quarta-feira, 18 de maio de 2011

CANNES 2011: JUDEU LARS VON TRIER POLEMIZA AO SE DECLARAR NAZISTA E ANTI-SEMITA

Confira as manchetes do que foi notícia nesta quarta (18) no Festival de Cannes:

A LENDA BELMONDO RECEBE PALMA POR SUA CARREIRA
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PETER FONDA CHAMA OBAMA DE "TRAIDOR"
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ASCENÇÃO DE SARKOZY AO PODER É O PANO DE FUNDO DE "A CONQUISTA"
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FILME JAPONÊS "NATUREBA" NÃO AGRADOU
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LARS VON TRIER MOSTRA NOVO FILME, PROVOCA CONTRANGIMENTO AO SE DECLARAR NAZISTA, MAS DEPOIS SE DESCULPA
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E agora, confira as matérias, sempre com muita informação, fotos e vídeos:

A LENDA BELMONDO RECEBE PALMA POR SUA CARREIRA

Maior ator francês ainda vivo, a lenda Jean-Paul Belmondo, 78, recebeu a Palma de Ouro nesta terça (17) à noite pelo conjunto de sua obra, em uma emotiva cerimônia no teatro Debussy do Palácio dos Festivais.

"Bébel", como é conhecido, foi aclamado por milhares de pessoas, feito inédito, pois até mesmo os 240 fotógrafos de imprensa credenciados puseram de lado as objetivas para aplaudir a estrela francesa.

"Estou emocionado com esta Palma de Ouro, que me vai direto ao coração. Quero agradecer a todos os que estão aqui, os que conheço e os que não conheço. Um grande obrigado do fundo do meu coração"!

No dia 17 de maio, após a premiére do documentário "Belmondo, The Career", de Vincent Perrot e Jeff Domenech, o ator será recebido em um jantar especial organizado pelo festival.

APA lenda Jean-Paul Belmondo em Cannes, ontem à noite

Belmondo consolidou sua carreira como um dos maiores atores do cinema francês durante os anos 60: começou a carreira trabalhando com diretores como
Jean-Luc Godard - com quem fez "Acossado" (1959),

"Uma Mulher é Uma Mulher" (1961),
"O Demônio das Onze Horas" (1965), Jean-Pierre Melville - com quem filmou

"Léon Morin, prêtre" (1961) e René Clément - em "Paris Está em Chamas?" (1966).

Na segunda metade dos anos 60 fez uma transição para o cinema comercial, atuando em comédias e filmes de ação.

Foi nomeado duas vezes para o Bafta como melhor ator estrangeiro e ganhou um César, o prêmio da indústria francesa, por "Itinéraire d'un enfant gâté" (1989).

"Estamos felizes por ele ter confirmado presença neste evento de gala, como celebração de seu talento e carreira", afirmaram em nota no site oficial do festival os organizadores Thierry Frémaux e Gilles Jacob.
"Seu carisma, inteligência, tranquilidade e sua atuação precisa o transformaram, junto com Jean Gabin e Michel Simon, em um dos maiores atores franceses", completaram os dois.

A lenda merece!


PETER FONDA CHAMA OBAMA DE "TRAIDOR"

O ator Peter Fonda chamou o presidente americano, Barack Obama, de "traidor de merda" nesta quarta (18), durante uma entrevista no tapete vermelho do Festival, pela maneira como ele lidou com as consequências do vazamento de petróleo que afetou o Golfo do México no ano passado.

Fervoroso defensor da causa ambientalista, Fonda co-produziu o documentário
"The Big Fix", de Rebecca e Josh Tickell, que conta a história da explosão da plataforma de extração da BP no Golfo do México, que provocou a maior catástrofe ambiental da história dos Estados Unidos - a produção é a única que compete na seleção oficial de Cannes este ano.

AFP


Fonda acusou Washington de tentar manipular a situação e enganar o público.
"Eu mandei um email para o presidente Obama dizendo: 'você é um traidor de merda', usando estas palavras... 'Você é um traidor, você permitiu que botas estrangeiras pisassem em nosso solo e dissessem às nossas forças armadas - no caso, a guarda costeira - o que elas podem ou não podem fazer, e dizendo a nós, cidadãos dos Estados Unidos, o que podemos ou não podemos fazer'", afirmou o ator - Fonda disse ter enviado o email na semana passada.

Familia ativista é assim! E por falar nisso, por onde anda a irmã de Peter, Jane Fonda?


ASCENÇÃO DE SARKOZY AO PODER É O PANO DE FUNDO DE "A CONQUISTA"

Em pleno escândalo pela detenção do socialista francês e diretor do Fundo Monetário Internacional - FMI - Dominique Strauss-Kahn, até então cotadíssimo como futuro candidato à Presidência da França, a ascensão ao poder de seu rival Nicolas Sarkozy, estreou em Cannes nesta quarta (18).

Enquanto "Melancolia" de Lars Von Trier dominou a atenção do mundo hoje em Cannes, os franceses estavam interessados em outra coisa: "A Conquista", do diretor francês Xavier Durringer, que dramatiza o período entre 2002 e 6 de maio de 2007 - exatamente o dia em que Sarkozy conquistou a chefia do Estado em eleições presidenciais que arruinaram sua vida conjugal.

A estreia passa pelo festival fora da competição, mas os organizadores programaram sua exibição sem que ninguém mais que eles, nem mesmo o governo francês, soubesse do que se tratava.

A chefia do Estado, o poder, "nunca viu o roteiro", declarou Durringer, que garantiu que o projeto "foi filmado quase em segredo", precisamente para evitar influências e manipulações como as narradas no filme, onde Sarkozy e seus "sarko-boys" têm às vezes o aspecto de pequenos - ou grandes - mafiosos.

Contudo, Durringer assinalou que se trata de uma reconstrução baseada em fatos reais, que não necessariamente tem correspondência literal com nenhuma ocasião concreta e com pinceladas de romance policial.

O autor do roteiro, Patrick Rotman, acrescentou: "a realidade é muito mais forte que a ficção".

Um ator da prestigiosa Comédie Française, Denis Podalydes - que já teve papéis pequenos em filmes como "O Código Da Vinci" (2006) e "Caché" (2005), se transforma em um Sarkozy ridicularizado pelo presidente Jacques Chirac, que constantemente lhe chama no filme de "petit Nicolas".

Um Nicolas diminuído por sua ambição de poder, ridicularizado pela estatura quando gravava uma pequena mensagem de campanha eleitoral e abandonado por sua esposa, Cécilia, que volta a estar ao seu lado só para dar-lhe o empurrão final à Presidência.

Patéticos: assim estão todos os protagonistas da história, ambiciosos oponentes na cena política francesa, atores de rasteiras, olhares e palavras diretamente insultantes, embora ditas com todo o - falso - refinamento dos franceses.

"Nunca foi feito um filme panfletário", defendeu em entrevista coletiva um dos produtores, Eric Altmayer, que reconheceu que tiveram cuidado para evitar as consequências jurídicas que teriam alusões à intimidade dos personagens.

Neste filme não se cita, por exemplo, a atual primeira-dama, Carla Bruni, ausente assim como o próprio Sarkozy de um Festival que tem os dois em cartaz: ela como ponta de luxo no filme de Woody Allen - "Meia-Noite em Paris" - e ele como tema desse projeto de Durringer.

Surpreendentemente, a entrevista coletiva dos atores, diretor e produtores foi uma das que registraram menos jornalistas credenciados - e terminou com tímidos aplausos.

Confira o trailer de "A Conquista/La Conquête":


"A Conquista" tem o interesse de apreciar um estilo de fazer política supostamente exercido por políticos em serviço e de observar uma rivalidade, que por outra parte não é segredo para ninguém, entre Sarkozy e o ex-primeiro-ministro Dominique de Villepin.

"É um filme em 90% fiel do ponto de vista político", assegurou Durringer, no sentido que se as cenas não são literais, já que a maioria são recriações e muitas nem sequer existiram, dão o "espírito" do discurso de seus protagonistas.

A história de "A Conquista" foi acompanhada da estreia de "Pater", outro filme sobre política francesa atual, protagonizado por Vincent Lindon e dirigido por Alain Cavalier.


FILME JAPONÊS "NATUREBA" NÃO AGRADOU

A japonesa Naomi Kawase apresentou em competição "Hanezu no Tsuki", um ensaio poético sobre uma mulher, o marido e seu amante que vivem na região de Asuka, conhecida como o lugar de nascimento do Japão - a diretora já foi premiada duas vezes no festival, por "Suzaku" (1997) e "A Floresta dos Lamentos" (2007), exibido na Mostra de São Paulo.

No filme, Kawase filma a natureza como nenhum outro diretor contemporâneo.
"A natureza não só o cenário, é o personagem principal do meu filme. Temos que entender que a natureza é parte de nós, e não podemos viver sem ela".

Confira o trailer do filme:


Pena que, segundo a crítica, e apesar da atmosfera poderosa do filme, as propostas de "Hanezu" permanecem indecifráveis para o espectador ocidental.


LARS VON TRIER MOSTRA NOVO FILME, PROVOCA CONTRANGIMENTO AO SE DECLARAR NAZISTA, MAS DEPOIS SE DESCULPA

O dinamarquês Lars Von Trier apresentou nesta quarta (18) em Cannes "Melancolia", uma sátira sobre o fim do mundo, realizado segundo ele para superar uma depressão - o filme está na disputa pela Palma de Ouro,

Antes da polêmica - leia abaixo o diretor falou sobre o filme.
"Não é realmente um filme sobre o fim do mundo, e sim sobre um estado de ânimo. Passei por fases melancólicas, mas acredito que superei. Parei de beber, leio livros, agora me sinto bem. Mas a melancolia na arte, na música, é algo que sempre me agradou, algo que me comove", disse o diretor.

O filme começa no espaço sideral, com imagens do planeta "Melancholia", que segundo estudos de astrônomos se aproxima da Terra e a destruirá - a música do compositor alemão Richard Wagner aumenta a tensão.

Reuters

Depois, von Trier conta o que seriam os últimos dias do mundo através de duas irmãs, Justine e Claire, interpretadas pela americana Kirsten Dunst e pela francesa Charlotte Gainsbourg, vencedora em 2009 do prêmio de melhor atriz em Cannes por "Anticristo", também do dinamarquês.

Justine, publicitária, chega mais de duas horas atrasada ao próprio casamento e isto dá início a uma série de acontecimentos.

As cenas da festa lembram "Festa de Família", de Thomas Vinterberg, compatriota de von Trier e seu companheiro no grupo "Dogma" (1990), que questiona todas as convenções, tanto do cinema como sociais.

A segunda parte do filme trata da iminente aproximação do planeta Melancholia, onde Claire, o marido e o filho observam com crescente angústia o fenômeno em um telescópio.

Divulgação

Justine, nervosa e agitada durante o casamento, agora parece muito calma ante o choque de planetas. Ela proporciona ao pequeno sobrinho a única possibilidade de refúgio diante da catástrofe: "uma cabana mágica".

"Gosto de tudo o que tem relação com a dor, com o sofrimento, mas também tenho um lado de luz", disse o cineasta.

O dinamarquês afirmou que o planeta está destruído, mas disse que isto não é grave porque todos vão morrer, destacando que segue muito interessado em arte.

Confira o trailer de "Melancolia":


Mas na sequência da entrevista, o diretor provocou a maior polêmica de Cannes 2011 até agora, ao afirmar que compreendia e sentia "um pouco" de compaixão por
Adolf Hitler, ao ser indagado sobre suas raízes alemãs.

Ao lado de uma constrangidíssima Kirsten Dunst, Von Trier declarou entender o líder nazista.

Reuters

Mais desconcertada ainda ela ficaria logo depois, quando o diretor, ao falar sobre os papeis femininos do filme, apontou para a atriz e disse: "Bem, e Kirsten sabe o que é ter depressão".
Ao se dar conta de que, talvez, tivesse cometido uma gafe, virou-se para ela e perguntou se podia falar disso - Dunst apenas sorriu, e balançou a cabeça.

"A gente vê a tristeza no olhar dela", emendou o cineasta, que continuou:
"Eu realmente gostaria de ser judeu, e então descobri que na verdade eu era um nazista. Você sabe, porque minha família era alemã, Hartmann, o que também me dá um certo prazer", declarou, respondendo a uma pergunta sobre a origem alemã de sua família - nota do Klau: Von Trier é considerado um judeu, pois nasceu judeu, cresceu judeu - É judeu.

"Eu compreendo Hitler. Acho que ele fez algumas coisas erradas, sim, com certeza, mas eu consigo vê-lo sentado em seu bunker no final", continuou o cineasta.

Quando Dunst, que também tem origem alemã, arregalou os olhos, claramente desconfortável com os comentários do diretor, e murmurou para Charlotte Gainsbourg um assustado "meu Deus!", Von Trier tentou acalmá-la: "mas eu tenho um argumento no final disto".

"Estou apenas dizendo",
tentou explicar Von Trier, "que acho que entendo este homem. Ele não é o que você poderia chamar de um cara legal, mas sim, eu entendo muito a seu respeito, e sinto por ele um pouco de compaixão, sim. Mas vá lá, eu não sou a favor da Segunda Guerra Mundial. E não sou contra os judeus".

Sob o olhar incrédulo dos repórteres, aparentemente ainda não satisfeito, o cineasta concluiu sua fala com uma crítica a Israel e um elogio a Albert Speer, arquiteto oficial do Terceiro Reich.

"É claro que gosto muito dos judeus - mas nem tanto, porque Israel é um pé no saco. Mesmo assim - como é que eu termino esta frase? - eu apenas gostaria de dizer, sobre a arte, que gosto muito de Speer", indicou, destacando o "talento" do arquiteto nazista, condenado por crimes contra a humanidade.

"O.K., então, sou um nazista", disse o surtado Von Trier, dando de ombros e sorrindo nervosamente.

Em seguida, ele revelou que seu próximo filme poderia ser "A Solução Final", termo usado pelos nazistas para designar o Holocausto.

Segundo o site da revista especializada The Hollywood Reporter, Von Trier virou o
"Mel Gibson de Cannes", em alusão às notórias posições antissemitas e sexistas do ator nos últimos anos.

E a revista continua:
"Von Trier nunca foi muito politicamente correto e estas entrevistas coletivas de Cannes sempre acabam se revelando uma rotina teatral, mas na coletiva de "Melancolia", ele levou a questão para um novo nível, lançando uma granada em qualquer senso de decoro público".
"Se isto fosse a América, e não Cannes, teria sido um suicídio profissional",
sentenciou a The Hollywood Reporter.

Com a repercussão negativa, a organização do Festival resolveu pedir explicações ao diretor, que se retratou em comunicado distribuido à imprensa.

Confira o comunicado da organização do Festival:

O Festival de Cannes ficou preocupado com as declarações de Lars von Trier, na sua entrevista coletiva de imprensa esta manhã em Cannes.
Portanto, o Festival lhe pediu para dar uma explicação para os seus comentários.
O diretor afirma que ele se deixou instigado por uma provocação.
Ele apresenta as suas desculpas.
A direção do Festival reconhece isso e está passando adiante as desculpas de
Lars von Trier.
O Festival está convencido de que ele nunca iria permitir que o evento se torne um fórum para pronunciamentos sobre tais assuntos.

A direção do festival afirmou, ainda, que esse tipo de manifestação não pode acontecer no teatro do Palais.

Em seguida, veio o comunicado distribuído pela assessoria de Von Trier, em que o cineasta pede desculpas:

Se eu ofendi alguém esta manhã com as palavras que disse na coletiva de imprensa, peço desculpas sinceras.
Não sou antissemita ou racista de qualquer maneira, e muito menos nazista.


Como relata o jornalista Mateo Sancho Cardiel - da Efe, foi uma pena, já que assim desviou a atenção de "Melancolia" que é o equivalente aos exercícios de desarme de outros cineastas como David Cronenbergh e seu "Senhores do Crime" e David Lynch e sua "História Real", de modo que, longe de perder a assinatura, os deixam desnudos com mais força do que nunca.

Certamente, existe a grandiloquência, existe o coquetel de referências artísticas, tem Wagner - compositor favorito de Hitler - e há um planeta que arrasará a Terra, mas o filme "não é sobre o apocalipse, mas sobre a necessidade de expressar-se", que não é mais o ponto forte dos grandes autores escandinavos de todos os tempos.

É visível seu interesse por personagens desequilibrados e sua aproximação ao eterno dilema entre ciência e intuição.

O filme encontrou, apesar de não uma ovação fechada, cumplicidade de um público muito mais amplo do que costuma acompanhar um diretor que levanta tanto a paixão quanto o ódio.

Kristen Dunst, a noiva que mergulha em uma depressão poucas horas após dizer o
"sim, eu aceito", é a protagonista deste díptico da complexidade feminina - outro cabe a Charlotte Gainsbourg, como sua controladora irmã, apavorada pelo fim dos tempos.

Até a contagem regressiva da espécie humana completa o quadro psicológico familiar Charlotte Rampling, como a impiedosa mãe, e John Hurt - o Lionel Luthor de "Smallville" - como pai desinteressado.

Dunst, que já esteve em Cannes como a protagonista de "Maria Antonieta" - de
Sofia Coppola - deslumbra desta vez por sua capacidade de conduzir na hora de mostrar o leque de fortalezas e fragilidades de sua personagem, Justine, e sua interpretação merece prêmio se ao fim o júri tiver critérios estritamente cinematográficos.

O filme recebeu fortes aplausos no fim da sessão de imprensa - e nenhuma vaia, o que é bastante incomum para Von Trier.

"A depressão no fundo é um processo de abrir-se de igual para igual e fortalecer-se", disse a atriz.

Von Trier também acaba de recuperar-se de uma depressão. E sim, voltou mais forte.

"Melancolia" tem estreia prevista para 5 de agosto nas telonas brasileiras.

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Com Efe, AFP, Getty Images, site do festival, AP e Reuters
Redação Final: Cláudio Nóvoa

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