terça-feira, 22 de maio de 2012

FESTIVAL DE CANNES: "VIVEMOS EM UM MUNDO VIOLENTO E TEMOS DE FILMA-LO", DIZ BRAD PITT


"Killing Them Softly", novo filme estrelado por Brad Pitt, faz um retrato sombrio do sonho americano, misturando uma divertida e violenta história de mafiosos com uma crítica escancarada à incapacidade dos políticos em resolver a crise econômica.

O filme se passa em uma cidade norte-americana não-identificada, onde a crise econômica chegou com força: há casas abandonadas, lojas fechadas e bandidos de todos os níveis tentando sobreviver.

Pitt é também coprodutor da obra, selecionada para a competição oficial do Festival de Cannes.

O ator interpreta o inclemente pistoleiro Jackie Cogan, chamado por uma quadrilha mafiosa para eliminar um grupo de bandidos que assaltou uma mesa de pôquer.

O título - "matando-os suavemente" - se refere à insistência do personagem em evitar dores e sofrimentos desnecessários na hora das matanças.

A direção é de Andrew Dominik, neozelandês com quem Pitt já trabalhara em "O Assassinato de Jesse James Pelo Covarde Robert Ford".

A mensagem política do filme é inescapável: sempre há noticiários sendo vistos ou ouvidos em bares e carros, e o debate invariavelmente é sobre a crise financeira, o fracasso político, a ganância e o fim dos sonhos.

Barack Obama, John McCain e George W. Bush aparecem na campanha eleitoral de 2008 fazendo promessas de resgatar a economia e salvar os ideais que alicerçam a nação.

Já no final, Cogan dispara críticas a Thomas Jefferson, principal autor da Declaração de Independência dos EUA, a quem o personagem chama de mentiroso e hipócrita.
"Vivo na América e na América você está por sua conta", declara Cogan. 
"A América não é um país, é só um negócio."

Mas, numa entrevista coletiva após a sessão do filme para a imprensa, Pitt disse que não pretendia que o filme seja visto como um libelo anti-Obama.
"Eu me inclino mais para a esquerda, e quero entender minha própria tendência, então não fico contra personagens que têm visões diferentes da minha própria. Na verdade, tenho (Jefferson) em altíssima conta."
Getty Images
Brad Pitt, na entrevista coletiva em Cannes

Pitt criticou a "tóxica" divisão política nos EUA, onde o debate "tem mais a ver com o partido vencer a discussão do que a respeito das questões propriamente ditas. É um problema sério".

O ator defendeu o uso da violência no cinema para contextualizar melhor sua existência no mundo real - assim como faz "Killing Them Softly".

"Não sei se podemos rodar a violência de uma forma romântica, mas é preciso ilustrar essa realidade", afirmou Pitt e, tanto ele como o diretor Dominik defenderam que os filmes devem mostrar o mundo como é na atualidade.

Com cabelo comprido, muito sorridente e se queixando do horário da coletiva, Pitt se mostrou taxativo ao afirmar que não se sente incomodado em interpretar personagens violentos.
"Seria muito pior interpretar um personagem racista, me perturbaria mais do que viver um matador de aluguel", afirmou o ator.

Dominik contou que decidiu atualizar a história - baseada em um livro ambientado nos anos 70 - e situá-la em um momento mais atual, passando a utilizar a crise econômica como um elemento que condiciona tudo na sociedade, incluindo o pagamento dos matadores de aluguel.
"Senti que era uma história sobre o capitalismo", explicou o diretor, que ressaltou que neste momento todo o mundo está motivado pelo dinheiro.
Divulgação
Brad Pitt, em cena de "Killing Them Softly"

Nesta busca pelo dinheiro, os personagens fazem o que for preciso para conquistá-lo.
"Não entendo o problema que há com a violência nestes momentos, já que o filme explica como sobreviver em um mundo cheio de concorrência", disse o diretor.

De acordo com Dominik, as atuais críticas contra a violência em alguns livros infantis, como os clássicos dos irmãos Grimm, são contraditórias - isso porque, segundo o diretor, a própria sociedade prepara as crianças para viverem em um mundo que é muito mais violento que qualquer ficção.

E justamente essa relação entre violência e crise econômica que reuniu Pitt e Dominik em um novo projeto juntos.
"Buscávamos histórias sobre nosso tempo e sobre que somos. Mas, a crise econômica é o que ocupa as capas dos jornais atualmente", ressaltou o ator.

"Vivemos em um país muito dividido, e o filme mostra personagens com opiniões estranhas, diferentes e com as quais o ator não está necessariamente de acordo. Uma apologia do individualismo e do capitalismo poderia ser muito perigosa", completou.

Apesar da violência atual e da presente no filme, Pitt assegura que os "Estados Unidos é um país extraordinário, com muitas dimensões e sentimentos - como a integridade e a justiça.
No entanto, é preciso proteger seus ideais com cuidado, especialmente em países mais poderosos", declara.

E nesta defesa de ideais entra também o equilíbrio entre o cinema comercial e o artístico.
"É a eterna batalha entre arte e comércio", afirmou o ator, que considerou que ambos os lados necessitam um do outro para avançar.
"Trata-se de uma estreita relação de simbiose que nunca desaparecerá".

Ray Liotta,James Gandolfini, Scoot McNairy e Ben Mendelson acompanham Pitt neste filme, que, por sua vez, ainda consegue trabalhar alguns toques de comédia e ser pretensioso em seus planos, desfoques e conceitos artísticos.

É uma história que busca mostrar que, com a atual crise econômica, um ato de delinquência pode ocorrer em qualquer parte, um problema real que é refletido no filme.

"Este ano teremos coisas mais negativas que no passado", assinalou Pitt, que se mostrou pessimista ao falar que o panorama é "cada vez mais obscuro".

Aliás, essas palavras poderiam ter sido ditas por seu personagem no filme, Jackie Cogan, que fecha a história com outra ótima frase: "Os Estados Unidos não é um país, é um negócio".

O ator não pareceu surpreso quando a entrevista se desviou para sua vida pessoal: afastando os rumores de que apareceria com a mulher, Angelina Jolie, no tapete vermelho de Cannes, ele disse que a atriz nem está na cidade.

Também sobre os rumores de que iria em breve oficializar sua união com ela, ele afirmou que o casamento não tem data.
"Ainda espero que possamos resolver nossa igualdade de casamento nos Estados Unidos antes dessa data", afirmou, numa alusão ao seu apoio - incondicional - ao casamento homossexual.

O casal já deu várias declarações de que só oficializaria sua união quando o casamento entre iguais fosse aprovado em todo os EUA.

Confira o trailer de "Killing Them Softly":
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Com Mike Collett-White, da Reuters, e Alicia García de Francisco, da EFE em Cannes

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