os grandes veículos dedicados ao cinema, o único que parece ter realmente torcido o nariz para "Trabalhar Cansa" é a "Hollywood Reporter": para o crítico da revista, trata-se de um "filme ambicioso", que "promete mais do que é capaz de entregar".

Mas, para Juliana Rojas e Marco Dutra, o simples fato de terem merecido uma avaliação crítica desses veículos "já deve ter sido mais do que eram capazes de imaginar" para seu primeiro (e barato) filme.


DRAMA SOBRE PEDOFILIA E COMÉDIA ISRAELENSE, OFUSCADOS POR BLOCKBUSTER HOLLYWOODIANO

Dois filmes polêmicos conquistaram os holofotes no tapete vermelho de Cannes 2011 no sábado (14): o austríaco "Michael", retrato de um pedófilo do diretor Markus Schleinzer, e "Footnote", uma comédia israelense sobre a competição intelectual e familiar.

Pena que foram ofuscados pelo blockbuster da saga de "Piratas do Caribe" - veja postagem posterior a essa.

Schleinzer, que foi diretor de elenco de "A Fita Branca", premiado com a Palma de Ouro de Cannes 2009, apresenta um projeto que em momentos parece um filme do seu 'tutor' Michael Haneke e que conta também com a interpretação impressionante de Michael Fuith.

Por trás das câmeras, Schleinzer reduz quase totalmente sua narrativa a dois personagens: Wolfgang, uma criança de 10 anos, e Michael, o homem que o sequestrou, mantendo-o preso em um porão para abusá-lo sexualmente com regularidade.

O diretor e roteirista, consciente do delicado do tema, decidiu explorar toda a maldade do mundo, embora siga a máxima lei do diretor de "A Professora de Piano": ensinar o antes e o depois, mas nunca o durante.

Getty ImagesO diretor do filme "Michael" Markus Schleinzer (no centro) em Cannes, acompanhado dos atores Viktor Tremmel, Ursula Strauss, Michael Fuith, David Rauchenberger, Christine Kain e Gisella Salcher

Com fortes semelhanças ao recente escândalo austríaco envolvendo Natascha Kampusch e Josef Fritzl, "Michael" capta com fidelidade a apavorante realidade sobre crimes, segredos e por outro lado, a cultura do respeito à intimidade.

"Em 'Michael' evitei deliberadamente qualquer julgamento ou explicação moral. Simplesmente é um homem e uma criança interagindo", diz o diretor na coletiva de imprensa.

O julgamento, no entanto, foi feito pela plateia e ficou dividido: recebendo tantos aplausos como vaias, talvez pela escolha de um tema tão indigesto ou porque investe em diversos elementos fortes no início e a partir da metade da projeção, o filme se movimenta por inércia.

"Michael" talvez seja o melhor filme sobre a pedofilia até hoje, por abordar o tema de forma fria e distanciada, sem simpatizar nem condenar o personagem.

A rotina de Michael com Wolfgang, o menino, é mostrada no seu dia-a-dia: lavam o banheiro juntos, montam um quebra-cabeça, às vezes saem para algum passeio de fim de semana.

O menino às vezes vê TV.

Nenhuma cena mais explícita é mostrada.

"A pedofilia é quase sempre tema dos jornais sensacionalistas. Essa constatação me assustou e quis tentar buscar novas respostas e abordar o tema de maneira franca, o que a ficção no cinema permite", explicou o diretor.
"Reconhecer a existência do pedófilo no meu filme não significa nem perdoar, nem condenar. Isso é tarefa da justiça".

O estilo seco e cortante do filme remete diretamente ao mais célebre diretor austríaco, Michael Haneke, para o qual Schleinzer trabalhou como diretor de elenco em filmes como

"A Professora de Piano".


Foi ele também o responsável pela preparação impecável das crianças do filme "A Fita Branca", de Haneke, que venceu a Palma de Ouro em Cannes em 2009.

Seu primeiro filme é uma grande estreia e deve marcar seu batismo de fogo nas trilhas negras e tortuosas do cinema austríaco.

Confira o trailer de "Michael":


Em paralelo, está a exibição da comédia israelense "Footnote", dirigida por Joseph Cedar, que também não foi recebida com alvoroço porque também teve suas razões para a reprovação e para a admiração.

Cedar, que vinha de uma carreira de filmes politizados e premiados - como "Beaufort", sobre a Guerra do Líbano - aguça o gênero e se arrisca em outro tipo de guerra, entre um pai e um filho, pelo sucesso profissional em um mesmo campo: o estudo do Talmude, peça central da literatura rabínica.

Por assim dizer, uma novela de Philip Roth, mas com menos silêncios, o choque de egos surge quando o pai recebe por engano os cumprimentos do primeiro-ministro por ter conseguido um Prêmio Israel que na realidade tinha sido outorgado a seu filho.

Por sua vez, a pouca ambição formal cede espaço aos diálogos engenhosos e a um brilhante retrato da competição que se esconde após todo grupo intelectual.

Confira teaser de "Footnote":



BRASILEIRO QUE CUSTOU R$ 74 MIL É EXIBIDO NA SEMANA DA CRÍTICA

"Permanências",
média-metragem de 34 minutos realizado, com R$ 74 mil pelo brasileiro Ricardo Alves Júnior, foi exibido na tarde de sábado (14) na Semana da Crítica, uma das mostras paralelas do Festival de Cannes e considerada uma janela para a produção experimental e para a descoberta de novos diretores.

O filme terá ainda uma segunda exibição no domingo (15).

Divulgação

Cena de "Permanências"

Confira entrevista do diretor à Folha de S.Paulo:


Folha - Como você inscreveu seu filme e como soube que tinha sido selecionado?

Ricardo Alves Júnior - O filme estreou em novembro de 2010 no Janela Internacional de Cinema do Recife, onde ganhou o prêmio de melhor filme. Nesse mesmo festival, Bernard Payen, programador da Semana da Crítica, viu o filme e sugeriu que eu me inscrevesse em Cannes.
Fiquei sabendo da seleção através de um e-mail, dez dias antes do anúncio oficial. Foram alguns dias de sigilo. Contei só para os parceiros com quem fiz o filme. Ficamos todos muito felizes.
Cada vez mais, o média-metragem perde o espaço de exibição. Essa seleção para Cannes pode fazer com outros festivais de curtas repensem seu critério em relação a duração dos filmes.

Os festivais internacionais são mais abertos a esse tipo de filme que o Brasil?

Meus curtas anteriores "Material Bruto" e "Convite para Jantar com o Camarada Stalin" passaram em festivais importantes como Rotterdam, Oberhausen e Paris Cinema. Comecei a ver então como o interesse pelo cinema brasileiro autoral vinha crescendo.
Só entre os mineiros, tivemos, neste ano, filmes na competição de Rotterdam ("O Céu sobre os Ombros"), na Seção Fórum do festival Berlim ("Os Residentes"), o curta "Ensolarado" no programa Geração também em Berlim e, ainda, uma retrospectiva da Marília Rocha com três longas no festival Vision de Reel.
Mas na maioria dos casos, nosso cinema é mais conhecido fora do Brasil do que aqui dentro. Ainda existe uma nebulosa questão política que tenta afastar o que estamos chamando de cinema autoral brasileiro do próprio público brasileiro, criando uma dicotomia entre mercado e cinema de autor.
Esse cinema está conquistando um mercado internacional e acredito que já é hora do Ministério da Cultura criar uma política interna de distribuição desses filmes que, infelizmente, têm muita dificuldade de chegar ao público brasileiro.
E só assim, tendo espaço para ser visto dentro do próprio país, ele poderá encontrar a sua voz.

"Permanências" foi filmado no conjunto habitacional IAPI, em Belo Horizonte. Por que esse lugar te interessou?

Faz quase 9 anos que me relaciono com esse lugar. Meu primeiro curta, "Material Bruto", foi filmado lá. Esse conjunto habitacional é, para mim, como "um navio naufragado no centro da cidade". Quis fazer um filme que proporcionasse a experiência de habitar o tempo desse espaço fantasmagórico. Para filmar, aluguei um apartamento no conjunto e, com a equipe, morei lá por 45 dias.

Que tipo de esperança ou certeza a vinda para Cannes te dá?

Um curta ou um média metragem, já pelo formato, tem sua dificuldade de projeção. Suas únicas janelas de exibição são os festivais ou a venda para TV e internet. Cannes dá uma grande visibilidade para o meu trabalho.
Além disso, como se trata de um filme de perfil experimental, que propõe uma relação narrativa com o espectador diferente do padrão proposto pela TV, a seleção me dá confiança para seguir apostando numa linguagem própria.


CINEMA IRANIANO MARCA PRESENÇA, COM "GOODBYE"

A reivindicação da liberdade artística no Irã, que está se transformando em uma triste rotina nos festivais de cinema, ganhou espaço neste sábado (14) em Cannes com a projeção de "Goodbye", de Mohammed Rasoulof, outro cineasta preso em seu país.

Na presença da protagonista Leyla Zareh e da esposa de Rasoulof, o filme - que aborda temas proibidos no Irã, como o aborto - foi aplaudido na seção "Um Certo Olhar".

"Vim para passar a mensagem do meu marido, que dedica este filme a todos os presos do Irã",
declarou a mulher do cineasta, enquanto Zerah acrescentou que espera "que esta história acabe bem".

Rasoulof foi acusado junto a Jafar Panahi, de quem foi assistente de direção, por conspiração e propaganda contrária à ditadura de Mahmoud Ahmadinejad.

Em "Goodbye" não há muito espaço para o otimismo, e se a jurada Linn Ullmann dizia na abertura do festival que "muitos membros de júris de arte são políticos sem ser, já que uma história individual pode criar empatia e solidariedade no espectador", no caso do Irã é inevitável que a política interfira de maneira brutal em cada filme produzido no país.

No longa, a personagem principal é uma advogada que tenta conseguir durante toda a trama uma permissão para deixar o país, no entanto precisa da autorização do marido, que se encontra no exterior.

"Se alguém se sente estrangeiro em sua própria terra, é melhor que se sinta estrangeiro em outro país", assegura a personagem em um momento do filme.

A homenagem ao cinema iraniano terá continuidade no próximo dia 20 com a projeção de "This Is Not a Film", de Panahi, que será exibido enquanto o cineasta aguarda o veredicto do tribunal de apelação, após ter sido condenado a seis anos de prisão e ser impedido de trabalhar como cineasta durante 20 anos.

Thierry Frémaux, diretor do Festival de Cannes, e Gilles Jacob, presidente do evento, asseguraram ao anunciar a inclusão destas produções iranianas na programação que "o filme de Rasoulof e as condições nas quais foi feito e o diário de Panahi sobre os dias de sua vida como artista impedido de trabalhar são, por si só, uma resistência às suas condenações".

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Com Reuters, Getty Images, UOL, EFE e Folha de S.Paulo

sexta-feira, 13 de maio de 2011

CANNES 2011: A QUINTA FEIRA TEVE DRAMA SOMBRIO, HOMENAGEM A FAYE DUNAWAY, NOVO J.J.ABRAHAMS, ANGELINA JOLIE E UM SURPREENDENTE BRASILEIRO

DRAMA SOBRE ATAQUE EM ESCOLA PERTURBA FESTIVAL

Crueldade gratuita e uma dinâmica familiar distorcida foram o foco das atenções em Cannes nesta quinta (12), com a exibição de "Precisamos falar sobre Kevin", drama sombrio em que Tilda Swinton representa a mãe de um filho sádico.

O filme da britânica Lynne Ramsay - que conta a história de Eva, mãe de um jovem americano que um dia cometerá um massacre em seu colégio - estremeceu o festival.

Arrastando Cannes para um clima mais pesado no segundo dia do evento, a obra abalou os críticos com seu retrato intransigente de uma relação mãe-filho caracterizada não por amor, mas por crueldade e ódio mútuos.

Tensão e ansiedade marcam o filme desde o início: a história começa com a personagem de Swinton, a norte-americana Eva, tentando juntar os cacos de sua vida após uma tragédia e enfrentando as reações de revolta de seus vizinhos.

Enquanto sua casa é vandalizada com tinta vermelha e as pessoas lhe dão tapas no rosto quando ela passa na rua, Eva se isola e recua para seu passado, recordando sua vida familiar em uma série de flashbacks extensos.

Ramsay mostra o nascimento do filho de Eva e o desenvolvimento dele, de bebê com cólicas para garoto taciturno - representado por Ezra Miller - que parece determinado a punir sua mãe de todas as maneiras possíveis, desde derrubar sua comida no chão e matar o hamster de estimação de suas irmãs, até o clímax de violência do filme.

DivulgaçãoCena de "Precisamos Falar Sobre Kevin"

Apesar de algumas cenas de horror enquadradas cuidadosamente, Ramsay disse que a intenção do filme não foi mostrar violência, mas tratar do tabu psicológico de uma dinâmica mãe-filho disfuncional.

"Às vezes uma criança nasce e você não sabe quem ela é", disse a diretora a jornalistas em coletiva de imprensa.
"O filme não é sobre um ataque a uma escola, é sobre um relacionamento mãe-filho. É sobre o sentimento de culpa."

Confira o teaser 02 do filme - tem mais no YouTube:


John C. Reilly, ator norte-americano mais conhecido por seus papéis em comédias, contracena convincentemente com Swinton no papel do marido de Eva e defensor do jovem Kevin, com quem parece ter uma relação pai-filho normal.

Adaptado do romance homônimo de 2003 de Lionel Shriver, o filme é sombrio e de ação lenta, com diálogos esparsos e atos de violência que ficam implícitos, mais do que mostrados na tela.

Ezra Miller, 18, conhecido por sua atuação no seriado de TV "Californication", disse que não teve dificuldade em representar o papel de um adolescente assassino.
"Me sinto horrorizado porque sinto de fato alguma conexão com Kevin", disse ele.

As reações imediatas ao filme foram mistas: algumas pessoas na platéia abandonaram o cinema muito antes do final do filme, enquanto outras aplaudiram fortemente ao final.

Dominado por cores fortes, uma montagem pulsante e um sentido muito forte de que tudo é doloroso, mas nada se explica, o filme fez bonito no festival - e Swinton já é grande candidata à Palma de atriz.


FESTIVAL HOMENAGEIA DIVA FAYE DUNAWAY, COM CÓPIA RESTAURADA DE UM CULT EM QUE ELA BRILHA

Ainda na quinta (12), o Festival homenageou a atriz Faye Dunaway com a exibição de uma cópia restaurada de "Puzzle of a Downfall Child", dirigido por Jerry Schatzberg.
Juntos, os dois artistas apresentaram ao público a produção de 1970, que a princípio não recebeu reconhecimento, sobretudo nos Estados Unidos, mas que após sua estreia na França, se transformou em um filme cult.

"O cinema é uma arte aqui", proclamou a estrela americana que, em francês perfeito, manifestou seu agradecimento pela exibição do filme, dentro do programa de clássicos que o evento de Cannes propõe para divulgar obras-primas da sétima arte.

"Cannes é onde venho para ver arte", confessou a atriz, conhecida por obras como "Chinatown"(1974), "Bonnie and Clyde - Uma Rajada de Balas" (1967), "Rede de Intrigas (1977), que lhe deu o Oscar de Atriz, e "Don Juan De Marco"(1994) - onde teve como parceiros Jack Nicholson, Warren Beatty, William Holden e Marlon Brando, respectivamente.

Vestida de preto e com cabelo solto, a atriz mantinha assim o tom cromático dos outdoors e paineis com sua fotografia dos anos 1970, que estamparam os cartazes dessa edição do Festival - veja o cartaz de Cannes 2011 no selo que abre essa postagem.

Exposay.comA Diva faye Dunaway na última quinta em Cannes

"Puzzle of a Downfall Child" conta a história da ex-modelo Lou Andreas Sand - papel de Faye - que já foi muito famosa no passado e vive na reclusão.

Um dia, o fotógrafo de moda Aaron Reinhardt - interpretado por Barry Primus -, que já tinha sido seu amante e tornou-se diretor de cinema, faz uma visita a ela em sua casa isolada e, ao gravar suas conversas sobre as memórias da artista, ele espera ajudar Lou a reorganizar seus pensamentos e focar na realidade.

"A má recepção da crítica e público nos Estados Unidos provocou o pânico na Universal, que os obrigou a lançar uma nova versão, com um prólogo explicativo", comentou Pierre Rissient, produtor e assistente de direção.

Schatzberg nunca esteve satisfeito com esta decisão do estúdio e, por isso, a cópia que a partir de agora recupera a obra do diretor americano, elimina o extra.


NOVO FILME DE J.J.ABRAHAMS TEM CARA DOS ANOS 80, MAS TECNOLOGIA DE 2011

O evento prometia 40 minutos para a imprensa do novo filme de J.J. Abrams,
"Super 8" - com produção de Steven Spielberg, que estreia dia 12 de agosto no Brasil - ,mas no final foram apenas 20 minutos exibidos num cinema em Cannes.

O próprio Abrams apareceu num vídeo antes das cenas, para avisar que não pôde vir ao litoral francês porque ele e sua equipe "estão dando duro em Los Angeles para terminar o filme".

Nas cenas mostradas, o garoto Joe Lamb - Joel Courtney -, morador de uma pequena cidade do Ohio em 1979, acaba de perder a mãe num acidente, e seu pai - Kyle Chandler, da série "The Early Edition" - pensa em colocá-lo num internato.

Mas Joe se recusa, principalmente porque quer ajudar seu amigo, o gordinho Charles, a terminar um filme que ele está fazendo com uma câmera Super-8.

No elenco do filme dentro do filme, está a linda Alice - Elle Faning, de "Um Lugar Qualquer" -, cobiçada por toda a turma.

Enquanto eles gravam uma cena de amor, um acidente monumental faz um trem de carga colidir com o caminhão que carrega uma estranha criatura.

Em outra cena, a criatura faz um ataque-relâmpago num posto de gasolina, mas nós mal conseguimos vê-la - a câmera acompanha um vendedor da loja de conveniência, que está com seu walkman ouvindo Blondie no último volume e só percebe o ataque depois que o monstro foi embora.

Confira o primeiro trailer disponível de "super 8":


Abrams, produtor de "Lost" e diretor da revitalização da franquia "Star Trek", parece retomar a criatura destruidora de outro filme que produziu, "Cloverfield - O Monstro", mas o grande diferencial de "Super 8" é a fotografia e a atmosfera dos filmes da produtora Amblin de Spielberg, que fizeram a alegria das crianças nos anos 80, como "E.T.", "Os Goonies", "O Milagre Veio do Espaço" e "De Volta para o Futuro".

Ou seja, "Super 8" será um filme dos anos 80 com a tecnologia de 2011, nostalgia pura para quem tem mais de 30 anos.


ANGELINA JOLIE E DUSTIN HOFFMAN E JACK BLACK PARARAM CANNES PARA APRESENTAR "KUNG FU PANDA II"

Angelina Jolie, Dustin Hoffman e Jack Black - que emprestam suas vozes aos protagonistas de "Kung Fu Panda II" - atraíram as atenções nesta quinta no Festival, onde o filme, última produção do estúdio Dreamworks, foi apresentado apenas para um grupo de jornalistas.

Getty ImagesAngelina Jolie e Jack Black posam para foto com Po, de "Kung Fu Panda 2", na última quinta em Cannes

Agora, o gordo e desastrado panda que conquistou corações no primeiro longa-metragem - que arrecadou 633 milhões de dólares - busca sua "paz interior" para poder combater o mal.

Vestida com um vestido de cor clara, Jolie, que vive "a tigresa" no filme que será lançado nos Estados Unidos em junho, falou da busca pela paz interior na entrevista coletiva à imprensa.

"Para mim, a paz interior reside em saber que meus filhos e as pessoas de que gosto estão bem", disse a estrela, acompanhada na coletiva de imprensa em um luxuoso hotel de Cannes por Hoffman, Black e pela diretora do filme, a chinesa Jennifer Yuh Nelson.

Confira o trailer do filme:


"A paz interior é uma longa viagem, que todo mundo faz. Você pode alcançá-la, depois a perde, e procura de novo. A paz interior é, sobretudo, as pessoas que você quer e que querem você. Saber que estão saudáveis, que estão bem, isso é o que me dá paz", disse.

"Que paz interior?", perguntou Hoffman, vencedor de dois Oscars.
"Nunca tive tanta paz como agora, diante de centenas de câmeras e jornalistas, e sentado ao lado de Angelina", ironizou o ator, que dá voz ao mestre supremo das artes marciais, Shifu.

A atriz chegou a Cannes acompanhada de seus seis filhos e seu marido, Brad Pitt, que apresentará o filme "A Árvore da Vida", de Terrence Malick.

"Nós gostamos de estar aqui. As crianças adoram", disse a atriz, que revelou que sua animação favorita é "A Pantera Cor-de-Rosa".


BRASILEIRO "TRABALHAR CANSA" SURPREENDE CANNES

O Brasil está presente em Cannes com o filme "Trabalhar Cansa", primeiro e surpreendente longa-metragem de Marco Dutra e Juliana Rojas, apresentado nesta quinta (12) na mostra "Um Certo Olhar", a segunda seção mais importante do maior festival do cinema mundial.

Os diretores, que já estiveram em Cannes em 2004 e 2007, com dois curtas-metragens, voltaram agora com um filme que começa contando uma história do mundo do trabalho e se converte paulatinamente em uma história de terror, que deixou a sala sem fôlego.

Produzido por duas brasileiras, Sara Silveira e Maria Ionescu, o filme conta a história de Helena, uma mulher de classe média de São Paulo que realiza um velho sonho: o de abrir um pequeno mercado, e por isso aluga um local abandonado.

Esta conquista - que coincide, no entanto, com a perda do emprego de seu marido, o que fragiliza a família - dá passagem a uma história que mescla de maneira sutil o mundo do fantástico e do horror.

Confira o trailer de "Trabalhar Cansa":


"Queríamos contar uma história que mostrasse a importância do poder econômico, e como o mundo do trabalho afeta o mundo pessoal", afirmaram os diretores em uma entrevista concedida à AFP em uma esplanada do Palácio dos Festivais, em frente ao mar Mediterrâneo, repleto de luxuosos iates.

"O horror foi se infiltrando pouco a pouco na história", disse Rojas, que acrescentou que ela e Marco Dutra, que trabalham juntos há dez anos, gostam muito do gênero de filmes de terror e de suspense, cujo maior expoente é Alfred Hitchcock.

Os jovens diretores - cujo curta-metragem "Um Ramo" ganhou há quatro anos em Cannes o prêmio do Júri, na sessão da Semana da Crítica - também expressaram sua admiração pelo escritor americano Edgar Allan Poe, mestre da literatura de terror, e também pelos autores argentinos Jorge Luis Borges, Bioy Casares e Julio Cortázar.

Mas Rojas e Dutra advertiram que o que interessa não é o gênero em si, mas como "se infiltra" em outros aspectos da vida, como o do emprego e da desocupação.

Os cineastas, que se conheceram na Universidade e desde então trabalharam sempre juntos, advertiram, no entanto, que não querem aplicar os clichês do cinema de horror, mas sim explorar melhor a relação entre o protagonista e suas próprias caraterísticas de personalidade mórbida.

"O que nos interessa é de que maneira um gênero como o fantástico, o do horror, pode ser utilizado como filtro para discutir, iluminar outros temas", disse Dutra.

A primeira sessão de "Trabalhar Cansa" lotou uma das salas do Festival, onde boa parte dos espectadores eram portadores de convite do festival, entre eles professores e estudantes franceses - uma segunda sessão oficial, com apresentação dos diretores, elenco e equipe, também aconteceu na quinta.

O filme recebeu aplausos discretos ao final da sessão e concorre aos prêmios da mostra, cujo presidente este ano é o cineasta sérvio Emir Kusturica.

Do Brasil apresentam-se nesta edição do Festival, que termina no dia 22 de maio, o curta-metragem "Duelo Antes da Noite", de Alice Furtado, que será apresentado na sessão Cinéfoundation, dedicada a produções universitárias.

Entre os 14 filmes selecionados para "Um Certo Olhar", cujo prêmio será anunciado no dia 22 de maio, figuram também "Bonsai", de Cristián Jiménez (Chile), "Miss Bala", de Gerardo Naranjo (México), "Restless", de Gus Van Sant (EUA), "The Hunter", de Bakur Bakuradze (Rússia) e "Arirang", de Kim Ki-duk (Coreia do Sul).

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Com Agências Reuters, EFE, AFP e UOL