O projeto de transpor a chamada "referência da geração Beat" para as telonas vem de muito tempo, desde que o livro "On the Road" tornou-se best-seller nos anos 50.
Escrito por Jack Kerouac e publicado em 1957, o livro se tornou uma das maiores referências da contracultura, embalando gerações à procura de liberdade e experimentação na própria pele, tudo isso numa era pré-Internet.
A transposição era um dos sonhos de direção de Gus Van Saint e de Francis Ford Coppola, que manteve os direitos mas preferiu atuar somente na produção executiva em "Na Estrada", longa que estreou na sexta (13) aqui no Brasil, depois de uma gestação de oito longos anos.
Concorrente à Palma de Ouro em Cannes 2012, a coprodução França- EUA - Brasil - dividiu opiniões em sua passagem pelo festival francês, o que com certeza ocorrerá também nas suas exibições nos cinemas.
Imagens: Divulgação - Playarte
O ator Sam Riley, em cena de "Na Estrada" |
Conduzido pela criatividade do diretor brasileiro Walter Salles, da inspiração do roteirista portorriquenho Jose Rivera e das belas imagens do diretor de fotografia francês Éric Gautier - parceiros de Salles em "Diários de Motocicleta" (2004) - o longa se apropria da melancolia do livro, narrando as memórias do escritor iniciante Sal Paradise - alter ego de Kerouac -, interpretado com intensidade e absoluta verdade pelo ator britânico Sam Riley.
Assim, nostalgia é o que se vê nessas aventuras juvenis na estrada de Sal e seu amigo Dean Moriarty - alter ego do escritor Neal Cassady - interpretado por Garrett Hedlund com uma intensidade que lembra Marlon Brando quando jovem.
Hedlund chegou a ser citado pelo próprio Kerouac para o papel, numa das muitas tentativas frustradas de adaptação para o cinema.
A tensão entre as diferenças profundas entre os dois personagens, unidos por uma mesma fome de vida, embalam uma vertiginosa troca de paisagens - de Nova York ao México - e a viagem, dos dois e de vários companheiros de caronas pela estrada,montam uma sucessão de acontecimentos como bebedeiras, canções, trabalhos eventuais, comida ruim ou nenhuma, a exposição ao clima, a camaradagem encontrada e logo perdida - e as mulheres.
Dean - Garrett Hedlund - e Sal - Sam Riley, em cena de "Na Estrada" |
Se são personagens secundárias no livro, as mulheres ocupam mais espaço na telona e a principal é Marylou, a primeira mulher de Dean, que se torna um elo entre ele e Sam, já que Dean insiste em que ela vá para a cama com o amigo.
Marylou é interpretada por Kristen Stewart, que, deixando a saga "Crepúsculo" para trás, tem aqui o seu melhor papel no cinema, disparado.
Essa amoralidade, que também leva ao consumo de drogas, além do álcool, é um lembrete de um tempo bem mais libertário e libertino do que os dias atuais, uma espécie de sonho utópico em busca de uma vida sem limites que a chegada da maturidade mostra para Sal, mas não para Dean, que sonha em viver sem compromissos para sempre.
Kristen Stewart como Marylou: seu melhor papel no cinema |
A segunda mulher de Dean, Camille, personagem inspirada em Carolyn Cassady é essa "voz da razão" na vida dele, já que, mãe de seus dois filhos, ela sinaliza seu desejo de parada e estabilidade.
Kisten Dunst interpreta Camille, num desempenho razoável.
Alguns personagens que brotam pelo caminho mostram um sabor especial, que mostram melhor essa época e o maior deles é Old Bull Lee - Viggo Mortensen, espetacular - espécie de guru junkie diretamente calcado na figura do escritor William S. Burroughs, autor de "Almoço Nu" e que era o mais velho do grupo beat - ironicamente, apesar das viagens de todos os tipos que fez, foi o que morreu mais velho, com 83 anos.
Viggo Mortensen como Old Bull Lee, em "Na Estrada" |
Kerouac e Cassady morreram antes dos 50 anos, o poeta Allen Ginsberg - no filme representado pelo personagem Carlo Marx, interpretado por Tom Sturridge -, com 71.
Pequenas, porém marcantes são as cenas de três outras atrizes: Amy Adams - como Jane, mulher de Old Bull Lee, e alter ego de Joan Vollmer, primeira mulher de Burroughs que ele matou acidentalmente com um tiro; Elisabeth Moss - como Galatea Dunkel, a jovem esposa abandonada pelo marido, Ed Dunkel (o estreante Danny Morgan), representando os personagens reais Al e Helen Hinkle; e Alice Braga - como Terry, jovem mexicana com quem Sal tem um rápido caso quando colhe algodão na Califórnia e que evoca Bea Franco, que escreveu várias cartas a Kerouac, em 1947.
Steve Buscemi interpreta um homem que dá carona aos protagonistas e Terrence Howard - indicado ao Oscar por "Ritmo de um Sonho" -, vive o músico Walter, traduzindo uma pegada mais jazzística do que roqueira na trilha sonora assinada pelo argentino Gustavo Santaolalla.
Assim, o longa propõe um mergulho na melancolia, na perda, na passagem do tempo e das paixões, onde a câmera gruda nos personagens e nos mostra seu turbilhão, sua ânsia de viver, sua pulsão pelo movimento, pela experiência direta e realiza, assim, seu maior desafio, o de capturar o aspecto fugaz do tempo presente, as relações humanas imperfeitas, passageiras, fundamentais.
Confira o trailer do filme:
*****
"NA ESTRADA"
Título Original:
On The Road
Diretor:
Walter Salles
Elenco:
Kristen Stewart, Amy Adams, Viggo Mortensen, Kisten Dunst, Garrett Hedlund, Alice Braga, Sam Riley
Produção:
Charles Gillibert, Nathanaël Karmitz, Jerry Leider, Rebecca Yeldham, Walter Salles
Roteiro:
Jose Rivera
Fotografia:
Eric Gautier
Trilha Sonora:
Gustavo Santaolalla
Duração:
137 min.
Ano:
2011
País:
EUA/Brasil/França
Gênero:
Drama
Cor:
Colorido
Distribuidora:
PlayArte
Estúdio:
American Zoetrope / Film4 / MK2 Productions / Video Filmes
Classificação:
16 anos
Cotação do Klau:
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