"Acordem, meninas. São 7h, a diária acabou", diz o vigia de um estabelecimento comercial localizado na avenida Paulista.
Ele está falando com Samuel, 38, Joaquim, 35, Josué, 42, e Leandro, 23: os quatro são gays e mendigos, moradores de rua.
Eles vivem em grupo para se proteger - nos últimos meses, cresceram as agressões a moradores de rua e contra gays na avenida Paulista.
Por serem pedintes, por serem homossexuais, e por estarem naquela região, os quatro se dizem triplamente expostos: dizem já ter sido espancados pela polícia, por skinheads e até por outros moradores de rua.
Todos esses mendigos gays têm em comum histórias de rejeição da família, de dependência de álcool e drogas, de prostituição e de abuso sexual na infância.
Todos têm uma "identidade" feminina: Josué é Kelly - "de Grace Kelly" -Samuel é Sam, Joaquim é Giovanna Antonelli, e Leandro é Ludimila - deste ponto em diante, serão chamadas por seus nomes de mulher.
Foto: FolhapressSam, 38, Giovanna, 35, Kelly, 42, e Ludmila, 23.
A maior queixa é a intransigência dos abrigos, que proíbem a entrada de mendigos travestidos.
"Dizem: "senhora, tem de colocar roupa de homem'", diz Kelly.
Com isso, muitos buscam escamotear a homossexualidade para conseguir vaga nos albergues, e se precaver da violência e da discriminação dos outros abrigados.
"Sou uma mulher presa num corpo de homem. Não consigo representar uma coisa que não sou", diz Cláudio, nome de batismo de Cláudia, 39, travesti em terapia hormonal para ter traços femininos e crescer mamas.
A situação chegou aos bancos acadêmicos e virou tema de pesquisas de pós-graduação na USP e em outras universidades paulistas.
"Quanto maior a identidade transgênica, maior é a violência. Agregam estigmas que agravam a exclusão social", diz a psicóloga Fernanda Maria Munhoz Salgado, que faz mestrado na PUC sobre mendigos homossexuais.
Também mobilizou a militância gay, que negocia com a prefeitura a abertura do primeiro albergue exclusivo para gays, lésbicas, travestis e transexuais de São Paulo.
"Se cederem o imóvel, no estado em que estiver reformo com o meu próprio dinheiro", afirma o empresário Douglas Drumond, dono da sauna gay 269, na região da avenida Paulista.
Segundo o censo da prefeitura, havia 13.666 moradores de rua em São Paulo em 2009.
No próximo recenseamento, deve ser incluída uma pergunta sobre a orientação sexual para saber, ao menos, quantos são.
Ele está falando com Samuel, 38, Joaquim, 35, Josué, 42, e Leandro, 23: os quatro são gays e mendigos, moradores de rua.
Eles vivem em grupo para se proteger - nos últimos meses, cresceram as agressões a moradores de rua e contra gays na avenida Paulista.
Por serem pedintes, por serem homossexuais, e por estarem naquela região, os quatro se dizem triplamente expostos: dizem já ter sido espancados pela polícia, por skinheads e até por outros moradores de rua.
Todos esses mendigos gays têm em comum histórias de rejeição da família, de dependência de álcool e drogas, de prostituição e de abuso sexual na infância.
Todos têm uma "identidade" feminina: Josué é Kelly - "de Grace Kelly" -Samuel é Sam, Joaquim é Giovanna Antonelli, e Leandro é Ludimila - deste ponto em diante, serão chamadas por seus nomes de mulher.
Foto: FolhapressSam, 38, Giovanna, 35, Kelly, 42, e Ludmila, 23.
A maior queixa é a intransigência dos abrigos, que proíbem a entrada de mendigos travestidos.
"Dizem: "senhora, tem de colocar roupa de homem'", diz Kelly.
Com isso, muitos buscam escamotear a homossexualidade para conseguir vaga nos albergues, e se precaver da violência e da discriminação dos outros abrigados.
"Sou uma mulher presa num corpo de homem. Não consigo representar uma coisa que não sou", diz Cláudio, nome de batismo de Cláudia, 39, travesti em terapia hormonal para ter traços femininos e crescer mamas.
A situação chegou aos bancos acadêmicos e virou tema de pesquisas de pós-graduação na USP e em outras universidades paulistas.
"Quanto maior a identidade transgênica, maior é a violência. Agregam estigmas que agravam a exclusão social", diz a psicóloga Fernanda Maria Munhoz Salgado, que faz mestrado na PUC sobre mendigos homossexuais.
Também mobilizou a militância gay, que negocia com a prefeitura a abertura do primeiro albergue exclusivo para gays, lésbicas, travestis e transexuais de São Paulo.
"Se cederem o imóvel, no estado em que estiver reformo com o meu próprio dinheiro", afirma o empresário Douglas Drumond, dono da sauna gay 269, na região da avenida Paulista.
Segundo o censo da prefeitura, havia 13.666 moradores de rua em São Paulo em 2009.
No próximo recenseamento, deve ser incluída uma pergunta sobre a orientação sexual para saber, ao menos, quantos são.
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Matéria de Vinícius Queiroz Galvão, para a Folha de S.Paulo
Matéria de Vinícius Queiroz Galvão, para a Folha de S.Paulo
RUA É AINDA MAIS INÓSPITA PARA ESSE PÚBLICO
O crescimento do número de pessoas LGBT em situação de rua nas grandes cidades brasileiras é claramente percebido por quem trabalha com este segmento.
E não é um fenômeno exclusivamente nacional, pois pesquisas com jovens em situação de rua em grandes cidades americanas mostram que cerca de 20% deles se identificam como LGBT e outras, feitas no Reino Unido e na Austrália, apontam o mesmo crescimento.
As explicações "estrangeiras" para este crescimento são compatíveis com as observadas recentemente em pesquisa com este segmento.
Uma das principais refere-se à homofobia no contexto familiar e comunitário, especialmente aquela direcionada aos jovens efeminados e às jovens masculinizadas, que faz com que estes sejam expulsos de casa ou se separem cedo da família ou cidade de origem, em busca de maior liberdade.
Neste processo, o apoio familiar em situações de crise financeira também é interrompido, levando muitos à situação de rua.
A homofobia no contexto escolar, levando ocasionalmente à evasão da escola, e no ambiente de trabalho, dificultando a empregabilidade, também contribuem para o processo de pauperização para jovens LGBT.
Soma-se a estas dificuldades o fato de alguns destes jovens, no processo de rompimento com as barreiras familiares, acabarem por mergulhar em drogas ilícitas.
Se a busca por maior liberdade frente à expressão da sexualidade deve ser vista como positiva, o aumento da vulnerabilidade ao abuso de drogas que por vezes a acompanha deve ser visto cuidadosamente pelas políticas voltadas a este segmento.
A dificuldade das instituições voltadas à população de rua em lidar com jovens LGBT sem-teto deve-se ao fato da maior parte destas instituições serem ligadas a organizações religiosas, onde a homossexualidade é muitas vezes fortemente criticada.
Outro fator relaciona-se à dificuldade por parte de gestores e funcionários de albergues em lidar com um segmento (felizmente) bastante sexualizado.
Se a cama é para dormir e o banheiro para tomar banho, seu uso para outros fins é visto frequentemente como um desrespeito à finalidade do albergue.
Por este motivo, é imprescindível um investimento em formação junto aos funcionários destas instituições para um acolhimento da população LGBT de rua que respeite suas especificidades.
Iniciativas como as de instituições específicas voltadas para este segmento também são muito bem-vindas, assim como o processo de reconhecimento crescente dos diversos estilos de homossexualidades populares por parte do movimento LGBT.
Em que pese o receio de que isto leve à formação de espaços segregados que acabem por contribuir para aumentar o processo de discriminação sofrida por esta população, experiências exitosas como a do Centro de Referência da Diversidade, na capital paulista, mostram que estas podem ser iniciativas importantes no processo de conquista da cidadania plena por parte destas pessoas.
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Marcos Roberto Vieira Garcia é doutor em psicologia social pela USP, professor da UFSCar e coordenou pesquisa científica sobre moradores de rua gays
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