Infelizmente, "O Fosso" nunca será exibido nas telonas chinesas
Um filme chinês contundente - sobre a situação de presos políticos em campos de trabalhos forçados no final dos anos 50 - agradou aos críticos em Veneza na segunda-feira, alguns dos quais o apontaram como candidato forte ao prêmio máximo do festival.
"O Fosso" conta a história pouco conhecida - de cerca de 3 mil pessoas condenadas à "reeducação" em campos de trabalhos forçados na extremidade do deserto de Gobi, no oeste da China, e lutando para sobreviver às condições climáticas extremas e à escassez de comida.
Tachadas pelo governo de inimigos de direita por terem feito críticas ao Partido Comunista, mesmo que suaves, ou simplesmente em função de suas origens, muitas delas morreram de fome, doenças ou exaustão nos fossos que lhes serviam de dormitórios.
O diretor Wang Bing passou três anos buscando sobreviventes e carcereiros dos campos de Jiabingou e Mingshui para fazer o filme, integrante inesperado da competição principal - por motivos óbvios, sua participação só foi revelada na segunda-feira.
Foto: Divulgação
Cena do filme "O Fosso", de Wang Bing
"Há dez, talvez 20 anos, o cinema independente chinês vem focando sobretudo os problemas sociais das classes trabalhadoras mais pobres da China contemporânea", diz Bing nas notas de produção do filme.
"'O Fosso' talvez seja o primeiro filme a tratar diretamente do passado político da China contemporânea, que ainda é um tema tabu.'
Aplaudido calorosamente na sessão para a imprensa, o filme dificilmente será lançado na China.
Mas Bing disse esperar que o filme seja uma oportunidade para chineses mais jovens, como ele -que nasceu em 1967 - aprenderem sobre o passado de seu país.
Rodado como um documentário, "O Fosso" foca os últimos três meses de vida em um campo anexo para onde foram levados em 1960 os 1.500 presos que haviam sobrevivido até então, num momento em que uma seca assolava todo o país.
Forçados inicialmente a arar 4 mil hectares de terra árida no meio do nada, mais tarde eles são deixados à míngua em dormitórios subterrâneos, enquanto a comida vai acabando e muitos não conseguem mais se conservar em pé.
Quando as autoridades finalmente decidiram enviar os presos para casa, apenas 500 pessoas tinham sobrevivido à experiência.
"Tudo o que é mostrado no filme aconteceu realmente no campo. Nada foi inventado ou acrescentado", disse Bing, que usou muitos atores amadores neste seu primeiro longa-metragem.
Antes, ele dirigiu vários documentários.
"O Fosso" é um dos 24 títulos que competem pelo prêmio máximo do Festival de Veneza - o Leão de Ouro - que será entregue no sábado.
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"O Mundo é Belo", Curta brasileiro, é exibido na Seleção "Orizzonti"
O curta-metragem brasileiro "O Mundo É Belo", do cineasta Luiz Pretti, foi apresentado nesta segunda na seleção "Orizzonti".
O curta - de nove minutos - aborda os desejos que o ser humano experimenta na juventude.
Paulo Filho/Divulgação
O diretor brasileiro Luiz Pretti
O tema envolveu o diretor Luiz Pretti de tal forma, que ele chegou à conclusão de que tinha um sentimento de amor para com a juventude.
"Quando comecei com isso, me dei conta que realmente era um sentimento de amor", declarou o cineasta em entrevista coletiva no Festival.
"Pouco a pouco, comecei a experimentar um sentimento que me fez entender o que queria. E finalmente se transformou tudo em uma obra", comentou Pretti, que é carioca, mas reside no Ceará.
A entrega dos prêmios dessa seleção paralela do Festival de Veneza também será realizada no último dia do evento, no próximo sábado.
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Joaquin Phoenix cultua a própria queda em documentário
Não são poucas as celebridades que têm exposto em público, sua descida ao inferno, e já foi bastante discutido o papel da mídia em casos como os de Britney Spears ou Michael Jackson, por exemplo.
O ator Joaquin Phoenix está litros de tinta atrás de Spears e Jackson em termos de aparições em tabloides, mas teve, em 2008, seu momento de "problemático da vez".
O filme "I'm Still Here", exibido pela primeira vez na manhã de segunda, fora de competição, acompanha esse momento.
Divulgação
Cartaz de "I'm Still Here"
A exposição, aqui, não pode ser debitada na conta da mídia nem dos paparazzi, já que o filme, feito pelo cunhado do ator, Casey Affleck, é claramente cultuado por ele próprio.
O "documentário" segue os passos de Phoenix - ator de megassusessos como "Gladiador" (2000), de Ridley Scott, e "Johnny e June " (2005), de James Mangold , e irmão mais novo do falecido River Phoenix - a partir do dia em que ele decide anunciar, em público, que abandonaria a carreira de ator para virar um cantor de hip-hop.
Acontece que, apesar de apresentar-se como "documental", o filme tem passagens claramente encenadas, e nenhuma câmera é tão invisível quanto Affleck pretende mostrar.
Phoenix cheira cocaína, discute com as pessoas que imagina todas contra si, deixa cabelo e barba crescerem.
À frente da câmera do cunhado, parece cultuar um pouco essa queda.
"I'm Still Here" se quer divertido, chocante e emocionante, mas parece que não conseguiu ser nada disso.
O que consegue, sim, é ser um documento e tanto sobre o quanto está doente o mundo do show business.
A reação da plateia do festival à entrevista de Phoenix ao programa de David Letermann, reproduzida no filme, é sintomática disso.
Eram incontroláveis as gargalhadas.
E o que se via, em cena, era só decadência.
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POUCOS ASTROS, MUITO CINEMA AUTORAL EM VENEZA 2010
A falta de um maior número de Astros e Divas marcou a 67ª edição da Mostra de Cinema de Veneza, que se encerra no próximo sábado, após ter apresentado, sobretudo, filmes autorais, experimentais e intimistas.
Afetada pela chuva, pelo desconforto gerado pelas obras de reconstrução do novo Palácio do Cinema, e sem poder alojar os grandes astros do cinema no lendário Hotel des Bains - onde Luchino Visconti rodou "Morte em Veneza" - a Mostra não brilha este ano pelo 'glamour' que lhe é habitual.
Ao contrário das edições passadas, o prestigiado festival veneziano não contou com superproduções americanas, as quais usavam o charme da cidade dos canais como sua plataforma de lançamento na Europa.
Apesar de ter sido inaugurado com o filme "Black Swan" - do respeitado diretor americano Darren Aronofsky, com Natalie Portman no papel de uma ambiciosa bailarina clássica - a presença de astros internacionais foi escassa.
Com exceção de Vincent Cassel e da Diva Catherine Deneuve, as ausências - Gerard Depardieu, Robert de Niro, entre outros - foram mais notadas do que as presenças.
A rivalidade com o outro grande festival europeu, em Cannes - França - ficou praticamente enterrada, enquanto o diretor da mostra italiana, Marco Muller, confirmou que deixará o posto ao fim da edição de 2011, para se dedicar à produção de filmes.
Pela passarela do Lido, sob vento ou chuvas incomuns para esta época do ano, desfilaram sobretudo personalidades italianas e cineastas relativamente desconhecidos do grande público.
Dos quinze filmes da mostra competitiva - de um total de 24 - exibidos até agora, a cinco dias do encerramento, brilha o cinema não comercial, realizado por diretores que não chegaram aos cinquenta anos e que experimentam com planos e sequências lentas.
É o caso de "Post Mortem", do chileno Pablo Larraín, e de "Essentials Killing", do polonês Jerzy Skolimowski, bem como de "O Fosso", do chinês Wang Bing, os dois últimos exibidos esta segunda-feira.
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Acompanhe o dia a dia do Festival de Veneza, através de imagens, no link:
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