quinta-feira, 7 de junho de 2012

ELIZABETH II COMEMORA 60 ANOS DE REINADO RECUPERANDO A POMPA E ADORADA POR SEUS SÚDITOS




Esqueça a menina fofa, meiga e amorosa interpretada por Freya Wilson no oscarizado longa "O Discurso do Rei" (2010).

Se um dia foi assim, meiga e fofa, Elizabeth Alexandra Mary, londrina nascida em 21 de Abril de 1926, se aproxima atualmente muito mais da soberba caracterização que Dame Helen Mirren fez dela em "A Rainha" (2006).

Dame Mirren foi aplaudida de pé por longos cinco minutos ao final da sessão de estreia do longa no Festival de Veneza daquele ano e, no ano seguinte, levou os principais prêmios de interpretação mundo afora - inclusive o Oscar, Globo de Ouro e o Bafta.

Em "A Rainha", Elizabeth Alexandra Mary, que conhecemos como a Chefe de Estado Elizabeth II - Rainha do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, Antígua e Barbuda, Austrália, Bahamas, Barbados, Belize, Canadá, Granada, Jamaica, Nova Zelândia, Papua-Nova Guiné, São Cristóvão e Névis, Santa Lúcia, São Vicente e Granadinas, Ilhas Salomão e Tuvalu - foi mostrada ao mundo como uma mulher fria, calculista, que não consegue entender a catarse emocional do povo à morte de sua nora, a princesa Diana, permanecendo isolada com toda a família real no Castelo de Balmoral, na Escócia, para finalmente ser convencida pelo chefe de governo de então, o primeiro-ministro Tony Blair que, recém empossado, percebe que precisa tomar medidas práticas e urgentes que reaproximem a família real da população, procurando-a para uma conversa muito espinhosa.

Divulgação
Michael Sheen, como Tony Blair, e Dame Helen Mirren, como Elizabeth II, em cena de "A Rainha"
Só assim, depois da difícil conversa com Blair, Elizabeth II se dispôs finalmente a aceitar o luto nacional pela morte de Diana e o serviço fúnebre monumental que se seguiu - onde a sua imagem, à porta do Palácio de Buckingham, reverenciando o caixão da nora desafeta que então passava, é uma das mais impactantes do final do século passado.

Reuters
Elizabeth II à porta do palácio, assistindo ao cortejo fúnebre de Diana
Quem a conhece, sabe que o filme a retratou fielmente: a rainha é uma mulher geniosa, de temperamento forte, que comanda com mão de ferro toda a corte britânica - filhos, noras e netos principalmente - e que nunca conseguiu engolir a separação do primogênito e sucessor do trono, Charles, com Diana e suas espetaculosas entrevistas à mídia, onde, via de regra, os súditos acompanhavam a lavação de chifres sujos do casal.

Mas, ao mesmo tempo, a rainha é venerada pelos seus súditos, e mesmo com idade já avançada, cumpre religiosa e pontualmente todas as funções inerentes ao cargo, que se não tem muito poder, tem prestígio e penetração suficientes para que ela seja, ainda hoje, uma das mulheres mais influentes - e ricas - do mundo.

Ao contrário do que muita gente pensa, a corte britânica dá, sim, um grande lucro aos cofres do reino, já que todas as suas propriedades são abertas à visitação pública à custa da cobrança de generosos ingressos e os anunciantes fazem fila para patrocinarem eventos em que um membro da família real estará.

AFP 
Foto oficial do primeiro ano do reinado - 1953
É sabido que até as rações balanceadas que os cavalos reais comem são patrocinadas faz tempo, bem como a maioria dos serviços nas propriedades da família real.

Assim, tudo o que é arrecadado volta para o tesouro, o que só prova que a família real é uma grande fonte de renda para os britânicos.

Essa mulher incrível celebrou em 2 de junho seu Jubileu de Diamante, que marcou suas seis décadas no poder com uma série eclética de eventos que foram até o dia 5 - um feriadão por lá.

AFP
Elizabeth 2ª chega à estação de trem King's Cross, em Londres, com seus quatro cachorros da raça Corgi, após as férias no Castelo de Balmoral, na Escócia, em 15 de outubro de 1969
A rainha iniciou a programação do chamado "fim de semana central" - os eventos em torno do jubileu seguem até o final do ano - com o tradicional Derby de Epsom, que é algo que ela faz com enorme prazer -  Elizabeth II, que completou 86 anos em 21 de abril, participa desde criança da tradicionalíssima competição de cavalos em Surrey.

O domingo, muito chuvoso, foi marcado por um desfile de mais de mil embarcações pelo Tâmisa, liderados pela nau da rainha no tradicional "barge pageant", que singra o rio em ocasiões especiais há séculos carregando reis e outros dignitários.
Nas margens, um mar de súditos, apesar da chuva forte, não arredou pé para saudar sua soberana.

AFP
Elizabeth 2ª e a Rainha Mãe, atrás, entram na Abadia de Westminster em 6 de setembro de 1997 para acompanhar a cerimônia fúnebre de Lady Di
Na segunda, a BBC promoveu um show para a família real e 10 mil convidados previamente sorteados nos jardins do Palácio de Buckingham, no centro de Londres, onde a rainha mora desde que se casou, 20 de novembro de 1947, com Phillip, que não compareceu por estar internado em decorrência de uma infecção urinária - mas ela já está OK.

AFP
Elizabeth e Phillip, no dia do seu casamento - 2 de junho de 1953

Elizabeth II e a família real puderam ver de pertinho astros britânicos como Shirley Bassey, Paul McCartney, Stevie Wonder, Tom Jones e Elton John - a título de curiosidade, todos acima dos 60.
Depois, seu filho mais velho, Charles, chamou-a ao palco para puxar um bem-humorado "hip-hip-hurra!"

Por fim, na terça, a rainha participou de uma missa na catedral de St. Paul para depois seguir em carruagem do Palácio de Westminster até o de Buckingham, onde, ao lado da família, saudou os súditos, da sacada, enquanto aviões da Royal Air Force cruzaram os céus e a Guarda Real promovia uma salva de tiros.

AFP
Elizabeth, com Phillip e os filhos Charles e Anne, em foto dos anos 50
Ver um evento "very english" como o desfile da família real em carruagens cerimoniais pelas ruas de Londres é raro mesmo para os locais - e outro mar de gente tomou as ruas de Londres, desta vez, sem chuva.

Reuters

A rainha e a nora Camila, no desfile de carruagem, na última terça

Menos difícil será aproveitar os eventos paralelos à programação real, como a nova exposição de joias no Palácio de Buckingham, a reabertura da exposição das joias da Coroa - após reformulação, na Torre de Londres - e as novas exposições do Palácio de Kensington - onde Diana morou e onde seus filhos e nora voltaram recentemente a morar.


AFP
Elizabeth 2ª recebe o então presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, no Palácio de Buckingham, em Londres, em 5 de novembro de 2009.
De minha parte, eu também tive minha experiência pessoal com a rainha: em 7 de novembro de 1968, eu tinha oito anos e estava saindo com minha mãe de um prédio de consultórios médicos na avenida Paulista, que já estava uma muvuca só pois, instantes depois, Elizabeth II chegava num Rolls-Royce Phantom conversível, como convidada de honra para a inauguração do lindo prédio de Lina Bo Bardi do MASP.

A rainha vestia um casaco verde, chapéu e sapatos amarelos e uma bolsa azul clarinha, numa bonita e ousada homenagem à nossa bandeira.
Depois, tirou o casaco, e o vestido também era amarelo.

Arquivos do Klau
Elizabeth II na inauguração do Masp na Av.Paulista, SP
Elizabeth II sobreviveu a pelo menos quatro estilistas em 60 anos de reinado, e é dona de um estilo inimitável, em que predominam cores vivas e chapéus, sem esquecer as bolsas de mão.

"Ela tem um estilo próprio que lhe cai muito bem", comenta o estilista francês Alexandre Vauthier, pupilo por 10 anos de Jean Paul Gaultier. 
"É, realmente, seu DNA. É a única pessoa no mundo que se veste assim, o que faz com que ela seja imediatamente reconhecida."

AFP
Elizabeth 2ª segura a mão de seu marido, Príncipe Philip, ao chegar para um discurso na Casa dos Lordes, em Westminster, Londres, em 25 de maio de 2010
Vauthier torce para que não haja mudanças, assinalando que o estilo próprio da rainha "inspira respeito".

"Elizabeth domina as ondas!", foi uma das manchetes na esfuziante cobertura midiática do jubileu da rainha britânica.

Os jornais mostraram multidões desafiando a chuva para ver o espetacular desfile fluvial de domingo no rio Tâmisa, e apresentaram as atrações para o show em frente ao Palácio de Buckingham. 

AP
Tower Bridge, em Londres, ganha iluminação especial em homenagem ao Jubileu de Diamante da rainha Elizabeth 2ª e aos Jogos Olímpicos de 2012 
"Peça ao mundo que cite três coisas que resumam a Grã-Bretanha, e você terá três respostas: pompa, chuva e a rainha", disse o Daily Mail, evocando três elementos que dominaram o fim de semana.

As festividades, apesar do mau tempo, foram uma dádiva não só para a família real, mas também para uma população assolada pela recessão, por escândalos políticos, pelo desemprego e por cortes previdenciários.

Reuters
A rainha circula entre os convidados do show pop em sua homenagem no Palácio de Buckingham, no centro de Londres
Organizadores disseram que no domingo 1,2 milhão de pessoas se postaram às margens do Tamisa para ver mais de mil barcos escoltarem a rainha na embarcação dourada.

De norte a sul do país, milhões de outras pessoas participaram de festas populares em ruas enfeitadas com a bandeira nacional, embora a chuva tenha feito muita gente ficar em casa.

O desfile fluvial de domingo foi visto na TV por 10,3 milhões de pessoas, ou 60 por cento da audiência televisiva, segundo a BBC.

Após acenar para uma multidão eufórica, encerrando os quatro dias das espetaculares celebrações do jubileu de diamante do seu reinado, a rainha ainda apareceu num raro pronunciamento televisivo à nação.

"Tocou-me profundamente ver muitos milhares de famílias, vizinhos e amigos celebrando juntos numa atmosfera tão feliz", disse a rainha.
"Continuarei entesourando e tirando inspiração das incontáveis gentilezas demonstradas a mim neste país e em toda a Commonwealth. Obrigada a todos", disse ela, diante de uma foto emoldurada do seu neto William e da mulher dele, Kate.

"Não acho que irei ver nada assim de novo na minha geração. Foi maravilhoso", disse o fotógrafo Joseph Afrane, 49, que vestia chapéu e colete com as cores da bandeira britânica.

Pela manhã, a rainha parecia ligeiramente desanimada ao entrar sem o marido - que estava hospitalizado - num culto de ação de graças na catedral de São Paulo. 

Ela usava um vestido de tule verde menta com florezinhas bordadas e um fio de prata, e foi recebida aos gritos de "Deus salve a rainha". 

Reuters 
A rainha acena aos súditos ao sair do culto na última terça
O fim de semana prolongado do jubileu foi visto por analistas como um sucesso para a monarquia, para sua assessoria de mídia e para a própria Elizabeth, que é vista como um símbolo de empenho, estabilidade e união nacional.

As pesquisas indicam que a rainha e o sistema monárquico há décadas não eram tão populares, e uma delas sugere que a monarca está mais em sintonia com seu povo do que o atual primeiro-ministro David Cameron e seus ministros.

A popularidade da monarquia está amparada principalmente na sua geração mais jovem, pois Harry, William e Kate se tornaram os queridinhos da imprensa local, depois de uma fase de hostilidade, na década de 1990, devido aos sucessivos escândalos conjugais, culminando com a morte em 1997 da popularíssima princesa Diana, ex-mulher de Charles, o que  causou um grave dano à monarquia, já que muitos britânicos consideraram que sua rainha não partilhou da comoção nacional com aquele fato.

Os escândalos e casamentos desfeitos na família real também contribuíram naquela época para que a monarquia fosse vista como uma instituição ultrapassada e em risco de extinção.

Graças a essa valorosa mulher de 86 anos, porém, esse risco não mais existe.

E Charles, se um dia pensou em ser rei, pode ir tirando seus cavalos de raça da chuva: a mãe de Elizabeth, igualmente adorada pelos súditos, morreu com 103 anos e a filha esbanja uma saúde de ferro.

Vai durar mais que a mãe, com certeza.

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