sábado, 8 de maio de 2010

MÃE

Mãe:

Um dos primeiros momentos nossos que eu me membro, eu era bem pequeno, fomos tomar um ônibus, estava chovendo e o filho da puta do motorista não abriu a porta.

Você nem deve se lembrar, mas eu fiquei até com febre, fiquei remoendo aquele momento por muito tempo, meses até, sempre a pensar: “Como é que ele – o motorista – pôde tratar a MINHA MÃE assim?”

Minhas festas de aniversário. Eu morrendo de falta de ar, mas a casa cheia, a comida e a bebida.

As muitas idas aos médicos.

As perdas de pessoas queridas, os golpes de vida, de morte, as doenças do corpo e da alma.

E você sempre comigo, do lado.

Outra lembrança que sempre falo para quem quiser ouvir - e que ficou eternizada num depoimento que eu dei ao laboratório Merck - aconteceu às 13 horas do dia 7 de julho de 1995:
Estava internado no HC, minha cama rodeada por um sem número de médicos residentes que tinham acabado de me diagnosticar.
Mas eu só tinha olhos para você, que na porta da enfermaria, aguardava serena o começo do horário de visita.
Dava pra ver o seu rosto pelo vidro redondo da porta.
Pedi imediatamente aos médicos que me deixassem a sós com você.
Era mais um momento que deveria ser dividido entre mãe e filho, ninguém mais.
E você me disse: “Vamos enfrentar tudo isso, como sempre enfrentamos tudo. E eu estou aqui”.

Esses momentos de cumplicidade, de amor entre mãe e filho, infelizmente se perderam no tempo, muito mais por mim do que por você.

Deve ser muito mais difícil ser uma mãe POR OPÇÃO, como você é pra mim, do que ser uma mãe geradora, só.

Como pra mim é muito mais difícil ser um filho ESCOLHIDO, do que ser um filho gerado, só.

Você tem um temperamento reservado, prefere nada dizer de fundamental, prefere berrar as pequenas coisas, os apêndices, as arestas fácilmente aparáveis, e, por isso, insignificantes.

Eu até usei essa solução de vida por muito tempo, mas, acredite, não fui feliz com ela.

E acredito que você também não seja.

Hoje em dia, eu acredito em muita pouca coisa. Acredito EM MIM, que eu escrevo bem, que eu seja uma boa pessoa e, principalmente, que as pessoas que convivem comigo sabem disso, pois elas me dizem isso, a todo momento. E é nisso que eu acredito.

Enfiar a cabeça no buraco, não ver – ou fingir não ver – o que se passa ao nosso redor, acredite, dá certo até a página dois, e nossos livros de vida, porém, tem páginas três, quatro, uma infinidade de páginas.

Não dá pra não ver e ficar calado.
Isso só faz mal, à nossa saúde, às pessoas que convivem conosco – que vendo de fora, percebem no ato - e que verdadeiramente se importam conosco, e principalmente, a nós mesmos.

De uns tempos pra cá, resolvi sair das sombras e ir para a luz, de me posicionar a respeito de tudo o que me cerca.

E com certeza tenho sido muito mais feliz.

Hoje, não guardo mágoas, rancores e problemas passados.

Mas, vendo o mundo e as pessoas à minha volta com outros olhos, consigo perceber a violência, o preconceito, as cabeças podres, pequenas, mesquinhas e a serviço só delas mesmas, que infelizmente continuam me (nos) cercando, não só nos jornais, nas ruas, não só na casa do vizinho, mas também próximos, muito próximos de nós.

E eu não posso ser cúmplice de tamanha violência, tamanho despropósito, tamanho vampirismo real e imediato.

Enfim, entenda a conversa que eu tive ontem com você como um grande, um enorme ato de amor, de um filho que te ama profundamente, incondicionalmente, e quer, acima de TUDO, de TODAS AS COISAS, o seu bem, e a sua felicidade.

Grande beijo.

Feliz Dia das Mães.

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