A crise do casal tradicional é o tema predominante dos mais de 10 filmes de todo o mundo que disputam este ano o Urso de Ouro do Festival de Cinema de Berlim.
Nesta quinta-feira foi projetado "Come Rain, Come Shine", do sul-coreano Lee Yoon-ki, que fala do fim do amor e a separação entre duas pessoas que conviveram durante anos, neste caso Frau e Mann, interpretados pelos conhecidos atores sul-coreanos Lim Soo-jeong e Hyun Bin, também é o tema das histórias contadas em "Um Mundo Misterioso", do argentino Rodrigo Moreno, e sobretudo "Nader and Simin: a separation", do iraniano Asghar Farhadi.
Divulgação
Cena do filme argentino "Um Mundo Misterioso"
Com diferentes matizes, o tema reaparece em "O Futuro", da americana Miranda July, e "Doença do Sono", do alemão Ulrich Kohler.
jÁ Sylvester Stallone vendeu na paralela da Berlinale seu último filme, "Headshot", a peso de ouro, mostrando que, mesmo veinho, é um nome de prestígio na indústria e ainda bem vendável.
Isabella Rossellini, além de presidente do júri da mostra competitiva desse ano, participou hoje da competição com o filme "Late Bloomers", e deu uma ótima entrevista após a projeção.
O filme alemão "If Not Us, Who" lotou a principal sala de projeção da Berlinale, que ainda teve uma surpreendente história de uma lésbica palestina, abusada sexualmente por um soldado israelense.
Confira a quinta feira em Berlim:
APLAUDIDO E VAIADO, "COME RAIN, COME SHINE" MERGULHA NA CLAUTROFOBIA DE UM CASAL
Inspirado em conto do escritor japonês Areno Inoue, o coreano "Come Rain, Come Shine" também mostra o fim da relação de um jovem casal.
"O tema é universal. E por isso aparece em filmes da Ásia, da Europa e da América do Sul", avaliou o diretor Lee Yoon-ki, que mostra no filme a dor da separação de forma indireta, com símbolos que não são dramáticos, mas ao contrário, fazem sorrir.
Frau e Mann são jovens sul-coreanos com bom nível de vida, que moram nos arredores de Seul.
Ela trabalha com publicidade e ele é arquiteto.
A história começa quando ele a leva ao aeroporto para uma viagem de trabalho que deve durar o fim de semana.
Durante o trajeto, ela revela que não quer continuar vivendo com ele.
Mann não sabe o que dizer e durante todo o filme, enquanto o casal divide fotos e lembranças, parecerá resignado, entendendo que ela ama outro.
Só quando ele for cortar as cebolas do que será a "última ceia" do casal, cairá em prantos.
Getty Images
A atriz Soo-jung Lim, o diretor Yoon-ki Lee (no centro) e o ator Bin Hyun participam de sessão de fotos de "Come Rain, Come Shine", hoje em Berlim
"É uma meditação sobre a separação de duas pessoas que se amavam. O título vem de uma canção muito conhecida na Coreia. Embora chova e estejamos tristes, também virão momentos felizes, o sol voltará a brilhar. E vice-versa", comentou Yoon-ki, que já participou quatro vezes da Berlinale com filmes anteriores.
O filme foi realizado com poucos recursos: toda a história se passa no apartamento do casal, enquanto do lado de fora não para de chover; o telejornal anuncia que continuará chovendo até o dia seguinte e que há inundações e pontes derrubadas.
Confira o trailer de "Come Rain, Come Shine":
Os diálogos e a delicada direção permitem a Yoon-ki avançar em pequenos detalhes até o desenlace, como o gato dos vizinhos que, encurralado pela chuva, vai parar na varanda.
O casal volta a se unir momentaneamente para resgatá-lo e secá-lo.
De repente, um raio de sol entra pela janela.
A atriz, Lim Soo-jeong, disse que talvez este filme não atraia milhares de espectadores na Coreia do Sul, mas admitiu que ao ler o roteiro sentiu que havia "uma proposta autoral, algo intimista, com grande qualidade artística. Se todos os filmes coreanos fossem de caratê e ação, nosso cinema estaria em perigo. Estou certa de que 'Faça Chuva' encontrará seu público, que agradará a algumas pessoas".
Seu parceiro diante das câmeras, Hyun Bin, também disse que "ler o roteiro era como ler o diário de alguém. Precisamos deste tipo de filmes, lentos, profundos, longos. A sensação do adeus, a emoção, vai acontecendo pouco a pouco, com detalhes que são pincelados".
A reação foi díspar em Berlim, onde o filme participa da mostra competitiva.
Houve que vaiasse - a primeira vez que isso acontece na edição deste ano - e houve quem aplaudisse.
STALLONE AINDA É UM NOME - MUITO - VENDÁVEL, CONSTATA A BERLINALE
Sylvester Stallone continua sendo aposta certa: a superprodução "Headshot", orçada em US$ 40 milhões, foi vendida a peso de ouro no European Film Market, evento paralelo à mostra de filmes, em Berlim.
A revista "Hollywood Reporter" estima que o grupo alemão Constantin tenha pago US$ 5 milhões para lançar, na Europa, o novo filme protagonizado pelo ator.
O sucesso de "Os Mercenários" - que terá uma continuação - é uma das razões para o frisson do mercado em torno de Stallone, que começou a fazer cinema em 1970 e virou uma mina de ouro ao tornar-se o Rocky Balboa de "Rocky, um Lutador" (1976).
Quando Rocky começava a perder força, ele voltou a render bilhões nas bilheterias como Rambo, personagem da década de 1980.
E o mais impressionante é que, em 2011, não houve astro, no mercado de Berlim, que fizesse os distribuidores esfregarem as mãos com tanto entusiasmo quando Stallone!
Getty Images
Stallone e seu grande amigo Arnold Schwarzenegger, em evento em Los Angeles (dez/2010)
Nomes como Jesse Eisenberg, Justin Timberlake, Carey Muligan e James Franco são, é claro, um bom chamariz para os empresários que, no mercado, podem comprar filmes que são ainda simples projetos no papel.
Nennhum deles é, porém, aposta 100% segura como ainda são Stallone ou Arnold Schwarzenegger - que, aliás, acaba de confirmar seu retorno à carreira de ator.
Os véinhos ainda tão dando um bom caldo!
HISTÓRIA DO TERRORISMO ALEMÃO LOTOU O BERLINALE PALAST E FOI MUITO APLAUDIDO
O filme "If Not Us, Who" lotou o Berlinale Palast, quartel-general do Festival de Berlim, na manhã desta quinta (17).
Produção de grandes proporções, o filme de Andreas Veil compete pelo Urso de Ouro e estava cercado de expectativas: primeiro, por ser uma esperança de prêmios para os alemães; segundo, também pela abordagem de um período histórico atribulado da Alemanha e de personagens ambíguos e complexos.
Ao fim de duas horas de projeção, o filme foi bastante aplaudido e realmente deve aparecer na lista de consagrados pelo júri, presidido por Isabella Rosselini.
O filme mostra o início da relação entre o escritor Bernward Vesper - August Diehl - e a editora Gudrun Ensslin - Lena Lauzemis, fantástica no papel - no começo dos anos 60, e acompanha os dois personagens e suas escolhas ao longo de uma década em que a luta entre totalitarismos e liberdade tomou uma dimensão mundial.
Enquanto Vesper, filho de um escritor pró-nazista, escolhe o poder da palavra, Gudrun, filha de uma família de classe média, decide se juntar à causa de Andreas Baader - Alexander Fehling - para quem não existia outra opção para se lidar com o assunto a não ser o terrorismo.
"If Not Us, Who" é o primeiro longa-metragem de ficção de Veil.
Na entrevista coletiva após a exibição do filme, em que esteve acompanhado de Diehl, Lauzemis e do produtor, o diretor explicou que dois fatores o levaram a investir no projeto.
"Em 2003, li um livro ["Vesper, Ensslin, Baader - Prehistory of German Terrorism"] e achei que muitas coisas sobre esse episódio da nossa história não haviam sido ditas. Por exemplo, a maneira como Ensslin era retratada, comparada a uma 'Medeia' sem coração que abandona o filho para se dedicar a uma luta. E também como Vesper era visto, filho de um escritor que trabalhou a soldo de Hitler e fez o discurso que antecedeu a famosa queima de livros em Dresden, em 1933."
Getty Images
Os atores August Diehl e Lena Lauzemis participam da apresentação de "If Not Us, Who"
O outro fator que levou Veil a apostar no filme foi o necessidade de dizer algo sobre assuntos que estão ligados à atualidade.
"Não sei se o Iraque ou o Egito são reflexos do que aconteceu no passado, não saberia dizer se esses assuntos estão intimamente ligados ao filme. Mas a crise economica que vivemos certamente sim. E enquanto privatizarmos os ganhos e socializarmos as perdas não sei o que será de nós. Para evitar que isso aconteça novamente acho que temos de nos posicionar."
Antes de ser concebido como ficção, "If Not Us, Who" passou por uma tentativa de ser feito como documentário.
"Chegamos a iniciar a produção, mas muitos personagens envolvidos na história não queriam falar em frente às câmeras.Por isso, decidimos partir para a ficção", contou Veil.
ISABELLA ROSSELLINI, ALÉM DE PRESIDENTE DO JÚRI, PROTAGONIZA "LATE BLOOMERS", EXIBIDO HOJE
Além de presidente do júri da mostra competitiva do Festival de Berlim, a atriz italiana Isabella Rossellini é protagonista de um dos filmes da paralela Berlinale Special: em "Late Bloomers", exibido para a imprensa no início na noite desta quinta (17), ela faz o papel de Mary, uma mulher que começa a sentir os sinais da velhice e tenta se adaptar à nova condição, procurando se cuidar e estabelecer uma meta social.
Dirigido por Julie Gavras - de "A Culpa É do Fidel" - o filme atraiu a simpatia dos jornalistas e transformou Rossellini em uma atração à parte na entrevista coletiva que se seguiu à sessão.
"Eu quero ter a minha idade", disse ela ao ser questionada sobre como se sente em relação à questão que o filme coloca.
"Quero ser sofisticada, elegante, me vestir bem. Acho um pouco insultante quando as pessoas me dizem que eu pareço mais jovem. É como quando veem o meu filho, que é negro, e dizem para mim: 'Mas você é tão branca'. Acho isso um insulto."
Getty Images
A atriz Isabella Rossellini, presidente do júri da mostra competitiva do Festival de Berlim, e estrela do filme "Late Bloomers", exibido hoje
No filme, Mary é casada com Adam - William Hurt, finalmente voltando a um bom papel -um famoso arquiteto que começa a questionar seu próprio trabalho quando é obrigado pelos sócios a aceitar fazer o projeto de um asilo para a terceira idade.
Contrariado, ele reúne uma equipe de jovens arquitetos que se voluntariam a trabalhar no projeto de um museu.
Paralelamente, o processo de aceitação da esposa e o de negação do marido cria um ruído forte no casal - há ainda o personagem de Nora, a excêntrica avó materna, que funciona como a voz da consciência para os dois.
Comédia dramática muito bem dirigida e interpretada, "Late Bloomers"
tem entre suas qualidades a atuação de Rossellini e Hurt.
Gavras disse que ensaiou bastante os atores para que as frases saíssem naturalmente e também para criar o clima de verdadeira família entre os atores.
"Houve pouca improvisação", disse a cineasta.
"Apenas colocamos um pouco dos italianismos e gestos por que os ingleses não sabem mexer as mãos como os italianos."
Alegre, bem humorada e muito risonha, Rossellini disse que fazia muito tempo não recebia um papel de protagonista, e achou "revigorante" o roteiro de Gavras.
"Há poucos filmes que falam da velhice. E quando falam é sempre de uma maneira muito dramática. Além disso, tem uma sensibilidade muito feminina. Quando se fala de família, que é outro tema subjacente, é preciso do toque de uma mulher."
A certa altura, em "Late Bloomers", Mary se sente incomodada por parecer invisível ao olhar dos homens.
Embora seja uma celebridade, Rossellini disse que isso certamente lhe aconteceu.
"E também vai acontecer com todos vocês", brincou ela.
"Eu adoro andar por Roma e é muito bom não ter que passar pela experiência de escutar assovios e sentir uma mão escorregando no seu traseiro. Pode ser lisonjeito quando se é jovem, mas não é mais o meu caso."
É por tudo isso - e muito mais, que eu a-do-ro ela!
FILME ISRAELENSE CONTA HISTÓRIA DE LÉSBICA PALESTINA ESTUPRADA POR SOLDADO DE ISRAEL
O filme israelense "Lipstikka", de Jonathan Sagall, exibido nesta quinta-feira na mostra competitiva da Berlinale, surpreendeu pela ambiguidade da história que conta: a de duas lésbicas palestinas traumatizadas pelo estupro sofrido por uma delas, praticado por um soldado de Israel.
As belas atrizes israelenses Moran Rosenblatt e Ziv Weiner interpretam Inam e Lara, as duas palestinas de menos de 20 anos que, uma noite de 1994, enquanto soldados israelenses e combatentes palestinos trocam tiros, deixam a Cisjordânia ignorando o toque de recolher e passam, escondidas, para a parte judaica de Jerusalém para ir ao cinema.
"Lipstikka" conta o que acontece após esta travessura juvenil: após deixar o cinema, as duas moças são detidas por dois soldados e um deles se aproveita do fato de que elas estão sem documentos de identidade para violentar Inam, enquanto Lara, horrorizada, observa o que acontece.
Anos depois, Inam e Lara, mais velhas, se encontram em Londres, e o episódio do estupro será mostrado retrospectivamente em duas versões diferentes para destacar a diferença nas lembranças que as duas mantêm daquela noite.
O diretor Jonathan Sagall, de 48 anos, cuja família emigrou do Canadá para Israel quando ele tinha apenas 11 anos, disse que o roteiro se baseou na história de uma amiga de sua mãe.
"Escrevi a primeira versão quando tinha 14 anos. No entanto, redigi muitíssimas versões, a história foi evoluindo, mudando, complicando-se, enrolando-se. Imagino que isto aconteça com todos os escritores".
De fato, a história se complicará em Londres: Lara é casada então, e vive como uma senhora burguesa com o marido e o filho pequeno até que a amiga, Inam, reaparece.
Graças a um novo 'flashback', o espectador entenderá que o marido de Lara era namorado de Inam quando as duas tinham acabado de chegar a Londres e que Lara roubou da amiga.
Pouco a pouco, Inam irá dando demonstrações de que está mentalmente desajustada.
"Sim, tudo é um pouco ambíguo, mas assim é a vida. Não há nada que seja estritamente claro. Isto é uma ficção", explicou Sagall.
Getty Images
As atrizes Moran Rosenblatt, Nataly Attiya, Ziv Weiner e o diretor Jonathan Sagall, de "Lipstikka", em competição na Berlinale
O correspondente do jornal israelense Yedioth Ahronot em Berlim, Eldad Beck, perguntou porque tinha complicado tanto a história de seu roteiro, ao mostrar que as duas mulheres palestinas, que sofrem "a ocupação" da Cisjordânia, eram também lésbicas.
A atriz Clara Khoury, que interpreta Lara adulta, tomou a palavra para responder "que inclusive em um país oprimido, ocupado, pode haver lésbicas. Neste caso, trata-se de pura ficção".
Uma jornalista palestina protestou, durante a coletiva, "contra o sotaque e os erros nos diálogos em árabe" das atrizes israelenses que interpretam as palestinas.
Jonathan Sagall desculpou-se, contando uma anedota.
"Minha mãe é polonesa. Uma vez, quando era mais jovem, fui assistir com ela ao filme 'A Escolha de Sofia', que trata de uma imigrante polonesa nos Estados Unidos. Ao sair do cinema, a minha mãe também protestou, perguntando 'e isso que Sofia fala é polonês? Parece, mas não é polonês'. Nossas atrizes tentaram falar árabe e fizeram o melhor que puderam".
Sagall disse por outro lado que estava muito contente de que um filme israelense tivesse sido selecionado pela primeira vez para a Berlinale, coincidentemente com um filme iraniano, "Nader and Simin - a separation", de Asghar Farhadi.
"Ainda não o vi, mas tem sido muito elogiado. Quero vê-lo. Para mim é extraordinário que estejamos os dois aqui, sim".
Nenhum comentário:
Postar um comentário