domingo, 29 de maio de 2011

FABIO ASSUNÇÃO: PALCO ABERTO


Após 11 anos longe do teatro, Fabio Assunção volta à cena, ganha uma nova filha e fala sobre sua recuperação com muito trabalho

A vida pública e a intimidade de Fabio Assunção andam em descompasso. 

Ele quer falar sobre, pensar a respeito e se concentrar em seus próximos trabalhos. 

O que as pessoas querem saber é sobre seu drama com as drogas. 
Confiante, simpático e sorridente, ele recebe Serafina para uma entrevista a 40 dias de sua volta ao teatro depois de 11 anos longe dos palcos. 

Fotos: Bob Wolfenson 

Mas torna-se desconfiado, tenso e reflexivo quando a conversa envereda para seus problemas pessoais. 
"Se eu não tivesse essa tensão, seria um cara confortável com uma coisa que me fez mal", justifica Fabio. 

É simples comprovar esse descompasso. 
Se você digitar "Fabio Assunc..." no Google, a primeira coisa que aparece é: "Fabio Assunção drogas". 
"É desconfortável saber que alguém vai clicar meu nome e encontrar essa discrepância. Isso marcou minha vida, mas minhas vitórias também marcaram. É uma questão de tempo isso mudar." 

No momento, a vida profissional de Fabio Assunção parece estar em "pause". 
Mas não está, pelo contrário. 
Com a agenda lotada de trabalhos, ele espera que, em alguns meses, o interesse pelo seu nome vá além das notícias dos últimos anos. 

Sua nova peça, a primeira desde 2000, chama-se "Adultérios" e foi escrita por Woody Allen em 1995. 
Originalmente chamada "Central Park West", se passa no grande parque nova-iorquino, onde seu personagem, um escritor que aguarda sua amante, começa uma conversa surreal com um mendigo amalucado. 
"Fazer teatro é como começar um novo romance. Inspira exclusividade", diz. 

A peça também está sendo produzida por Assunção e a estreia acontece no teatro Shopping Frei Caneca, em São Paulo, em 5 de julho. 

O fato de o interesse público a respeito de um dos atores mais queridos do Brasil recair em cima de sua intimidade, em vez de seu trabalho no cinema ou na TV, provavelmente depõe mais contra nós do que contra ele. 
Independentemente disso, quem enfrenta diariamente o "Fabio Assunção drogas" é o Fabio Assunção que está sentado em frente ao repórter. 
Ele roda sem parar, no dedo anular esquerdo, sua enorme aliança fabricada com três tipos de ouro (amarelo, branco e rosa) e resume o que pensa do assunto: 
"Não gosto".

ROTEIRO
O ator também tem planos para o cinema e a TV. 
No segundo semestre, foi convidado a gravar um episódio da série "As Brasileiras", de Daniel Filho. 
Na mesma época, entra em cartaz o longa "O País do Desejo", de Paulo Caldas (de "Baile Perfumado"), em que Fabio interpreta um padre. 
E acabou de assinar contrato para atuar em um novo filme, produzido por Mariza Leão, de "Meu Nome Não É Johnny". 


Além disso, há dois anos e meio, escreve um roteiro para o cinema, a respeito da relação entre um pai e um filho. 
Mas as lembranças dos dramas recentes ainda são fortes. 
Em 2008, Fabio saiu na metade da novela "Negócio da China" e se internou numa clínica nos Estados Unidos para tratar a dependência de cocaína. 
"Fui lá porque, na primeira vez em que fui no Narcóticos Anônimos, saiu no jornal. Minha condição de vida não permite o anonimato, mas é uma deselegância enorme falar assim de um local de compartilhamento e de privacidade." 

Um dos lados mais obscuros do vício são as recaídas. 
E a recaída do galã da Globo virou manchete. 
No final do ano passado, estava escalado para ser protagonista de "Insensato Coração", mas foi afastado após faltar a gravações. 
"O tratamento envolve você estar em casa, com a sua família, e com a pessoa com quem você faz análise. Fui para o Rio gravar e fiquei num hotel sozinho. Teria de ficar 11 meses. Depois de duas semanas, desisti." 

Ainda não era a hora. 
"Depois dos Estados Unidos, num segundo momento, fiquei cinco meses em dois lugares diferentes no Brasil. Mas o tratamento ainda está sendo feito agora e não acaba. Tenho psiquiatra uma vez por mês e faço duas sessões de análise por semana." 

O ator optou por uma pequena produção para voltar a atuar. 
Mas, dois meses antes de completar 40 anos (em 10 de agosto), e depois de 21 anos de atuação, já se sente maduro o suficiente para encabeçar um grande elenco no palco. 
Em "Adultérios", seus colegas de cena são Norival Rizzo, no papel do mendigo, e Carol Mariottini, que vive a amante, sob direção de Alexandre Reinecke.

 Inquieto, tem ensaiado os dois papéis, o do escritor e o do mendigo doido. 
"O Norival é um ator excelente e estamos pensando em alternar. Algo do tipo: quinta e sábado, eu faço o escritor; sexta e domingo, o mendigo".


ELE E ELLA
Fora desse descompasso está Ella Felipa. 
É uma menina que faz três semanas na segunda-feira, 30/5, e que, por nove meses -enquanto estava na barriga de Karina Tavares-, chamava-se apenas Felipa. 
"Eu gostava do nome simples, mas sinceramente acho Felipa muito certinho, muito correto demais, muito número par, entende? Dei várias sugestões nesses nove meses, mas a Karina não comprou nenhuma ideia." 

De repente, no domingo, depois do jogo contra o Santos no Pacaembu (que terminou 0 x 0, para desânimo do corintiano e de seu primeiro filho, João, 8), pintou um nome na cabeça. "Deixa eu colocar Ella antes do Felipa?", implorou o papai. 
Karina e o sogro aprovaram e as contrações começaram. 
"Ela ouviu o nome e saiu", gaba-se. 

O nome não é uma homenagem à cantora Ella Fitzgerald, mas poderia ter sido. 
Esse terreno é fértil na imaginação de Fabio Assunção, um jazz maníaco de primeira categoria. 
Wynton Marsalis é um de seus preferidos. 
George Benson é outro. 
Seu amor pela música provocou uma ideia curiosa: 
"Eu e a Karina estamos pensando em não dar muito acesso a imagens para a Ella nesse primeiro ano. Nem DVDs infantis nem joguinhos no iPad. Tenho a sensação de que tudo que bate ali, nesse momento, fica; é importantíssimo." 

Daí a ideia de prover Ella Felipa apenas de comida, amor e canções. 
"A música te leva a outros lugares. Todo dia coloco ela no meu peito e ficamos uma hora e meia ouvindo blues, jazz, música clássica... Mas também baixei a série 'for babies' [para bebês]. Escutamos Beatles for babies, Elvis for babies, Coldplay for babies etc." 
Essa série traz as músicas tocadas de forma singela, uma tortura para roqueiros tradicionais, mas uma delícia divertida para pais e rebentos. 
Quando Fabio conta que baixou esse material auditivo pela internet, pergunto a ele sobre pirataria. 
"Não baixo nada pirata. Tenho conta na Apple americana e uso a loja do iTunes. Não tenho nenhum filme pirata em casa. Mas faço CDs para os amigos o tempo todo." 

Sua biblioteca musical é de tirar o chapéu. 
Ele tem um disco de um terabyte só com músicas, mais 167 gigabytes de canções em seu computador. 
Se ele fosse para uma ilha deserta apenas com seus 167 gigas e um fone de ouvido, talvez morresse de fome antes de escutar tudo: seriam necessários dois meses e meio, 24 horas por dia, para que todas as canções fossem executadas sem repetição. 
Já seu disco com um terabyte rodaria por 437 dias e noites, ou uns 15 meses consecutivos sem dormir. 


As diferenças entre o pai de João, 8, e o pai de Ella Felipa são muitas. 
A mulher, em 2003, era a ex-modelo e empresária Priscila Borgonovi. 
Hoje é a publicitária e fotógrafa Karina Tavares. 
A necessidade de provar a si mesmo que era bom pai levava Fabio a querer participar de todos os momentos. 
Hoje, está mais tranquilo: 
"Sei que sou um pai presente". 

As expectativas também eram bem diferentes. 
"Com João, tudo era mais fantasioso. Por exemplo, pedi para o médico colocar música clássica na sala do parto na hora do nascimento. Mas, na confusão do momento, não dei o CD para ele. O médico lembrou do meu pedido e ligou numa rádio, com um locutor falando do trânsito (risos)."

NA VILA MARIANA
Esse amor pela música, que impele Fabio Assunção em seus momentos mais importantes, vem de longe. 
Começou a aprender piano aos 9, e passou para coral e violão. 
Com 15 ou 16 , fundou sua própria banda de rock, a Delta T, na qual tocava guitarra. 
Escrevia canções como "Procurando por Ti" e cantava. 
"Foi um desastre completo", lembra. 

O pai trabalhava em banco e, após 25 anos, comprou uma banca de jornal na Vila Mariana, onde moravam. 
A mãe foi professora e diretora de escola municipal. 
Apesar do fracasso como roqueiro, a experiência de certa forma o levou à atuação. 
No ginásio, Fabio exercitava seu QI de 133 (inteligência muito acima da média, segundo a escala) no colégio Bandeirantes. 
Mas festivais de música pela rede Objetivo o aproximaram da unidade Vergueiro dessa escola, onde foi fazer o colegial. 

A 100 metros, ele descobriu o Centro Cultural São Paulo e, lá dentro, um grupo de teatro amador - nota do Klau: foi nessa época que eu, que fazia parte desse grupo, o conheci.

Daí para a estreia no infantil "A Bruxinha que Era Boa" foi um ano. 
Cursou seis meses de publicidade e largou para entrar na Fundação das Artes, escola de teatro em São Caetano. 
Tinha 17 anos. 
Um ano depois estava na Globo. 

E o que atraiu Fabio para o mundo das artes? 
"Tinha um cara no grupo de teatro que não tinha dinheiro nem para um despertador. Para conseguir ir para o ensaio, ele bebia alguns copos de água antes de dormir. O que o acordava toda manhã era a vontade de urinar. Era o despertador do cara!".
Pessoas assim cativaram Fabio Assunção para sempre. 
Hoje, ele é um deles. 
"Sou melhor hoje do que há dez anos. Há mais coisas positivas do que negativas, pois as negativas já passaram. Aconteceu. E é isso."

Matéria do Jornalista Ivan Finotti para a revista Serafina, da Folha de S.Paulo de hoje

*****
O Brad Pitt brasileiro?
Por Laura Mattos

Fabio Assunção tinha tudo contra ele em 2007: era o mocinho da novela, enfrentava como antagonista um vilão charmoso de Wagner Moura e, pior, estava viciado em drogas. 

Em uma cena de "Paraíso Tropical", Moura pega Assunção pelo colarinho e o prensa contra a parede. 
Assunção surge em close, magro, abatido, e boa parte daquilo não era ficção. 
Mas levou a novela até o fim, até Daniel acabar com Olavo. 
Não era qualquer bonitinho que Moura enfrentava. 

Com carinha de anjo, Assunção corria o risco de ficar preso aos papéis de bom moço. 
E assim foi por um bom tempo. 

Mas ele sempre brigou com seu "physique du rôle", e não só fora da tela. 
Em 2004, vestiu terno preto, camisa preta e gravata preta para interpretar Renato Mendes, o jornalista mau caráter de "Celebridade". 
Era um vilão de Gilberto Braga, grande responsabilidade, e Assunção se saiu muito bem, um sacana encantador. 

Mas os problemas pessoais ofuscaram o talento em 2008, quando abandonou o mocinho de "Negócio da China"
Doente, não conseguia mostrar muito mais que os olhos azuis. 

No ano passado voltou à TV em grande forma, na minissérie "Dalva e Herivelto", após uma temporada de manchetes sensacionalistas. 
Com o bigodinho, o terno branco e as marchinhas de Herivelto Martins, deixou de lado aquele baixo astral. 

Em cena, é um ator que faz o público ver o personagem, não o cara com altos e baixos na vida privada. 

No final de 2010, abandonou o papel de vilão de "Insensato Coração", a pouco mais de um mês da estreia. 

Fabio Assunção não é alguém que se substitui facilmente. 
Sempre soube escolher papéis e brigar contra estereótipos. 
É ele seguir na busca por trabalhos mais densos, vencer seu problema pessoal e teremos o nosso Brad Pitt.

*****
De minha parte, considero Fábio Assunção o melhor ator da geração dele, disparado.
Vê-lo num palco é um momento precioso, especialíssimo, e com certeza estarei na estreia dessa nova peça em que atuará, e com certeza brilhará como sempre.

Toda sorte, saúde e felicidade para Fabio Assunção, seus filhos, sua família, sua vida.

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