Na prática, o julgamento de hoje – que deve fundamentar a análise de outras ações no país – irá decidir se casais homossexuais terão os mesmos direitos garantidos por lei aos casais heterossexuais.
Para isso, duas ações serão analisadas pela Justiça: uma encaminhada há mais de dois anos pelo governo do Rio de Janeiro, que pede que os casais homossexuais de servidores públicos tenham os mesmos direitos que os heterossexuais; e outra, de autoria da PGR - Procuradoria-Geral da União -, que argumenta que o não reconhecimento dos direitos dos casais gays fere a Constituição Federal.
Na prática, por causa do efeito vinculante, uma decisão favorável servirá de base para outras ações na Justiça em casos semelhantes.
Ou seja, o entendimento do Supremo deverá ser seguido por outros tribunais no país.
Assim, Pensão por morte, pensão em caso de separação, inclusão em plano de saúde, divisão de bens, herança, entre outros, estão entre alguns direitos que podem ser assegurados.
Os ministros do STF argumentam que a união homoafetiva já é uma realidade na sociedade, mas os embaraços técnicos dessa questão complicarão o julgamento.
O presidente da ABGLT - Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais -, Toni Reis, disse estar otimista em relação à análise do STF.
Para ele, o julgamento deve entrar para a história “de todos aqueles que lutam pela igualdade”, caso os ministros concordem com as reivindicações.
"É uma oportunidade histórica que a Justiça tem de nos conceder os 78 direitos básicos negados, até hoje, pelos quais brigamos há muitos anos".
Entre os 78 direitos negados pela União, segundo a ABGLT, está a possibilidade de adotar o sobrenome do parceiro e de assumir a guarda do filho do cônjuge.
Já o governo fluminense pede também a inclusão de cônjuges do mesmo sexo em planos de saúde e o direito à herança, entre outros.
Para o coordenador da campanha estadual Rio sem Homofobia, Cláudio Nascimento, a expectativa é de que o STF estenda para o país o que já foi conquistado caso a caso nos tribunais. "No debate sobre união civil homossexual, o Poder Judiciário tem sido mais ativo que o Legislativo. As sentenças têm sido favoráveis, mas o direito precisa ser coletivo. Para a nossa alegria, contamos também com um dos relatores mais progressistas em direitos humanos dentro do plenário, Ayres Britto".
Nascimento explica que o processo do Rio baseia-se na questão de que todos são iguais perante a lei.
"Será um momento muito importante, por isso torcemos para que não seja adiado. Os homossexuais são cidadãos dignos, que pagam seus impostos e, no entanto, não são devidamente respeitados".
O relator das ações é o ministro Carlos Ayres Britto, e, para passar a valer legalmente, a união homoafetiva precisa contar com o voto da maioria dos ministros presentes na sessão.
Hoje, a união de pessoas do mesmo sexo é tratada como uma sociedade de fato.
Por esse entendimento, a Justiça entende que duas pessoas resolveram viver juntas com a finalidade semelhante à de uma atividade econômica, cujo objetivo seria dividir os resultados desse negócio.
Assim, para ter direito aos bens obtidos durante essa união, um dos integrantes do casal precisa provar que contribuiu para a compra desse bem, o que já não é exigido para um casal heterossexual.
De acordo com dados do Censo 2010, divulgados em abril, cerca de 60 mil brasileiros dizem morar com cônjuge do mesmo sexo.
O número corresponde a 0,03% do total da população - já 19,7% dos brasileiros afirmam morar com cônjuge de sexo diferente.
Entre os Estados, o Rio de Janeiro teve a maior concentração (0,063%), seis de cada 10 mil.
Para Nascimento, o número ainda está longe da realidade.
"Algumas pessoas ainda não se aceitam se colocar como gays. Lembro que quando perguntavam sobre a cor, muitos negros colocavam-se como pardos. O número de gays no Brasil é significativo".
A TV Justiça e o UOL estão transmitindo ao vivo o julgamento no STF.
O link do UOL é: http://noticias.uol.com.br/aovivo2/
O Globo
O relator, Ministro Carlos Ayres Britto
Conforme o esperado, o ministro Carlos Ayres Britto, relator de duas ações sobre união civil de homossexuais no STF, se pronunciou a favor da iniciativa, alegando que a Constituição brasileira proíbe preconceito e que os casais gays sofrem com insegurança jurídica por não compartilharem direitos dados a casais heterossexuais.
A leitura do voto durou cerca de uma hora.
Em seguida, falariam os colegas dele na mais alta corte do país, mas, pelo adiantado da hora, a sessão foi encerrada e deve ser retomada amanhã, às 14h.
“O sexo das pessoas não se presta como fator desigualação jurídica”, afirmou o ministro.
“A Constituição brasileira opera por um intencional silêncio [em assuntos sexuais]. Mas não é lacuna. Já é um modo de atuar. A ausência de lei não é ausência do direito, que é maior do que a lei”, completou Ayres Britto, para quem “nada é mais íntimo e privado do que a prática da própria sexualidade”, indicando que o Estado não deve interferir nesses temas e ceder direitos iguais a casais gays.
O relator disse ainda que a admissão da união civil de homossexuais “não se trata de uma mera sociedade de fato por interesse mercantil”. É um voluntário navegar por um rio sem margens fixas”, disse ele, que vê insegurança jurídica repassada a casais gays unicamente “por visões morais”. “Pertencer ao sexo masculino ou feminino é apenas um fato que se inscreve nas tramas do imponderável, do incognoscível, da química da própria natureza”, afirmou.
Em seu voto, Ayres Britto também cogitou, sem se aprofundar, a possibilidade de adoção de crianças por casais homossexuais.
Ayres Britto leu seu voto depois de sete oradores falarem sobre o assunto: cinco a favor da união civil gay e dois contrários – o advogado da CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - comparou os homossexuais a polígamos e incestuosos.
Também se manifestou o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que levou uma das duas ações ao Supremo para que casais homoafetivos sejam admitidos como “entidade familiar”.
“Privar os membros de uniões homossexuais afetivas [de seus direitos] atenta contra sua dignidade, expondo-os a situações de risco social injustificável”, disse Gurgel.
“Quando o Estado nega-se a reconhecer uniões homoafetivas, ele instrumentaliza os homossexuais, sacrificando seus direitos. Ao não reconhecer as uniões homoafetivas, o estado compromete a capacidade do homossexual de viver a plenitude de sua orientação sexual.”
A outra ação foi levada ao STF pelo governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), para que funcionários públicos homossexuais estendam benefícios a seus parceiros, através do reconhecimento de união estável.
A decisão a ser tomada pela Corte terá o chamado efeito vinculante, ou seja, será aplicada em outros tribunais para casos semelhantes.
Aguardemos, então, a continuação do julgamento amanhã.
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