sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

OS 50 ANOS DE "LA DOLCE VITA", DE FELLINI

Em 5 de fevereiro de 1960, as salas de cinema italianas foram testemunhas do sonho felliniano que marcaria o antes e o depois na história do cinema, e que se transformou no símbolo de um estilo de vida, de uma "dolce vita" romana marcada pelas exibições mundanas, a decadência e os excessos.E não demoraria para que as telonas, mundo afora, aclamassem o filme feito por um dos maiores diretores de cinema de todos os tempos.

O diretor italiano Federico Fellini

Desde a primeira exibição, o filme levantou reações e críticas, elogios e admiração, insultos e ataques, que apontavam uma suposta "imoralidade" do filme e seu clima de corrupção. O que todos nem inaginavam é que, com todas essas controversas opiniões, estavam confirmando - e testemunhando - o nascimento de um mito.

O centro católico cinematográfico classificou o filme de "excluído para todos", e alguns críticos que deram opiniões favoráveis ao filme foram demitidos pelos jornais.

A marca deixada pelo diretor de "Otto e mezzo" e "Amarcord" trouxe símbolos, um mosaico de estereótipos e um universo onírico que muitos ainda buscam ao perder-se pelas ruas de Roma.

Quando lá estive, fiz questão de ir a todos os lugares que o filme mostra, e a emoção que tomou conta de mim foi muito grande.

A diva interpretada pela atriz sueca Anita Ekberg, que repete infinitas vezes sua chegada ao aeroporto para posar diante dos fotógrafos, o intelectual atormentado e o caçador de imagens comprometedoras vivido pelo soberbo Marcello Mastroiani - e foi a partir desse filme que o termo "paparazzo" ficou conhecido - desfilam por essa fantasia feita realidade, fragmentada em cenas aparentemente desconexas em um paradigma agridoce da "notte romana", tudo ao som da trilha criada pelo compositor Nino Rotta, que ainda faria as trilhas dos "Poderoso Chefão", "Romeu e Julieta", "Roma Cidade Aberta" e "Casanova de Fellini", entre outras.

Por tudo isso, ainda é um dos filmes italianos mais premiados em todos os tempos.

No Oscar de 1962, "La Dolce Vita" venceu na categoria de melhor figurino - preto e branco, e foi indicado nas categorias de melhor diretor, melhor roteiro original e melhor direção de arte - preto e branco.

Foi o grande ganhador do BAFTA 1961, o principal prêmio de cinema do Reino Unido, foi o ganhador da Palma de Ouro de melhor filme em Cannes - 1960

No Prêmio NYFCC - 1961,venceu na categoria de melhor filme em língua estrangeira.

No prêmio do Sindacato Nazionale Giornalisti Cinematografici Italiani - 1961, venceu nas categorias de melhor ator (Marcello Mastroianni), melhor história original e melhor cenografia.

Hoje, não se vê mais aquela multidão de "paparazzi" na Via Vêneto, mas a magia com que Federico Fellini criou "La Dolce Vita", com as suas mais surpreendentes contradições, conserva alguns cantos, como o famoso Café de Paris, que o diretor retratou e tornou em um dos centros do glamour da cinematografia europeia.

Roma à época do filme era um lugar ícone de um mundo tão extravagante e vazio, corrupto e agradável. Mas hoje o que se vê na "cidade eterna" são muitos sinais de uma sentida decadência. O próprio Café de Paris pertence hoje à máfia da Calábria, a Ndrangheta, que o comprou há um ano por 6 milhões de euros, e o destino de discotecas como Jackie O - símbolo da vida noturna romana - , frequentada por Grace Kelly, Jacqueline Bisset, Marcello Mastroianni e Vittorio Gassman, nos anos 90, virou ponto de encontro de criminosos.

Mas é só se afastar da Via Vêneto, e encontrar um dos lugares ainda pulsantes da cidade, um restaurante que fez da cidade eterna um centro de celebridades durante as filmagens de "Ben-Hur" e "Quo Vadis": a Taverna Flavia, que o tempo transformou em museu fotográfico, dirigido por Mimmo Cavicchia há quatro décadas.

As paredes deste estabelecimento, entre os favoritos das estrelas também na atualidade, são um autêntico mural de autógrafos no qual brilham centenas de assinaturas e rostos conhecidos, de Sofia Loren a Audrey Hepburn, de Woody Allen a Pedro Almodóvar.

Testemunha de histórias do cinema como o romance de Richard Burton com Elisabeth Taylor, maior estrela do local, tem uma sala com seu nome. Aí estão emolduradas as sandálias de "Cleópatra", talvez a peça mais cara do restaurante museu, que "Liz" presenteou a Cavicchia quando também rodou o filme nos estudios de Cineccitá.

"Os protagonistas da dolce vita eram os atores, e os espectadores saíram às ruas para viver e atuar como eles. Todos voltaram loucos e queriam imitar os personagens do cinema. Cada um se sentia protagonista à sua maneira", afirma Cavicchia.

Assim nasceu a vontade de recuperar o tempo perdido, de viver a loucura que Fellini imortalizou com a mítica cena na Fonte di Trevi - cujas águas têm ainda a marca de Anita Ekberg - um sonho para muitos tomar banho nessa fonte sempre abarrotada de turistas. O que ninguém mais se lembra é que essa fantasia nem Anita realizou: a fonte e a cena foram recriadas no "Estúdio 5" de Cinecittà. Essa é a magia do cinema!
E a cena é - ainda hoje, belíssima:




Os estúdios romanos são ainda hoje fábricas de sonhos que conservam o selo dos grandes do neorealismo, de Martin Scorsesse a Francis Ford Coppola.

De qualquer modo, Roma é a cidade imaginada por Fellini. Mas a "Dolce Vita" acabou, sentencia Cavicchia. "Já não existem esses grandes personagens, agora os atores só ficam um dia para apresentar seus filmes e estão condicionados aos seus agentes publicitários. Além disso, as pessoas estão atraídas pela televisão.Que "Dolce Vita" é esta? É a amarga vida!".

Pela Via Vêneto, hoje desfilam executivos, lá estão sedes de grandes bancos e hotéis de cinco estrelas. Só placas comemorativas, fotografias e alguns bares como o emblemático Harry's Bar, que ainda conservam sua luz, são uma exigência para os nostálgicos que querem respirar os resquícios daquela "Dolce Vita".
Se você ainda não viu esse grande filme, que eu considero um dos 20 filmes mais legais que eu vi na minha vida, ainda dá tempo: A maioria dos sites tem pra vender dvds com imagens e sons remasterizados.

Deixe-se levar pelo "dolce far niente". Divirta-se. Sonhe.




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