Virar motivo de chacota entre os colegas, sofrer com manifestações de bullying, racismo ou homofobia na internet acontece com muito mais frequência do se imagina.
“Monitoramos 3.500 veículos de comunicação e mídias sociais durante cinco dias e encontramos mais de 38 mil interações que utilizavam palavras de baixo calão para falar sobre empresas, marcas, personalidades e outros indivíduos”, comenta Elizangela Grigoletti, gerente de inteligência e marketing da MITI Inteligência, empresa paranaense que oferece serviços de monitoramento de mídias online.
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Mesmo sem legislação específica para crimes virtuais, internautas podem sofrer punições legais
Se os sites anunciam casos de intolerância na internet, nas redes sociais a repercussão é ainda maior.
“No caso Bolsonaro [deputado federal Jair Bolsonaro], por exemplo, a divulgação inicial ocorreu nos veículos de massa, mas a exposição alcançou grandes proporções nas redes sociais. Nos canais de relacionamento, as pessoas acabam expressando seus pensamentos e opiniões, muitas vezes ultrapassando os limites determinados pela sociedade, cometendo atos de bullying, racismo e outras intolerâncias”, revela Elizangela.
Nas ondas da web
CRIMES MAIS DENUNCIADOS
- Pornografia infantil
- Apologia e incitação a crimes contra a vida
- Homofobia
- Xenofobia (aversão ou ódio aos estrangeiros, ou à cultura estrangeira)
- Racismo
- Intolerância religiosa
- Neonazismo
- Maus tratos contra animais
- Tráfico de pessoas
Fonte: SaferNet Brasil (Site Institucional de Proteção aos Direitos Humanos na Sociedade da Informação); ranking de denúncias registradas de janeiro a abril de 2011
Mas por que tantos se sentem protegidos com o anonimato na internet? Será que o fato de estar atrás da tela do computador faz com que as feras internas se soltem?
“Sim, o lado sombrio ou reprimido das pessoas se libera por causa dessa sensação e não é uma coisa tão consciente assim. A condição de navegar gera um estado alterado de consciência, fazendo com que se perca a noção de tempo e espaço. É como um devaneio, um sonhar acordado, permitindo que a fantasia venha à tona. Por isso não é raro ver pessoas com dificuldades patológicas aflorarem e darem vazão a aspectos menos nobres e criativos”, explica a psicóloga Rosa Maria Farah, diretora do Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática (NPPI) da PUC-SP.
As agressões podem partir de pessoas de qualquer sexo, idade, faixa social ou mesmo cultura. “Quem comete o cyberbullying (assédio moral por meio da internet) muitas vezes não tem noção clara do tamanho da repercussão de seu ato e também sofre com isso”, afirma a psicóloga. “Vi o caso de um menino que fez uma brincadeira de mau gosto com um colega de classe e precisou de atendimento psicológico, pois perdeu o controle da gozação que fez. E não tem volta. Uma vez feito, não tem como voltar a fita”, diz Rosa Maria Farah.
O melhor jeito de evitar manifestações preconceituosas na internet, como o racismo e a homofobia, é educando os usuários.
Investir no esclarecimento das reações para todos os envolvidos e nas punições legais é o primeiro passo para diminuir consideravelmente os casos. “A internet é um brinquedo relativamente novo. Falta muito caminho para aprender”, afirma a psicóloga.
Nem tão anônimo assim
Engana-se quem pensa que pode cometer qualquer ofensa na internet sem ser punido. Não há grandes dificuldades para se encontrar culpados. O Brasil já conta, inclusive, com delegacias especializadas em crimes virtuais.
“A investigação inicia-se pela comunicação de ocorrência policial ou pelo pedido do Ministério Público através do reconhecimento do IP da máquina na qual foram criadas as páginas ou as mensagens ofensivas. A partir daí, uma série de procedimentos é adotada até chegar ao criminoso. O mais importante, realmente, é reunir provas, evidências e indícios de autoria e materialidade do crime que se pretende punir”, orienta a professora de criminologia Ana Cláudia Vinholes Siqueira Lucas, que leciona nas Universidades Federal e Católica de Pelotas (RS).
Algumas medidas de segurança podem ajudar os internautas a se protegerem contra o cyberbullying e até processarem os autores dos crimes de virtuais.
DICAS DE SEGURANÇA
Só aceite ter contato com pessoas em quem confia e conheça a integridade e reputação |
Nunca reaja às ofensas respondendo com mensagens agressivas. Denuncie às autoridades |
Se sua conta em alguma rede social sofrer qualquer alteração, não apague. “Procure orientação de profissionais como peritos, advogados, cartórios e policiais civis ou federais que poderão materializar as provas e fazer com que o autor do crime seja punido”, orienta Coriolano Aurélio de Almeida Camargo, presidente da Comissão de Crimes de Alta Tecnologia da OAB-SP |
Não delete comentários ou e-mails ofensivos. Eles são a prova do crime |
Oriente as crianças a conversarem com os pais ou com um adulto quando achar que um amigo está ofendendo ou pegando mais pesado em uma brincadeira |
Sempre denuncie e salve comentários ou mensagens ofensivas que receber. Faça um "print screen" da tela, se possível com data, horário e nomes do usuário agressor para ser usado como prova. Se for possível, registre a reclamação em cartório |
Denuncie as práticas de cyberbullying nos próprios sites. Facebook, Orkut e Youtube já possuem páginas de denúncia disponíveis para seus usuários |
Evite expor sua intimidade na internet com fotos (de viagens, com roupas íntimas ou de praia), músicas, religião, orientação sexual, idade, sonho e metas que deseja realizar |
Mensagens enviadas por celular ou e-mail podem ser bloqueadas. Se receber algo ofensivo, faça um boletim de ocorrência em uma delegacia especializada. Caso sua cidade não tenha, procure uma comum, registre o BO e faça a denúncia por meio do site da Polícia Federal |
É crime, denuncie
PARA DENUNCIAR CRIMES VIRTUAIS
- Ministério Público Federal
- Polícia Civil
- Safernet (associação civil dedicada ao enfrentamento aos crimes e violações aos Direitos Humanos na internet)
- Polícia Federal
ONDE PROCURAR AJUDA
- Serviço gratuito de orientação às vítimas de agressão, da PUC-SP: nppi@pucsp.br
Embora ainda não exista uma legislação específica para os crimes virtuais, alguns comportamentos já podem sofrer punições legais. “São exemplos o racismo e o bullying, que se constituem em crimes contra a honra (calúnia, difamação ou injuria). A pena para eles varia de acordo com as agressões. Se for injúria por elementos referentes à raça, cor, etnia, religião, por idosos ou portadores de deficiência, a pena pode variar de um a três anos de reclusão e multa”, revela a professora de criminologia Ana Cláudia Vinholes Lucas.
O caso de bullying é um pouco mais complexo. “Há várias condutas que se encaixam neste gênero e, portanto, os criminosos também variam (entre mais e menos agressivos), fazendo com que a pena se diferencie. É importante avisar que a internet é um meio que facilita a propagação da ofensa e a pena prevista para o crime sempre será aumentada em um terço”, afirma a professora.
Abaixo, Coriolano Aurélio de Almeida Camargo, presidente da Comissão de Crimes de Alta Tecnologia da OAB-SP, explica os crimes cometidos virtualmente e as punições para cada um deles:
Calúnia: deixar mensagens no perfil de um usuário de um site de relacionamento com afirmações falsas e desonrosas. “A pena para esse delito é a detenção de seis meses a dois anos, além do pagamento de uma multa”. |
Difamação: divulgar que um determinado empresário foi visto saindo do motel acompanhado, por exemplo, também pode gerar punição legal. “Sendo verdadeiro ou falso, o crime subsistirá e o que importa é que prejudica a reputação da vítima. O delito tem pena de detenção de três meses a um ano e a cobrança de uma multa”. |
Injúria: xingamentos, como publicar no Facebook que determinada pessoa é prostituta ou dependente de drogas. “Ou até mesmo filmar a vítima sendo agredida ou humilhada e colocar no Youtube. A pena é detenção e varia entre um a seis meses, mais o pagamento de uma multa. Se for com violência, a pena pode ser de três meses a um ano de detenção, além da cobrança de uma multa. Se tiver racismo, vai para um a três anos de detenção e multa". |
Ameaça: “É corriqueiro a vítima ir à delegacia para informar que recebeu e-mails e mensagens instantâneas com ameaças de morte. A pena é de detenção de um a seis meses ou multa”. |
Constrangimento ilegal: ameaça para cometer algo fora da lei ou que a pessoa não queira fazer. “Por exemplo, se um garoto manda uma mensagem instantânea para a vítima dizendo que vai agredir um familiar dela caso não ligue a webcam. Ou de uma menina que ameaça matar o cachorro da outra se continuar com o ex-namorado dela. A pena para este delito é a detenção de três meses a um ano ou multa”. |
Falsa identidade: atribuir-se ou atribuir a outra pessoa identidade falsa para obter vantagem ou proporcionar dano. “Tem sido frequente em sites de relacionamentos, como o caso da mulher casada que cria um perfil falso para se passar por outra pessoa solteira e conhecer homens. Ou mesmo como o caso recente de uma pessoa que criou um perfil falso de um desafeto para ofender, colocando a vítima em situação embaraçosa. A pena prevista é de três meses a um ano ou multa, se o fato não for considerado mais grave". |
Molestar ou perturbar a tranquilidade: este caso é uma contravenção penal, que permite punir quem envia mensagens desagradáveis que incomodem a vítima. “A prática do cyberstalking, que consiste no ato de perseguir a vítima e ultrapassar os limites de sua privacidade também se enquadra nesse crime, como o caso de mandar e-mails repetidamente para a vítima. A pena é de prisão simples, de 15 dias a dois meses ou multa”. |
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Matéria Base: Kátia Deutner - UOL
Redação Final: Cláudio Nóvoa
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