sexta-feira, 8 de junho de 2012

'KABOOM': MIX CAPRICHADO DE COMÉDIA, SEXO, DESCOBERTAS E FICÇÃO CIENTÍFICA



Famoso no circuito alternativo do cinema - especialmente entre o público LGBT - o diretor Gregg Araki traz ao Brasil, a partir de hoje, seu novo longa, "Kaboom", que retrata a rotina de Smith - Thomas Dekker -, um universitário que passa mal sempre que vê seu companheiro de quarto - um surfista chamado Thor, lindão mas meio bobão e que está sempre pelado - mas que, mesmo assim, não se prende a rótulos sexuais e transa sistematicamente com London - Chris Zylka -uma garota atirada que adora levar gays para a cama.

Durante uma das inúmeras festas de sua faculdade, Smith come uns biscoitos alucinógenos e passa a acreditar que presenciou um assassinato cometido por uma seita misteriosa que tem como objetivo acabar com a humanidade.

A partir daí, a trama fica cada vez mais "alucinante", com flashes de delírio, outros de realidade, o que leva o espectador a nunca saber exatamente se a viagem de ácido de Smith nunca terminou ou se o que está acontecendo é realmente o prenúncio do fim dos tempos.

Aplaudido de pé em no último Festival de Cannes, o filme tem como premissa principal retratar a nova geração de jovens disposta a experimentar todas as possibilidades que o pansexualismo e as drogas lhes oferecem, mas a grande sacada é mesmo a ideia do Apocalipse e porque esse é um sentimento tão presente no ano de 2012 - seja na música, no cinema ou no comportamento da humanidade.

O diretor conversou por e-mail com o UOL – Cinema e falou um pouco sobre o que significa exatamente a sua nova história e também sobre como, em sua visão, os homofóbicos desaparecerão em breve.

Reuters
O diretor Gregg Araki no último Festival de Cannes, onde seu novo longa, "Kaboom", foi aplaudido de pé
Leia a entrevista:

UOL – Em sua opinião, “Kaboom” é sobre o fim do mundo ou sobre o nascimento de uma nova geração?
Gregg Araki – Eu adoro o fato de “Kaboom” ter um final apocalíptico, porque, de alguma forma, há um senso de humor e otimismo em tudo isso. Eu não quero destacar tanto assim o final, mas quando a última imagem foi ao ar no lançamento do filme em Cannes, todo o público se levantou e aplaudiu. Foi um momento único na minha vida, porque era exatamente o meu sentimento sobre o final. Há um tipo de celebração punk rock nisso tudo.

Seus personagens são muito liberais em relação a sexo, drogas e moralidade. Por que o senhor escolhe esse tipo de composição para os protagonistas? Você acha que eles são o futuro da civilização?
“Kaboom” é também sobre os momentos de transição de sua vida. Você ainda está crescendo, aprendendo, tornando-se aquela pessoa que você será um dia. É sobre sexo, amor, experiência, dor, alegria, diversão, coração partido, todas aquelas noites loucas que você viveu quando era jovem e que, no futuro, você pensa: ‘Uau! Como eu sobrevivi àquilo?’ A vida nunca mais será essa que o filme retrata para aqueles personagens, que consequentemente ficarão velhos, se casarão, escalarão o Everest, se tornarão viciados em drogas ou serão eleitos à presidência da República.

Como o senhor acha que o mundo acabará?
Eu espero que o mundo não acabe, porque ainda há muito a se viver, muita beleza e muitas experiências a apreciar.

Recentemente, o presidente Obama afirmou seu apoio ao casamento gay nos EUA, mas alguns setores religiosos, inclusive entre pastores negros, criticaram sua decisão e ameaçaram fazer campanha contra sua reeleição. O que o senhor pensa disso?
Eu não classifico as pessoas entre negros, broncos, gays ou heteros. Há homofóbicos brancos e há homofóbicos negros. Qualquer que seja sua cor, os homofóbicos são apenas pessoas preconceituosas agindo por medo e ignorância e não têm lugar em uma sociedade civilizada. Felizmente, seu tempo está passando conforme o mundo se torna mais livre, aberto e igualitário a cada ano.

Tomara, Mr.Araki, tomara!

*****
CRÍTICA

Os filmes do diretor americano Gregg Araki não giram só em torno da homossexualidade, já que o mais correto seja dizer que eles giram em torno da sexualidade – e o LGBT esteja inserido de forma mais que democrática nos seus filmes.

Nos seus filmes, o enfoque central, é, na realidade, a relação do homem com esse universo – e não uma exploração pornográfica feita de qualquer forma e sem o menor pudor e os filmes de Araki possuem uma aura quase existencialista, de reflexão e de mistério – como em "Nowhere", "Mistérios da Carne" e, por fim, "Kaboom", que estreia hoje no Brasil depois de ter sido aplaudido de pé quando da sua pré estreia mundial no último Festival de Cannes.

O longa mostra a experiência,a explosão da sexualidade na juventude numa trama de mistério que assume traços oníricos e onde o tom de fantasia é próximo às obras de David Lynch - e se Linch opta sempre por um viés mais nebuloso, Araki brinca com as cores, o exagero e a diversão.

Na trama, conhecemos Smith - Thomas Dekker, de "A Hora do Pesadelo" -, um estudante de Cinema que, confuso quanto a sua sexualidade - tem relações tanto com homens quanto com mulheres - começa a ter, todas as noites, um mesmo sonho estranho com duas pessoas desconhecidas, uma porta e uma lata de lixo.

Imagens: Divulgação - Vinny Filmes
O ator Thomas Dekker é Smith, protagonista de "Kaboom"
As coisas começam a ficar mais esquisitas quando ele encontra as pessoas do seu sonho, passa a receber correspondências sem sentido, sua melhor amiga Stella - Haley Bennett, de "Marley & Eu" - começa a ter problemas com uma garota “bruxa” e homens com máscaras de animais começam a aparecer pelo campus da universidade onde vive e estuda.

Em 80 minutos, vemos Smith atravessar o filme numa série de situações inusitadas e incoerentes, numa complexa história cheia de reviravoltas com uma interessante, bem executada e dinâmica montagem.

Cena de "Kaboom"
A direção de câmera também é muito boa, com planos que buscam focalizar os sentidos, ao lado da fotografia que explora ao máximo as cores, também um retrato do universo LGBT.

Apesar de situar-se num plano de fantasia, o longa não exagera no absurdo, não há magias sendo atiradas de um lado para o outro, mas há espasmos provocados por um vodu, por exemplo.

Os personagens, caricatos, também são reais – apesar de reconhecermos figuras comuns na cultura contemporânea dentro de cada personagem, a relação que cada um deles tem com o meio é construída a ponto de não cair na previsibilidade.

Se a sequência de atos é absurda, é por que o diretor percebe que tem o direito de modular a trama para transmitir as mensagens que quer, e isso é simples de ser notado em formas muito bem inserida no longa.

Cena de "Kaboom"
Por exemplo, quando o protagonista Smith, estudante de Cinema, é mostrado na sala de aula, o filme que ele assiste é "Um Cão Andaluz" (1928), de Luis Buñuel,  expressão máxima de um  Cinema que não  se preocupava com a montagem auto-explicativa e se dedicava puramente à experimentação das sensações.

Além disso, o filme de 1929 é um reflexo das influências de Smith na construção de sua própria história, o surreal e, a elaboração desse cenário, além do diretor, temos novamente o reforço da fotografia, que apropria a iluminação para sequências que enfatizam o psicodélico, a direção de arte, que faz uma fiel construção dos elementos recorrentes ao pesadelo, e a trilha sonora, regada ao rock shoegaze das bandas Airiel e Helen Stellar, cujo som ambienta o espectador num plano de sonho e devaneio.

Outra cena de "Kaboom"
Ao contrário da sua obra anterior - "Mistérios da Carne" - que também apresentava elementos surreais e de mistério, mas com um tom dramático, em "Kaboom", Araki entrega basicamente uma comédia que combina cenas de sexo e de reflexão, levando o espectador à diversão com os personagens e com as situações inusitadas.

Um filme que, apesar de pesado em muitas cenas, é genial de ser assistido, experimentado e sentido.

Confira o trailer do filme:
*****
"KABOOM"
Título Original:
Kaboom
Diretor:
Gregg Araki
Elenco:
Thomas Dekker, Haley Bennett, Chris Zylka, Roxane Mesquida, Juno Temple, Nicole LaLiberte, Jason Olive, James Duval , Kelly Lynch, Carlo Mendez
Produção:
Pascal Caucheteux, Gregg Araki, Andrea Sperling
Roteiro:
Gregg Araki
Fotografia:
Sandra Valde-Hansen
Trilha Sonora:
Robin Guthrie, Vivek Maddala, Mark Peters, Ulrich Schnauss
Duração:
86 min.
Ano:
2010
País:
EUA/ França
Gênero:
Comédia
Cor:
Colorido
Distribuidora:
Vinny Filmes
Estúdio:
Why Not Productions / Desperate Pictures / Wild Bunch / Super Crispy Entertainment / Next World, The
Classificação:
16 anos
Cotação do Klau:

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