sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

FESTIVAL DE BERLIM: SEGUNDA SEMANA!


Nessa segunda semana, o 60o. Festival de Cinema de Berlim foi movimentado, comovente, glamuroso e polêmico.
E o Brasil fez uma bela participação.
Confira agora o que de melhor aconteceu:

"PLEASE GIVE" mostra a força das mulheres

As atrizes Rebecca Hall, Catherine Keener e Amanda Peet, do filme "Please Give"

"Please Give" participa da seção na condição de "fora-de-competição". O filme de Nicole Holofcener conta a história de várias mulheres que gravitam em torno de um prédio de apartamentos em Manhattan e são ligadas pela vizinhança ou por laços de família.

Com Catherine Keener, Amanda Peet e Rebecca Hall, "Please Give" chamou a atenção dos jornalistas, embora as perguntas mais delicadas não tenham sido respondidas diretamente durante a entrevista coletiva após a primeira sessão para a imprensa. Mas o filme levantou uma questão cada vez mais presente diante da participação americana: o que fazem filmes com esse perfil em um festival como o de Berlim e o que têm a acrescentar?

Holfcener e Keener responderam a essa pergunta indiretamente. "Na verdade, nessas ocasiões [os festivais de cinema], esperamos que o filme seja vendido", disse a atriz. "Não se trata de fazer filmes para ganhar prêmios", acrescentou a diretora. "Eu me preocupo mais em conseguir financiamento para os meus filmes ou convencer os atores que eu quero a trabalharem comigo."

Inspirado nas experiências pessoais de Holofcener e em cenas do cotidiano de amigos da diretora, "Please Give" conta a história de três personagens: Kate (Catherine Keener) e as irmãs Mary (Amanda Peet) e Rebecca (Rebecca Hall). Kate trabalha com o marido em um negócio de móveis usados e raros, comprados geralmente a preço de banana em liquidações de inventários. Rebecca cuida da avó nonagenária e administra a irmã mais velha, que trabalha em uma clínica de beleza e tem uma queda inacreditável para a futilidade.

Kate é vizinha da avó de Rebecca, em cujo apartamento ela passa a maior parte do tempo. "Filmamos no prédio de uma amiga minha", disse Holfcener. "Ela havia comprado o apartamento da vizinha e ficara amiga dela, quase como acontece no filme com Kate e a avó de Rebecca. Foi uma das histórias que conheço e que me inspirou a escrever esse roteiro."

O filme se movimenta principalmente em torno de Kate e de seu inconformismo com os abismos sociais, as questões éticas de seu negócio e a necessidade de educar adequadamente a filha adolescente. Sobre sua personagem e as ambiguidades que expõe, Catherine Keener disse que parecem ser plausíveis. "Eu sou uma pessoa como ela, todas nós somos", falou ela, ao ser questionada se a achava "boa pessoa". "E, claro, é uma pessoa boa. Os padrões não são muito elevados para avaliar se uma pessoa e boa ou não. Ela é humana."

Quando um dos jornalistas perguntou como havia sido a relação entre a diretora e as atrizes durante as filmagens, Holofcener logo partiu para a brincadeira: "Tinha que mantê-las separadas, porque elas se pegavam a tapa e puxões de cabelo, e em roupas de baixo". Keener, amiga da diretora de longa data, com quem fez quatro filmes até hoje, quebrou o estranhamento: "Foi uma relação ótima desde que nos conhecemos, de paixão à primeira vista".

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"Honey": ator mirim virou xodó da mídia internacional!

O ator-mirim Bora Altas

O filme turco "Bal", de Semih Kaplanoglu, terceira parte da trilogia "Yusuf", antecedida por "Milk" (2008) e "Egg" (2007) fez certo barulho em Berlim. Com o ator-mirim Bora Altas no papel principal, o filme atraiu a atenção e a simpatia dos jornalistas mais por conta da doçura do personagem e de seu pequeno intérprete do que exatamente pela unidade da força narrativa. Mas não parece se encaixar no que se espera de um júri presidido por Werner Herzog.

Único filho de pais que trabalham com mel e agricultura em uma região montanhosa e isolada da Turquia, Yusuf (Bora Altas) estuda na escola do vilarejo e tem dificuldade em se expressar, embora inveje os colegas que conseguem ler com facilidade em voz alta e ganham aplausos e pequenas medalhas do professor. A comunicação do menino se dá mais com o pai (Erdal Besikcioglu), com quem aprende os nomes das flores, que tipo de mel o pólem delas produz e noções de religiosidade e espiritualismo. Quando ele embarca em uma viagem, o menino se vê atabalhoado.

Kaplanoglu disse que procurou pelo ator ideal para o papel de Yusuf em diversas escolas primárias da região onde filmou. Mas o encontrou por acaso, enquanto andava na rua. "Eu o vi brincando e fui conversar com ele", contou, na entrevista coletiva após a primeira exibição do filme. "Logo percebi que tinha achado quem eu queria, mas não disse a ninguém até terminar os testes. Devo muito a ele, e quero tornar esse agradecimento público."

Boras teve a assistência de Tulin Ozen, que faz o papel da mãe de Yusuf no filme, durante as filmagens. Colaboradora e assistente de Kaplanoglu, a atriz ajudou a escolhê-lo para o papel e foi também responsável por treiná-lo. A maior dificuldade, segundo o diretor, era manter a concentração do menino. "Ele é um garoto muito vivo e, aos 7 anos, que era a idade que ele tinha quando rodamos, o mais difícil era fazer com que ficasse concentrado por um longo período e não se esquecesse do que havíamos feito antes", disse ele. "Mas se houvesse algum tipo de distração, começávamos de novo."

O pequeno Bora, que na maior parte do tempo esteve só observando, falou que não foi difícil fazer o filme. "Ele [o diretor] pedia para eu fazer algumas coisas e eu fazia", disse ele, sem se estender muito na resposta. "Só algumas coisas foram difíceis, mas ele sempre me ajudava." O menino só viu o filme na sessão de gala.

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Cinema Brasileiro fez sucesso

O diretor Jeferson De

O cinema brasileiro encerrou na quarta sua passagem pelo Festival com o drama "Bróder", de Jeferson De. As labirínticas vielas do bairro do Capão Redondo, na periferia de São Paulo, servem de cenário para o reencontro de três amigos que se veem mais uma vez envolvidos na violência do lugar.
Em entrevista coletiva, o diretor explicou que seu filme conta uma "história universal" narrada em um "lugar perigoso" como a zona sul de São Paulo, um ambiente que lhe é familiar. "Sou negro e venha da mesma camada social dos protagonistas da história. Mas, apesar disso, consegui chegar à universidade e estudar cinema", assegurou.

Suas origens, afirmou, dotam o filme de um "novo ponto de vista" incomum no cinema brasileiro e afastado do "racismo" que, em sua opinião, predomina na filmografia do país. Para De, seu filme não fala exatamente sobre a violência, mas "sobre o amor e a amizade de três jovens que se consideram irmãos" e sobre "aonde essa amizade acaba os levando".

O ator Caio Blat interpreta Macu, o único dos três amigos que continua vivendo na favela, imerso nas tramas das quadrilhas do lugar, e que recebe a visita de seus dois amigos de infância por causa de seu aniversário, justamente no mesmo dia em que ele deve cometer um sequestro.

Caio Blat em Berlim

A produtora de "Bróder", Renate Moura, falou sobre as dificuldades que a equipe encontrou para filmar no Capão Redondo, mas apontou que, por meio da colaboração com a associação de moradores e com a incorporação de moradores da região à equipe, os caminhos se abriram.

O rapper Du Bronx, um dos moradores que atuam em "Bróder", destacou que seu bairro "não é só uma área de traficantes". "O filme criou postos de trabalho e teve muitos efeitos positivos para o bairro. É o primeiro filme que mostra nosso bairro de forma positiva", apontou.

Apesar da presença do perigo e da violência, "Bróder" não se sustenta nesses elementos, apenas os sugere, e se concentra na relação dos três amigos.

O cinema brasileiro teve forte presença , principalmente nas mostras Panorama e Generation, dedicada ao cinema infanto-juvenil, ambas fora de concurso.

Além de "Bróder", participaram da Panorama "Besouro", "Fucking Different São Paulo" e "Waste Land", enquanto o filme "Os Famosos e os Duendes da Morte" e o curta "Avós" foram exibidos na Generation.

Dirigido por João Daniel Tikhomiroff, "Besouro" que conta a história do mito do lendário capoeirista que enfrentou os abusos dos fazendeiros das plantações de cana-de-açúcar para defender a população negra. Já "Fucking Different São Paulo" foi rodado por um coletivo de 12 jovens diretores - Joana Galvão, Monica Palazzo, Max Julien, Ricky Mastro, René Guerra, Silvia Lourenço, Sabrina Greve, Rodrigo Diaz Diaz, Elzemann Neves, Gustavo Vinagre, Herman Barck e Luciana Lemos.

O filme é o quarto de uma série produzida pelo alemão Kristian Petersen que, nesta ocasião, reúne uma série de 12 curtas-metragens que falam da situação dos homossexuais em São Paulo. O documentário britânico-brasileiro "Waste Land", por sua vez, foi produzido pelo cineasta Fernando Meirelles e dirigido pela inglesa Lucy Walker.

O filme acompanha o artista Vik Muniz no lixão de Jardim Gramacho, em Duque de Caxias (RJ), onde inspira catadores a criar autorretratos com lixo. Dentro da mostra Generation, "Os Famosos e os Duendes da Morte" de Esmir Filho, conta a história de um jovem de 16 anos que rememora com aversão e melancolia seu povoado natal, com a internet como único meio para poder expressar seus sentimentos.

Já "Avós", de Michael Wahrmann, tem como protagonista o menino Leo e as descobertas que faz ao tentar trocar as meias e cuecas que ganhou de presente de suas avós no seu aniversário de 10 anos, tudo registrado pela câmera dada por seu avô.

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Festival estende tapete vermelho pelos bairros de Berlim

A cada dia o tapete vermelho do Festival deixa o palco principal e se transfere para um bairro da capital alemã para aproximar os filmes da população e oferecer aos moradores a oportunidade de conversarem com diretores e atores, por meio do programa do "Festival de Berlim Goes Kiez".

Dois filmes são exibidos diariamente em cinemas ou teatros alternativos através do "Festival de Berlim Goes Kiez".

O programa faz parte do aniversário de 60 anos do Festival.

Em cada uma das projeções, uma personalidade de Berlim cumpre o papel de mestre de cerimônias e, com tapete vermelho incluído, dá as boas-vindas aos atores e diretores dos filmes, enquanto a multidão se amontoa para conseguir uma foto ou um autógrafo dos artistas.

Essa é também uma tentativa de popularizar o Festival e oferecer uma oportunidade maior aos cinéfilos.

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''The Kids Are All Right'' ,com Julianne Moore e Annette Bening: Comédia Familiar - e lésbica

A diretora Lisa Cholodenko na foto com a atriz Julianne Moore durante a divulgação do filme ''The Kids Are All Right''

A comédia familiar, exibida no Festival fora da competição principal, fez a plateia rir e aplaudir na quarta-feira, com seu roteiro inteligente e triângulo amoroso cada vez mais complicado que obriga as personagens a repensar suas vidas.
Moore, 49 anos, disse que vinha querendo trabalhar com a diretora Lisa Cholodenko desde o longa "High Art", de 1998, da diretora, que também trata de um relacionamento entre lésbicas.

Cholodenko levou quase cinco anos para concluir o roteiro. Mas, com o casamento homossexual sendo um tema do momento nos Estados Unidos, seu timing revelou-se bom.

Jules (Moore) e Nic (Bening) se esforçam para ser boas mães. As duas formam um casal rico que se orgulha das realizações acadêmicas de sua filha, Joni, e procuram manter a mente aberta quando desconfiam que seu filho, Laser, talvez seja gay.

Quando descobrem que Laser entrou em contato com seu pai biológico, as mulheres se sentem ameaçadas, mas acabam se afeiçoando ao californiano bonito e descolado a quem se referem como "o doador" ou "a fonte do esperma".

Mas as coisas azedam quando Jules começa a apaixonar-se por Paul (Mark Ruffalo), e Nic desconfia disso.

As duas mulheres ao mesmo tempo desprezam e abominam os usos e costumes sociais da Califórnia moderna, quer seja por suas bebidas saudáveis, alimentos orgânicos, compostagem ou atitude liberada em relação ao sexo.

Julianne Moore disse que o filme a atraiu porque trata da família, e não do tema atual do casamento homossexual.

"Para mim, é um retrato de um casamento e de uma família, fala de como é estar casada há muito tempo e ter filhos."

"Acho que a sexualidade da pessoa não vem ao caso. No caso de Annette e eu, ambas já fomos casadas, temos filhos, sabemos como é ser mães e viver um relacionamento duradouro", disse.

A atriz saudou a oportunidade de representar uma personagem perdida na estrutura de uma família.

"Sinto que já vi isso muito na vida, mas não se vê isso com frequência no cinema. Geralmente, no cinema, as pessoas têm uma ideia muito clara de para onde estão indo."

Toda orientação sexual envolve dúvida e isso é o que coloca Cholodenko no filme, que deslancha no momento em que os filhos adolescentes decidem conhecer seu pai biológico -Mark Ruffalo. Está aberto o precedente sobre o intruso que certo dia doou seu sêmen por US$ 60 o frasco.

O enredo é convencional. Nem uma cena foge da lógica e a ninguém ficam dúvidas sobre o raciocínio da linguagem. A questão é se haverá sequelas ou um questionamento irreversível sobre a orientação sexual como algo absoluto.

Moore é o lado feminino no casal e que inevitavelmente irá buscar de Ruffalo a ilusão de pertencer a uma família. Será a única dúvida na aparentemente sólida vida homossexual do casal lésbico.

"A dúvida sempre existe, não há amor sem dúvida, não há casal sem questionamento. Qualquer família se sustenta sobre a lealdade, isso é o importante, sejam duas mães lésbicas ou um pai e uma mãe", sustentou a atriz, que deixou no Festival de Berlim a áurea de impecável solidez que a caracteriza.

"Fiz algo convencional a partir da situação de uma família formada por duas mães, o que, por outro lado, felizmente deixou de ser algo anômalo", disse Cholodenko.

Moore é uma das minhas atrizes favoritas, e monopolizou os flashes do dia.

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O Renascimento do Cinema Alemão, em parte graças ao Festival

O cinema alemão foi no passado o patinho feio no Festival de Cinema de Berlim. Apenas alguns poucos filmes nacionais eram admitidos na programação, e isso a contragosto.
Mas a Berlinale virou vitrine do cinema alemão nos nove anos últimos,desde que Dieter Kosslick assumiu a presidência do festival no lugar do suíço Moritz de Hadeln, que foi odiado por cineastas alemães durante a maior parte de seus 22 anos de reinado em Berlim.

Fã declarado das produções alemãs, Kosslick já chefiava o principal conselho alemão de subsídio ao cinema e agora vem ajudando a renovar o cinema alemão com seu apoio declarado. Foi uma iniciativa arriscada da parte de um dos maiores festivais de cinema do mundo.

Sete dos 26 filmes da seleção principal deste ano foram feitos por cineastas alemães ou com dinheiro alemão - caso do thriller "The Ghost Writer", Polanski - que foi filmado em Berlim, no estúdio Babelsberg.

Outros filmes importantes feitos com direção ou financiamento alemão incluem "The Robber", sobre um maratonista austríaco que assalta bancos; "Jew Suss - Rise and Fall", sobre o nazista Joseph Goebbels, "Shahada", sobre muçulmanos na Alemanha, e "The Hunter", ambientado no Irã.

"Virou tradição nossa incluir filmes alemães na programação", disse Kosslick . "Isso vem sendo ótimo. O cinema alemão precisa ser divulgado. A aposta vem tendo resultado. No início, foi um pouco de ousadia, mas hoje já não é nada demais."

A iniciativa certamente vem sendo importante para os cineastas alemães, que se queixavam amargamente de descaso no passado. Desde 2002, filmes alemães ganharam vários prêmios Urso de Ouro e Urso de Prata em Berlim.

"A Berlinale voltou a abrigar filmes alemães", comentou Doris Doerrie, cuja comédia "Die Friseuse", sobre uma cabeleireira obesa, foi vista em uma das seções fora da competição principal e recebeu resenhas altamente elogiosas, tendo sido vendida para o exterior.

"É uma grande honra voltar a ter um filme em Berlim", disse a cineasta. Dos 392 filmes da edição 2010 do festival, 80 são alemães.

Benjamin Heisenberg, o diretor alemão da co-produção germano-austríaca "The Robber", disse que os cineastas mais jovens vêm fazendo filmes de todos os gêneros, não se limitando a trabalhos de autor sombrios, como no passado.

O absurdo tabu autoimposto contra dramas sobre a era nazista desapareceu após o sucesso comercial e crítico de "A Queda", sobre os últimos dias de Hitler. Antes disso, os cineastas alemães evitavam tratar do passado nazista de seu país.

Embora o cinema de Hollywood ainda domine na Alemanha e em muitos outros países, filmes alemães foram responsáveis por 27,4 por cento da bilheteria alemã no ano passado, superando os 26,6 por cento de 2008.

Filmes feitos na Alemanha também vêm tendo presença forte em outros festivais e premiações. Kate Winslet recebeu um Oscar de melhor atriz e outros prêmios por "O Leitor," filmado em Babelsberg e vários pontos da Alemanha, com apoio financeiro alemão.

O drama "A Fita Branca", do diretor austríaco nascido em Munique Michael Haneke, foi filmado e financiado na Alemanha e recebeu a Palma de Ouro de melhor filme no festival de Cannes em 2009, além de duas indicações ao Oscar este ano.

E "Bastardos Inglórios", de Quentin Tarantino, foi filmado em Babelsberg com grande apoio local. O filme recebeu oito indicações ao Oscar e sua bilheteria mundial supera os 300 milhões de dólares.

O apoio vem do Fundo Federal Alemão para o Cinema (DFFF), lançado em 2007. O fundo já gastou 178 milhões de euros, fornecendo até 20 por cento do orçamento de vários filmes.

Isso levou ao investimento de 1,1 bilhão de euros em 300 filmes na Alemanha desde 2007. Além do DFFF, há outros 250 milhões de euros disponíveis em outros subsídios de conselhos públicos de cinema.

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Irã impede viagem de diretor ao Festival

O Irã impediu que um diretor de cinema viajasse na terça-feira para Berlim.

Segundo eles, a proibição da viagem foi imposta sobre Jafar Panahi, vencedor de diversos prêmios internacionais, inclusive o principal prêmio do festival de cinema de Veneza por "O Círculo" em 2000.
"É ridículo pensar que se pode impedir pessoas de dizerem o que pensam", disse o diretor iraniano Rafi Pitts após a exibição de seu filme "The Hunter" .

"Acredito na liberdade de expressão... Acredito que as pessoas deveriam ter o direito de viajar para onde quiserem, acredito que ele deveria estar aqui", disse Pitts em coletiva de imprensa.

"The Hunter" e o documentário "Red, White & the Green", de Nader Davoodi, foram exibidos no mesmo dia, relembrando os protestos após as disputadas eleições presidenciais do Irã no ano passado.

Pitts disse que "The Hunter" tinha a intenção de levantar questões mais do que ser uma afirmação política.

O filme conta a história de um homem cuja esposa é morta em uma troca de tiros entre a polícia e manifestantes em Teerã. Levado ao desespero pela angústia e desejo de vingança, ele enlouquece e atira em dois policiais com sua arma de caça.

Policiais o perseguem na floresta e o prendem mas se perdem e a situação se torna mais agressiva e violenta. Aos poucos, se torna difícil distinguir entre os caçadores e os caçados, os bons e os maus.

Pitts disse que queria mostrar como pessoas que são empurradas até o limite podem se tornar bombas em contagem regressiva. Ele descreveu a juventude iraniana como "uma geração preparada para morrer pois não tem nada a perder".

Essa geração é o foco do documentário "Red, White & the Green" de Davoodi, filmado com uma câmera de mão durante as três semanas que antecederam as eleições de junho.

Um dos aspectos mais marcantes do filme, em que iranianos comuns discutem suas esperanças e medos para as eleições e o país em geral, é a grande sensação de otimismo compartilhada pelas pessoas nas ruas de Teerã.

Nas semanas que seguiram as eleições presidenciais, confrontos violentos surgiram, e segundo opositores do presidente reeleito Mahmoud Ahmadinejad, cerca de 70 pessoas morreram e milhares foram detidos.

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"Shahada": Drama Mulçumano ambientado em Berlim

O ator Jeremias Acheampong, a atriz Maryam Zaree, o diretor Burhan Qurbani e o ator Carlo Ljubek ao apresentar o filme ''Shahada''

O cineasta alemão de origem afegã Burhan Qurbani apresentou na quarta-feira o filme "Shahada", onde conta a história de três jovens muçulmanos de Berlim que têm a fé e sua espiritualidade submetidas a um duro teste na sociedade alemã contemporânea.

Burhan Qurbani, nascido na Alemanha e filho de pais afegãos, explora em "Shahada", seu primeiro longa-metragem, as contradições e problemas de Maryam (Maryam Zaree), Ismail (Carlo Ljubek) e Sammi (Jeremias Acheampong), dentro e fora da comunidade muçulmana de Berlim.

Maryam vive como uma despreocupada jovem alemã e frequenta festas noturnas até o dia em que engravida e decide abortar. O pai dela é o imã de uma mesquita berlinense e a religião parece ter absorvido tanto de sua vida que descuidou da relação com a filha.

Ismail, de origem croata, é um policial alemão casado com uma loura germânica, com quem tem um filho. Ele tem uma vida normal até que o passado volta para atormentá-lo: há alguns anos, em um "acidente de trabalho", ele feriu uma jovem muçulmana. Quando esta é detida por um problema nos documentos, Ismail a ajuda e nasce uma história de amor que o leva a deixar a mulher.

Sammi tem origem nigeriana e trabalha na peixaria de um supermercado onde um jovem alemão se apaixona por ele. No início ele nega a homossexualidade, que segundo ele é incompatível com o Islã, mas aos poucos, após pedir os conselhos de um imã - idealmente tolerante - aceita sua opção.

"Meu filme não é um drama social, nem um documentário. Quis levar as personagens ao limite do que podiam suportar. Saber como deveriam se comportar com suas crenças. Eu sou muçulmano e sou alemão e há grande parte de minha vida no filme, minhas dúvidas, saber se sou ou não um bom muçulmano, se aqui na Berlinale devo beber água ou champanhe. Hoje beberei uma taça de champanhe", afirmou o diretor.

Os temas apresentados em "Shahada" - a religião do Alcorão, a homossexualidade e a emancipação das mulheres muçulmanas - se transformaram no tema principal do festival para os jornalistas alemães, que fizeram muitas perguntas durante a entrevista coletiva após a exibição.

"Os muçulmanos não são apenas os árabes barbudos. Cada país define o Islã. Na Alemanha não existem apenas muçulmanos turcos e árabes, também há nigerianos e bósnios. Maryam Zaree e Carlo Ljubek são croatas. Deus ama todas as cores, todos os rostos, a diversidade", declarou Qurbani.

"Ser um homossexual muçulmano é difícil em muitos países. E também é na Alemanha. Meu filme é sobre a tolerância, a possibilidade de aceitar que cada um seja feliz a sua própria maneira. O amor é geral e não pode ser restrito a uma só forma", completou.

Qurbani reconheceu apenas com a educação, informação e o diálogo crítico será possível lutar contra o obscurantismo e a radicalização de algumas correntes do islã.

"A comunidade muçulmana deve sair ela mesma do obscurantismo. Devemos nos questionar o porquê de rezarmos todo dia, este é o trabalho dos homens instruídos", disse.

A atriz Maryam Zaree reivindicou a nacionalidade alemã e a origem de sua família.

"Somos 100% alemães, mas no início éramos imigrantes. Formamos parte deste país. Apesar de nossos pais terem vindo de outros países, nós nos sentimos completamente alemães", disse.

Qurbani afirmou esperar que o filme tenha grande divulgação, sobretudo nas escolas alemãs.

"A intolerância vem da ignorância. Sabe-se pouco de nossa religião. As pessoas têm medo dos muçulmanos, principalmente pelo que leem nos meios de comunicação. No entanto, os alemães vivem cercados de muçulmanos: o taxista, o vendedor de kebab, talvez o psicólogo ou o dentista. Meu filme é contra o medo, contra os mal-entendidos", concluiu.

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Ex-presos são tema de cinco filmes

Entre segunda e quarta, três produções apresentaram tramas com ponto de partida estranhamente similar -ex-prisioneiro solitário e mal-resolvido volta ao mundo do crime recém-saído da cadeia. Áustria, Noruega e Irã exploraram o assunto, privilegiando a atuação do protagonista, quase o tempo todo em cena, e desenvolvendo as suas ações pós-cadeia -as relações, a dificuldade para conseguir trabalho, a (não) reabilitação.

Andreas Lust em cena de "The Robber", que reconta história real de criminoso austríaco

Outros dois longas, bastante elogiados no final de semana, também têm a cadeia como principal tema: o dinamarquês "Submarino" e o romeno "If I Want to Whistle, I Whistle" .São cinco filmes explorando o assunto entre os que competem pelo Urso de Ouro .

Na segunda, o primeiro a repetir a dose foi o aplaudido "The Robber" (o ladrão), que enfileirou espectadores na porta do Berlinale Palast, mas que recebeu críticas negativas da imprensa especializada.

Baseado em livro de Martin Prinz, reconta história real de criminoso austríaco viciado em roubar bancos. O protagonista, interpretado com competência por Andreas Lust, passa os últimos dias na cadeia correndo em círculos. Em liberdade, vira recordista da maratona de Viena, mas parece querer mesmo é correr da polícia.

Segundo longa do alemão Benjamin Heisenberg, o drama acompanha a trajetória do ladrão avesso a pessoas e contato físico, que, no entanto, retoma a relação com o que parece ser um antigo amor. Ela (Franziska Weisz), moça de família, terá que lidar com o dilema de denunciar ou não o amante.

Menos intenso e mais engraçado, "A Somewhat Gentle Man" ,da Noruega, cria situações absurdas para o personagem de Stellan Skarsgard. O ator, que já fez filmes tão diversos quanto "Dogville" e "Mamma Mia!", recebeu o Urso de Prata em Berlim em 1982, por "The Simple-Minded Murderer".

O homem gentil dirigido por Hans Petter Moland volta às ruas nas primeiras cenas, após 12 anos preso por matar o amante da mulher. Com jeito bobalhão e humilde, aos poucos o personagem revela suas outras faces, que oscilam entre o pai que deseja retomar a relação com o filho e o assassino em busca de vingança.

Do Irã veio o mais fraco dos exibidos na competição:"The Hunter" . O ex-prisioneiro do diretor Rafi Pitts colocou parte da plateia para dormir com suas andanças -primeiro, na volta para casa, ao reconstruir a vida; depois, ao perder a mulher em um tiroteio e vagar pela cidade em busca da filha.

Como o ladrão de bancos austríaco, o iraniano capricha nas sequências de fuga da polícia -numa delas, quase idêntica nos dois longas, um bando de guardas entra pelo mato atrás do protagonista. No caso iraniano, nada que tenha incomodado o sono do espectador.


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Prêmio da Crítica vai para filme dinamarquês "A Family"

A cineasta Pernille Fischer Christensen, antes da projeção de seu filme "A Family"

"A Family", da dinamarquesa Pernille Fischer Christensen, ganhou o Prêmio da Crítica para a mostra competitiva do 60o. Festival de Berlim, concedido pela Féderation Internationale de la Presse Cinématographique (Fipresci). O júri, formado por nove críticos de vários países, premiou também os filmes das mostras paralelas Panorama ("Parade", do diretor japonês Isao Yukisada) e Fórum ("El Vuelco de Carangrejo", do colombiano Oscar Ruíz Navia).

No ano passado, o ganhador do Prêmio da Crítica, o filme peruano "A Teta Assustada", de Claudia Llosa, também levou o Urso de Ouro, o que aumentou as especulações de que o título da diretora dinamarquesa pode ser um candidato forte ao prêmio máximo este ano. Outro indício forte de que o drama familiar pode estar entre os principais premiados está na programação dele para o fim do certame, o que aponta para uma aposta dos organizadores do festival. Resta saber se Werner Herzog e o restante dos jurados concordarão.

O ator que faz o papel de Richard, Jesper Christensen, é mais conhecido como um dos vilões dos filmes de James Bond, "Casino Royale" (2006) e "Quantum of Solace" (2008). Mas ele não fez questão de se gabar do título. "Eu passei ao todo 11 dias nos sets de filmagem dos filmes de Bond", disse ele, quando questionado sobre a importância de seus papéis nos filmes do agente secreto inglês. "Passei muito mais tempo nos set de Pernilla, o que não faz de mim um típico ator dos filmes de James Bond. Acho que temos muito mais a mostrar aqui." Com isso e sua atuação em "A Family", Jesper tem grandes chances de sair da Berlilane com o prêmio de ator.

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E o Público esperava ver mais estrelas!

As estrelas do musical "Nine" de Rob Marshall, entre elas Penélope Cruz, Nicole Kidman, Marion Cotillard e Sophia Loren se somaram à lista de estrelas esperadas com ânsia por seus admiradores berlinenses que não vieram.
Exceto pela ausência de Roman Polanski - em prisão domiciliar em seu chalé na Suíça - essa edição do Festival será lembrado pela ausência de celebridades, que frustraram a expectativa do público.

E as estrelas que vieram parecem não se importar em satisfazer à tietagem. Gerard Depardieu deixou ontem a imprensa plantada após a apresentação de "L'autre Dumas" na seção Special do Festival para desfrutar um bom restaurante italiano do bairro de Kreuzberg.

Já passaram sobre o tapete vermelho da Berdinale Renée Zellweger - como membro do júri - Ewan McGregor, Olivia Williams, Pierce Brosnan,Leonardo DiCaprio,Ben Kinsgley, Mark Ruffalo e Michelle Williams e o gostozón indiano Shah Rukh Khan, além dos protagonistas dos filmes geralmente fora de concurso: Ben Stiller com "Greenberg", Julianne Moore com "The kids are all right" e Amanda Peet com "Please give".

O sueco Stellan Skarsgard salvou a participação do cinema europeu enquanto os diretores da mexicana "Revolución" - entre eles Diego Luna, Gael García Bernal, Carlos Reygadas e Fernando Eimbcke, compareceram em massa e marcaram o dia mais latino-americano do festival, na segunda-feira passada.

Nem mesmo a atriz Hanna Schygulla e o roteirista Wolfgang Kohlhaase, duas lendas vivas do cinema alemão e agraciados com Ursos de Ouro de Honra pelo Festival de Berlim, compareceram perante a imprensa.

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"The Killer Inside Me" : Violento e polêmico

O diretor britânico Michael Winterbottom

Nem Jessica Alba, nem Kate Hudson vão aparecer no tapete vermelho que leva ao Berlinale Palast nesta sexta. As duas atrizes não puderam comparecer para a sessão de gala do último concorrente aos Ursos da mostra competitiva, "The Killer Inside Me", adaptação para o cinema do romance "O Assassino em Mim", de Jim Thompson. O ator Casey Affleck, que faz o personagem principal, o policial Lou Ford, também não compareceu. Vieram à Alemanha para promover o filme apenas o diretor inglês Michael Winterbottom e o produtor americano Andrew Eaton.

Fofocas à parte sobre a ausência dos protagonistas, "elas não vieram para Berlim porque 'The Killer Inside Me" é pequeno e não havia orçamento suficiente para bancar a vinda de Jessica, Kate e Affleck", disse o produtor.

Jessica Alba é Joyce Lakeland em ''The Killer Inside Me''

O diretor inglês foi muito questionado sobre a decisão de adaptar um livro difícil como o de Jim Thompson, e a necessidade de expor a violência de forma tão explícita e de ser ainda mais gráfico no caso das duas personagens. Sem se alterar em nenhum momento, ele respondeu a todos os questionamentos.

Sobre a oportunidade de adaptar o romance, Winterbottom disse que era uma ideia antiga, embora originalmente não achasse possível adaptá-lo por ter uma narrativa em primeira pessoa e o personagem ser muito interiorizado. "Eu havia lido o livro e fiquei com ele na cabeça, até que apareceu a oportunidade de adaptá-lo". "O que mais me interessou foi a possibilidade de transformar essa história em filme de uma forma que fosse muito próxima do que Jim Thompson havia escrito. A maior parte dos diálogos foram tirados de lá e das narrações em off também."

Com relação à violência excessiva, Winterbottom disse que faz parte do romance e tem uma função reflexiva e não de entretenimento. "Muitas vezes, é necessário mostrar a violência de forma crua e direta, especialmente no caso de uma situação chocante como a descrita na trama", explicou. O filme conta a história de um jovem xerife, na verdade um psicopata escondido atrás de um bom moço, que começa a matar para encobrir suas histórias de adultério e corrupção. "Não vejo porque seria necessário esconder isso, se a questão é mostrar que Lou Ford é fraco e inseguro. As pessoas têm que se sentir incomodadas."

Sobre a violência contra as mulheres, Winterbottom simplesmente manteve o raciocínio, acrescentando que o livro foi publicado em 1952 e a história no filme se passa no mesmo período. "Se hoje - a violência contra mulheres - ainda é um problema, você pode imaginar o que era essa história na época em que o livro foi lançado."

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Exibido no Festival, filme de Glauber Rocha recupera "cinema novo" em Berlim

Cena de ''O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro'', de Glauber Rocha

"O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro" (1969), prêmio de melhor diretor no Festival de Cannes, foi projetado no Festival dentro da seção Fórum, dedicada ao cinema experimental, por iniciativa da organização que já em 2006 exibiu a versão restaurada de "Terra em Transe". Os dois são obras do brasileiro Glauber Rocha (1939-1981), expoente do "cinema novo" brasileiro e ao qual "se entende melhor hoje em dia que em sua época", segundo sua filha Paloma.

Ela, que trabalha para preservar e divulgar a obra de seu pai, disse que a influência do cineasta continua presente em parte do cinema brasileiro, embora outros produtores "se desvinculem totalmente dele".

Paloma também destacou que seu pai influenciou cineastas contemporâneos como Martin Scorsese e os espanhóis Pedro Almodóvar e Carlos Saura, declarados admiradores de Glauber. "Meu pai tinha um cinema muito próprio e particular, difícil de imitar, mas sua influência se estendeu a âmbitos artísticos muito atuais", ressaltou.

Ela agora trabalha na recuperação de filmes do cineasta, que rodaram basicamente na Europa, mas que não chegaram às salas de cinema no Brasil, e as novas edições de seus trabalhos vêm acompanhadas de entrevistas com o próprio diretor que "explica didaticamente sua visão à hora de criar cada filme".

Paloma sustenta que o mito de "louco" de Glauber Rocha não veio unicamente de sua personalidade "delirante em algumas ocasiões", mas da manipulação política que quis desacreditar determinados artistas durante a ditadura brasileira (1964-1985).

Para ela, os valores dos filmes de seu pai refletem "as ânsias de liberdade da América Latina" assim como "a inquietação, o desejo de mudança e o "questionamiento" próprio da juventude.

Ao longo de sua vida, Glauber Rocha completou 10 longas-metragens e deixou outras 234 obras - entre ensaios, fotografias, poemas e roteiros de filmes, o que demonstra, segundo sua filha, que foi um "vulcão em constante erupção criativa".

Só posso desejar à Paloma toda a sorte nesse resgate da obra magnífica de Glauber!

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Depardieu e Winterbottom fecham a luta pelos Ursos

Um extraordinário Gérard Depardieu, transformado em "Mammuth", e um inquietante Michael Winterbottom, que apresenta um xerife que esconde um lado assassino psicótico, em "The Killer inside me" fecharam hoje a seção de concurso do Festival de Berlim.

A aposta de Winterbottom em seu quarto filme na competição em Berlim ("O Beijo da Borboleta", em 1995, "Neste mundo", Ouro em 2003, e "O Caminho para Guantamano", prata ao melhor diretor em 2006) foi o cinema negro, sobre um romance de Jim Thompson e com um atrativo desfile de atores - Casey Affleck, Kate Hudson e Jessica Alba.

"Os livros de Jim Thompson vão além da mera violência e o entretenimento. A busca é pela origem, pelo desenvolvimento e pelo processo de destruição interna", explicou Winterbottom, que chegou a Berlim sem nenhum de seus atores e se viu confrontado com a questão do uso - e para alguns, abuso - da violência contra a mulher.

Affleck é um sádico, um policial texano que agride e mata as suas namoradas, mas por trás de tudo isso está "uma infância destruída", explicou.

Há um detonante, "a pegada da violência e a sexualidade transtornada", a paterna, em sua infância, e a própria, na atualidade, e é a isso que o filme remete, detalhou.

Por que concentrar-se agora, após obras de alto calibre político como os que deram Ursos na Festival de Berlim, no cinema negro, envolvido na música e no ambiente do gênero, é algo que Winterbottom não revelou .

"The Killer inside me" não pareceu ser o candidato mais forte e a recepção foi fria, a julgar pelos discretos aplausos em alternância com algumas vaias.

Depardieu destacou o seu "Mammuth", apelido que serve no filme dirigido por Benoit Delépine tanto ao personagem que interpreta quanto a moto que dirige, após anos esquecida na garagem, para começar um curioso "road movie" de um açougueiro aposentado em busca de seu histórico de trabalho.

Os primeiros 15 ou 20 minutos colocam o espectador diante de um monte de brincadeiras cômicas, com um Depardieu mais gordo que quando interpretou o francês Obelix e com uma aparência semelhante a Mickey Rourke em "O lutador".

No restante do filme, ele adota perfis mais melancólicos, poéticos e filosóficos, com um Depardieu mais e mais imerso no interpretativo.

Winterbottom e Depardieu concorrem com o filme dinamarquês "Em Familie" , o terceiro a ser exibido no último dia de competição, dirigido por Pernille Fischer Christensen, e centrado, como seu título indica, na vida familiar, conforme explicou seu diretor, Dieter Kosslick.

É um filme que causa agonia, no sentido estrito da palavra, porque aborda exatamente isso: a agonia de um pai de família, doente de câncer, que deseja que pelo menos algo sobreviva: a sua padaria, orgulho de uma dinastia de artesãos que, teme o fechamento com a sua morte.

O que começa como filme sobre uma formosa família onde todos se querem bem, na medida em que o pai fica doente em fase terminal desperta um triste conflito.

"Em Familie" encerrou a exibição dos 20 filmes concorrentes. No sábado, o júri presidido por Werner Herzog deverá distribuir as honras.

Sem um favorito, a revista da Festival - "Screen" - dava a máxima pontuação, até ontem, ao russo "Kak já provel etim letom" de Alexei Popogrebsky, seguido pelo turco "Bal", de Semil Kaplanoglu.

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Críticos apostam em filmes romeno, russo e Polanski

Em sintonia com o clima de um festival em que filmes feitos com orçamentos reduzidos concorrem lado a lado com grandes títulos de Hollywood, três filmes pequenos do leste europeu e o filme de Roman Polanski estão entre os favoritos para receber o urso de ouro.

Kim Cattrall e Ewan Mcgregor, em cena de "The Ghost Writer", dirigido por Roman Polanski

O evento de gala vai encerrar o festival de dez dias de duração. Leonardo DiCaprio, Renee Zellweger, Martin Scorsese e Ben Stiller já percorreram o tapete vermelho, enquanto o Mercado Europeu de Cinema, realizado simultaneamente, tem sido marcado por negócios em alta.

É complicado tentar saber qual será o vencedor entre os 20 filmes da competição principal. Os últimos anos foram marcados por várias surpresas, e a disputa de 2010 parece indecisa. Mas os críticos preveem que a cerimônia de encerramento tenha um viés nitidamente europeu oriental.

O diretor polonês-francês Roman Polanski, já ganhou um Urso de Ouro - em 1966, por "Armadilha do Destino" - e hoje, 44 anos depois, tem boas chances de repetir a dose com seu thriller político.

Um pouco à frente dele na sondagem informal feita pela Screen International com críticos de cinema estão dois filmes: "How I Ended This Summer", do russo Alexei Popogrebsky, e "If I Want to Whistle, I Whistle", do cineasta romeno Florin Serban.

Uma vitória de Serban levaria adiante o sucesso notável que a "nova onda" do cinema romeno vem tendo nos últimos anos no circuito de festivais europeus. O filme é um drama duro sobre a tentativa desesperada de um jovem de escapar da prisão e proteger seu irmão.

Popogrebsky arrancou aplausos de alguns críticos com seu drama psicológico, ambientado em uma estação meteorológica isolada no Círculo Ártico russo. Sergei tolera o mais jovem Pavel, que não leva seu trabalho tão a sério quando deveria.

Quando Pavel recebe uma mensagem de rádio sobre um acidente envolvendo a família de Sergei, ele não ousa transmiti-la a este, mas, quando seu chefe descobre, ocorre um confronto perigoso entre eles.

Completam os filmes do Leste Europeu bem vistos "On the Path", da diretora bósnia Jasmila Zbanic, que recebeu o Urso de Ouro em 2006 por seu primeiro longa-metragem, "Em Segredo".

"On the Path" analisa como pode se dar a convivência entre pessoas que vivem em uma sociedade multicultural ocidentalizada e outras que vivem dentro de uma interpretação rígida do islã.

O filme é essencialmente uma história de amor entre Luna e Amar, ambos muçulmanos de nascimento, mas que se distanciam quando Amar entra para um grupo de ultraconservadores da seita islâmica wahabita.

Amar abandona o álcool e o cigarro, se recusa a fazer sexo antes do casamento e sugere que a incapacidade do casal de conceber um filho possa ser o castigo de Deus por seu modo de vida pecaminoso.

Outros filmes da competição que receberam críticas positivas incluem a produção chinesa "Apart Together", o drama familiar intransigente "Submarino", da Dinamarca", "Honey", do diretor turco Semih Kaplanogu, e o implacavelmente deprimente "Caterpillar", filme japonês antiguerra.

Faltam ainda ser exibidos três filmes da competição principal: o drama dinamarquês "A Family", o ultraviolento "The Killer Inside Me", do diretor britânico Michael Winterbottom, e "Mammuth", com o veterano ator francês Gerard Depardieu.

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"Jud Suss": subida e descida de um ator durante o nazismo

"Jud Suss, auge e queda", do diretor alemão Oskar Roehler - que conta a vida do ator Ferdinand Marian, quem, em 1939, foi protagonista de uma fita de propaganda nazista, promovida por Joseph Goebbels - foi o destaque da quinta-feira,onde disputa o Urso de Ouro.

O filme mostra como vive a elite nazista e, em especial, a relação de Goebbels - ministro de propaganda de Adolf Hitler - com os artistas e o mundo do cinema em Berlim, durante a Segunda Guerra, e reconstruindo a execução do filme antissemita estrelado em 1940 no primeiro Festival de cinema de Veneza.

Durante o nazismo, o ator Ferdinand Marian (Tobias Moretti) era um dos melhores de sua geração. Era casado com uma bela judia, Anna (Martina Gedeck). Enquanto a filha do casal aprendia cantos e poemas nazistas na escola, eles escondiam um velho ator judeu em sua casa.

Segundo o roteirista Klaus Richter, que escreveu o argumento há oito anos, baseando-se em fatos históricos , Hitler ordenou a Goebbels que se encarregasse de fazer uma fita de conteúdo nacional-socialista para desprestigiar os judeus; mas deveria fazê-lo com sutileza, para que não fosse percebido como "propaganda barata".

Goebbels escolheu o ator Ferdinand Marian - que, primeiro, se negou - para o papel de Joseph Suss Oppenheimer, conhecido como "Jud Suss", famoso por ter conseguido aumentar com impostos impopulares os recursos financeiros do ducado de Wurttemberg no século XVIII, tendo sido depois enforcado por acusação de alta traição.

A vida de Oppenheimer inspirou um romance em 1827, adaptado pelo cineasta Veit Harlan em 1940. Seu filme foi amplamente divulgado em toda a Europa, recebendo elogios, na época, de um jovem crítico de cinema italiano chamado Michelangelo Antonioni.

O cineasta Oscar Roehler disse que escolheu fazer o filme com a tentativa de reconstruir o mundo do cinema alemão da época, cheio de autossatisfação e arrivismo.

"Foi depois da Noite de Cristais (1938, contra os judeus na Alemanha e Áustria). Já se sabia o que estava acontecendo, a perseguição aos judeus. Hitler reprovou a Goebbels não haver filmes nacional-socialistas que exaltassem a glória da Alemanha", declarou Roehler.

Moritz Bleibtreu, o ator que interpreta Goebbels, disse que "Jud Suss" permite aos alemães "atrever-se a olhar de outra forma a própria história, para distanciar-se dela sem esquecê-la".

Roehler disse que sua versão do filme antissemita de 1940 pretendia mostrar "o drama de um ser humano, o ator Ferdinand Marian, sua contradição, sua ingenuidade ao pensar que poderia trabalhar artisticamente num filme de propaganda antissemita sem causar dano aos judeus".
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Diretoras americanas falam sobre cinema independente e Oscar


As diretoras Nicole Holofcener e Lisa Cholodenko


Com tantos filmes americanos independentes na mostra competitiva , tanto em competição quanto fora da concorrência aos Ursos, é natural que o assunto Oscar apareça. Nas entrevistas que deram aos jornalistas estrangeiros, Nicole Holofcener ("Please Give") e Lisa Cholodenko ("The Kids Are All Right") foram questionadas sobre a premiação e o que os resultados podem significar para os indies como elas. E ambas demonstraram grande decepção com os possíveis cenários. Ambas foram lançadas pelo Festival de Sundance e tiveram seus filmes exibidos lá em janeiro.

Holofcener lamentou certas idiossincrasias do cinema americano, como por exemplo a dificuldade de conseguir financiamento sem a escalação de "caras conhecidas" no elenco. A diretora novaiorquina foi além ao dizer que, apesar disso tudo, não consegue entender como alguns "independentes" que se adequam a essas exigências conseguem indicação ao Oscar de melhor filme. "E podem até ganhar!", completou. Mas evitou causar polêmica quando quastionada se o tal filme era em 3D ou 2D. "Não vi 'Avatar', mas quero muito assistir quando voltar para casa."

Cholodenko partiu do mesmo pensamento que a americana, mas sob um ponto de vista diferente. A diretora, que vive com uma parceira em Los Angeles, disse ter tido muita dificuldade de conseguir financiamento para "The Kids Are All Right" e acabou partindo para uma espécie de "guerrilha" à moda americana, reunindo colaboradores e conseguindo dinheiro com amigos que trabalham na indústria. "O bonito é que quando chegamos aqui, todos os financiadores ficam interessados", disse ela. "Mas aí é muito tarde."

Mais otimista, Cholodenko disse que, com a ascenção de mulheres a posições mais estratégicas nos estúdios americanos, e o sucesso de diretoras como Kathryn Bigelow, é possível que o cenário melhore. "Se ela ganhar o Oscar de melhor filme certamente haverá uma boa repercussão nesse sentido", disse ela. E se James Cameron ganhar com Avatar, ela estaria disposta a encarar um filme de grande orçamento para ser lançado em 3D? "Não, acho que não", respondeu ela. "Eu gosto mais desse tipo de cinema mais narrativo, que dizem muito sobre quem sou e de onde venho."

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Na próxima postagem, os resultados do 60o. Festival de Berlim! Quem vai levar os Ursos?

Aguarde!

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Essa postagem teve textos de base, entrevistas e fotos fornecidos por:

* UOL

* EFE

* Site Oficial do Festival

* Getty Images

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