O casal protagonista de ''Ensina-me a Viver'' (1971) é, provavelmente, o casal mais improvável já visto, o que ainda mantém a força questionadora dos costumes nos dias atuais.
O filme - que ganha caprichada versão em DVD da Paramount - , mostra a união entre Harold (Bud Cort) e Maude (Ruth Gordon).
Harold é um adolescente introvertido e que tem tendências suicidas - ou, pelo menos, tem como principal passatempo simular a sua própria morte.
Maude, por sua vez, é uma mulher esperta e elétrica, à beira de completar 80 anos, que tem como hábito roubar automóveis por diversão e que toma para sí a aventura de salvar uma árvore.
Foto: Divulgação Paramount Pictures
Harold conhece Maud, em cena do filme
Está feita, assim, a troca: aqui, é a morbidez de um personagem jovem que é construída para ser complementar à vivacidade de uma mulher velha.
Assim, a relação afetiva que acontece entre Harold e Maude ganha um viés de realidade, que atraiu milhares de espectadores aos cinemas.
O efeito desse filme baseado num amor improvável foi bem contado por uma das maiores críticas de cinema de todos os tempos: a americana Pauline Kael controu a história de um jovem que teria visto ''Ensina-me a Viver'' "apenas" 138 vezes em 1974.
A estratégia para conseguir esse efeito foi ''desnaturalizar'' o nosso olhar.
É assim que as seqüências em que Harold simula sua morte podem ser vistas, na primeira metade do filme de Hal Ashby - diretor de um dos filmes ícone da minha vida, ''Amargo Regresso''(1978), onde ele também conseguiu extrair interpretações acima da média de Jane Fonda e John Voight.
O filme vai retirando toda a carga dramática e trágica de uma situação de morte para torná-la um evento banal.
E ao fazer isso, a morte se torna cômica, e os suicídios simulados de Harold vão perdendo seu impacto e se tornando pouco mais que meras situações engraçadas.
''Ensina-me a Viver'' transforma a morte em uma celebração da vida com humor negro - coisa que eu a-do-ro - e ela perde o seu valor moral para se tornar pouco mais que uma casualidade.
O mesmo acontece com o romance entre Harold e Maude, e a formação do improvável casal também é um golpe em nossas esperanças por ter uma perspectiva pessimista, já queé aqui que reside o humor negro da trama.
E repito aqui o mais legal do filme, a troca de postura de vida entre eles: o espírito libertário é encarnado por uma personagem envelhecida, o que reforça a impressão de inevitabilidade da morte, e o jovem é retratado como uma pessoa desinteressada e apática, que tem fixação pela sua própria morte.
Para a crítica Kael, ''Ensina-me a Viver'' tem uma mensagem com tom de ''aberração'' por unir a ''flácida assexualidade de Harold'' com a ''piração de Maude''.
Para Ashby, os anos da contracultura teriam sido uma aberração.
Meses atrás, fui ao teatro ver esse texto representado maravilhosamente bem por Glória Menezes como Maude, e um ator de quem eu agora não lembro o nome, como Harold.
Sen-sa-cio-nal.
Visto com olhos que viveram esse tempo, o filme me sugere o fim do espírito de contracultura e de ideais comuns da época, como o amor livre, capta o anoitecer do ambiente libertário dos anos 60 na história de um amor impossível que se torna realidade mas que é condenado pela passagem do tempo.
É como se a década de 60 tivesse sido um longo, festivo dia do "salve-se quem puder", do "tudo pode" , e que agora chegava ao fim.
"Ensina-me a Viver"
Título original: Harold and Maude
Diretor: Hal Ashby
Elenco Principal:
Ruth Gordon
Bud Cort
Vivian Pickles
Gênero: Comédia de humor negro
Duração: 91 minutos
Ano: 1971
Cor: Colorido
País: EUA
*****
DADOS DO DVD
Ano: 1971
Distribuidora: Paramount
Idioma: Inglês
Legendas: Inglês e português
Extras: Dois trailers
COTAÇÃO KLAU:
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