Ele é um político que assumiu a prefeitura da pequena Sucupira com a promessa de inaugurar o primeiro cemitério da cidade, só que o problema é que ninguém morre por lá.
É aí que ele tem a idéia de contratar um matador de aluguel para poder, enfim, organizar o grande evento de inauguração.
A saga de Odorico Paraguaçu é uma das mais conhecidas e queridas do povo brasileiro, e a personagem principal de “O Bem Amado” já foi interpretado no teatro - por Procópio Ferreira - em telenovela e depois em seriado - por Paulo Gracindo.
Décadas depois do sucesso da novela de Dias Gomes - a primeira a ser gravada e exibida em cores da história da TV brasileira - o diretor Guel Arraes leva a história para o cinema, que ainda hoje permanece atual.
“Só vale a pena recontar ‘O Bem Amado’ se verificar que algo mudou para justificar a nova versão,” diz o cineasta.
Globo Filmes - Divulgação
Odorico e as irmãs Cajazeiras, em cena do filme
Arraes quer que seu filme sirva para que os espectadores fiquem de olhos abertos nas atitudes de políticos, especialmente em ano de eleição como agora.
“A função da comédia é revelar e denunciar os erros do homem."
Para isso, “O Bem Amado” mostra um prefeito corrupto, planejando maneiras de embolsar os recursos públicos, e também apresenta o opositor de Odorico, que não pode ser considerado um bom caráter.
“Não tem como fazer uma sátira política se não criticar a direita e a esquerda”, explica o diretor.
Guel trabalha com atores que já estiveram ao seu lado em outros projetos, e traz novos integrantes para sua trupe.
“Mesmo os novos são pessoas que se encaixam no grupo, que é bem homogêneo, e quando se trabalha junto mais de uma vez, há vantagens e desvantagens. Primeiramente, que se ganha tempo.”
Guel dá como exemplo, sua parceria com Marco Nanini.
“Sei que posso exagerar nas marcações com o Nanini.”
Veja o trailer do filme:
O ator, que fez parte do elenco de outras obras do diretor, como “Lisbela e o Prisioneiro” e “Romance”, diz que “a primeira vez que se trabalha com um diretor é como um namoro”.
“Gosto da maneira como o Guel dirige. Incansável, exigente e planejado. A gente vai para o set para executar aquilo que já foi combinado.”
Já Andrea Beltrão apresenta os pontos desafiadores de uma parceria tão longeva. “O que mais você pode fazer para surpreender esse diretor que te conhece tão bem?”, questiona a atriz, que não quer que seu trabalho seja comparado ao do elenco da telenovela.
“O medo da comparação é paralisante, e esse filme é uma nova visão que cada pessoa pode trazer.”
Divulgação
Dirceu Borboleta e Odorico, em cena do filme
Os personagens de “O Bem Amado” são fortes, e a caracterização foi uma preocupação constante na concepção do filme. “A gente fez um glossário do Odoriquês,” diz Arraes, sobre as palavras estranhas usadas pelo personagem principal.
Marco Nanini dá créditos para termos como “stripteasicamente” aos roteiristas:
“Não há nada em minhas falas que não esteja no roteiro.” Para as entonações, Nanini usou depoimentos dados por políticos atuais em CPIs.
“A caracterização é uma parte muito divertida do trabalho”, diz Andrea Beltrão, que vive uma das três irmãs solteironas - as "Cajazeiras" - ávidas por levar o viúvo Odorico ao altar.
“Aquela peruca loura foi meu primeiro pedido,” disse a atriz.
José Wilker, que vive o matador Zeca Diabo, afirma que “umas das coisas que me levaram a composição do personagem foram a maquiagem e o figurino.”
Além disso, usou lembranças de família pra construir o cangaceiro.
“Eu me espelhei no meu pai - um homem de educação rasa, mas que procurava se instruir sobre o que é certo.”
Matheus Nachtergaele, que interpreta o funcionário público Dirceu Borboleta, fez um pedido inusitado para auxiliar no seu trabalho.
“Pedi para que as roupas fossem sempre menores do que deveriam, para me ajudar na caracterização, postura e movimentação do personagem”.
No meio das filmagens, o ator teve uma fratura no braço, que acabou por limitar ainda mais seus movimentos.
O universo de Sucupira promete - e cumpre - a promessa de alegrar as platéias.
“Os personagens são muito bons. Todos são generosos, se complementam”, diz Matheus.
“Eles são figuras bem coladas a tipos que Dias Gomes conhecia”, completa Wilker, que já encarnou outro personagem fortíssimo de Dias Gomes, Roque Santeiro.
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CRÍTICA
A comédia "O Bem- Amado", de Guel Arraes, atualiza e também amplia os significados da peça de Dias Gomes - "Odorico, O Bem Amado ou Os Mistérios do Amor e da Morte", escrita em 1962 - que deu origem à novela - exibida em 1973 - e série - exibida entre 1980 e 1984.
Intérprete de Odorico Paraguaçu nesta versão, Marco Nanini foi quem deu o pontapé inicial no projeto, ao comprar os direitos da peça há cerca de quatro anos, chamando depois Arraes para a adaptação - este divide os créditos do roteiro com Cláudio Paiva.
A peça com Nanini foi um dos maiores sucessos do teatro brasileiro recente, o que possibilitou ao ator e ao diretor conseguirem ótimos patrocínios para o filme - Petrobras à frente, e produção - com a sempre competente Paula Lavigne.
Além das trocas de atores, como José Wilker no lugar de Lima Duarte no papel do cangaceiro Zeca Diabo, houve também radicais mudanças de tom nas caracterizações de personagens-chave.
É o caso das irmãs Cajazeiras - Ida Gomes, Dorinha Duval e Dirce Migliaccio, na telenovela e série - no filme rejuvenescidas e bem mais atrevidas - agora interpretadas por Andréa Beltrão, Zezé Polessa e Drica Moraes.
Drica, que se recupera de um transplante de medula por causa de uma leucemia, foi a mais lembrada e homenageada pelos colegas de elenco nas pré-estréias do filme.
Ela merece.
A história é conhecida: prefeito populista da cidadezinha de Sucupira, Odorico Paraguaçu (Nanini) desvia recursos públicos e constrói um cemitério como a grande obra de sua administração.
O tempo passa, não morre ninguém, e o principal opositor do prefeito, o político e jornalista Vladimir (Tonico Pereira), ganha argumentos para uma grande campanha através de seu jornal, "A Trombeta".
É quando Odorico, que tem uma relação amorosa com as três irmãs Cajazeiras, sabe por elas da existência de um primo, supostamente acometido por uma doença mortal (Bruno Garcia).
Mais uma vez a morte demora a aparecer, e o prefeito resolve trazer de volta à cidade o famoso Zeca Diabo (José Wilker), o cangaceiro que matou seu antecessor.
Preocupações com a atualidade da nova versão levaram, por exemplo, o diretor a mudar o final do filme quando já estava pronto.
O final anterior, que é o mesmo da peça original, colocava Vladimir, que a vida toda combateu ferozmente Odorico Paraguaçu, lendo um elogio fúnebre à beira de seu túmulo, finalmente inaugurando o cemitério superfaturado e até então inútil de Sucupira.
Neste novo final, o jovem jornalista Neco Pedreira (Caio Blat, no papel que foi de Carlos Eduardo Dollabela na telenovela e série - e que tem um relacionamento amoroso com a filha de Odorico - Maria Flor, ótima, no papel que foi da saudosa Sandra Bréa na telenovela) é visto numa reportagem de televisão que inclui imagens reais da campanha das "diretas já", em 1984.
Arraes justificou esta mudança como sua forma de "responder a um descrédito com a política, mostrando uma terceira via que a peça não tem".
Optando por situar a trama ao tempo da peça - o começo dos 60 - Arraes nos faz crer que a saga de Odorico é mesmo atemporal, e que políticos como ele, tão corruptos quanto adoráveis, ainda existem às centenas pelo Brasil afora.
Elenco excepcional, direção estupenda, direção de arte primorosa e uma história já conhecida por todos.
Saí do cinema sem (muitas) saudades do Odorico de Paulo Gracindo.
O filme será transformado em em microssérie de quatro capítulos em breve.
Afinal, o filme é copatrocinado pela TV Globo, e distribuído pela Globo Filmes.
"O Bem Amado"
Diretor: Guel Arraes
Produção: Globo Filmes e Paula Lavigne
Elenco Principal: Marco Nanini
Matheus Nachtergaele
José Wilker
Andrea Beltrão
Drica Moraes
Zezé Polessa
Maria Flor
Caio Blat
Gênero: Comédia
Duração: 100 mins
Ano: 2009
Data da Estreia: 23/07/2010
Cor: Colorido
Classificação: Não recomendado para menores de 12 anos
País: Brasil
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