sexta-feira, 23 de março de 2012

CHICO ANYSIO MORREU POR DOIS MOTIVOS: MUITO CIGARRO E OSTRACISMO NA GLOBO


Francisco Anysio de Oliveira Paula Filho nasceu no município de Maranguape, Ceará, no dia 12 de abril de 1931.

Aos oito anos, mudou-se com a família para o Rio de Janeiro, onde já começou a demonstrar seus dotes artísticos, fazendo imitações.

Com 14 anos, passou a frequentar programas de calouros em rádios cariocas e paulistas - Costumava ir ao "Programa Ary Barroso", "Hora do Padre" e "Trabuco", de Vicente Leporace.

Estudou para ingressar na Faculdade de Direito, passou, mas não cursou.

Seu primeiro contrato de trabalho foi na Rádio Guanabara, onde, depois de 15 dias, já tinha quatro profissões: ator, locutor, redator e comentarista esportivo.

Chico também chegou a fazer novelas, mas preferiu seguir a linha de shows e de comédias, ao lado de Grande Otelo, Chocolate e Luiz Tito - recentemente, fez participações em folhetins da Globo como "Caminho das Índias" (2009), "Pé na Jaca" (2007) e "Sinhá Moça" (2006).

Na carreira de humorista são mais de 200 personagens: começou na TV em 1957, fazendo o “Professor Raimundo”, na TV Rio, personagem que já tinha feito por muito tempo na Rádio Mayrink Veiga, sempre com sucesso.

Na TV Rio, sob a direção de Walter Clark, o sucesso continuou e, em 1969, o humorista foi para a TV Globo, onde se consagrou no coração dos brasileiros com programas como "Chico Anysio Show", "Chico City", "Estados Anysios de Chico City", "Chico Total" e "Escolinha do Professor Raimundo".

Em todos eles apareceram seus tipos imortais, como a "Salomé", o "Painho", o "Profeta" e tantos outros - atualmente fazia parte do elenco de "Zorra Total", onde interpretava "Bento Carneiro, o Vampiro Brasileiro" e a velhinha gaúcha "Salomé" - aquela mesma que falava com o presidente general nos oitenta e agora falava com Dilma por telefone.

Chico era ainda pintor, compositor e escritor - lançou 17 livros.

Casado seis vezes – um dos mais comentados foi com a ex-ministra da Economia do governo Collor, Zélia Cardoso de Mello - o humorista deixa oito filhos, sendo um adotivo: Lug de Paula, André Lucas, Cícero Chaves, Nizo Neto, Bruno Mazzeo, Rico Rondelli, Rodrigo e Vitória.
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O que dizer de uma vida, assim, tão maravilhosa?

Os elogios ao homem e ao trabalho de Chico Anysio foram muitos, desde ontem à tarde, quando sua morte, depois de um longo calvário hospitalar, foi anunciada.

Até José Luiz Datena foi muito feliz em trocar a bandidagem do seu "Brasil Urgente" por depoimentos emocionados e ao vivo, via telefone, de outros grandes mestres do humor ou da TV - como Renato Aragão, Ary Toledo, Carlos Alberto de Nóbrega, Boni.

"Nós, humoristas, estamos órfãos, mas muito agradecidos" 
Renato Aragão, humorista

"Gênio", "Mestre", "Professor de todos nós"... os elogios e os adjetivos foram muitos, e verdadeiros.

Chico era um desses criadores que entenderam como ninguém a alma do povo brasileiro e seus mais de 250 personagens em sessenta e tantos anos de carreira são a melhor prova disso.

"Ele me inventou.O Brasil perde o humorista, e eu perco meu amado mestre"
Cláudia Gimenez, atriz

Os que eu mais gostava eram o Popó - velhinho rabujento como meu avô materno - o Painho - bichíssima e que lançou o bordão "Eu tô morta!", que nós bichosas ( bichas idosas) usamos até hoje - o deputado "Justo Veríssimo" - síntese dessa escumalha chamada de classe política brasileira, que quer, como o personagem, "que o povo se exploda" - e o protótipo do ator "tássia" - tá se achando - "Alberto Roberto", que escondia sua profunda falta de talento por trás de seguidas crises e chiliques - o "não graávo!" virou outro bordão repetido pelo povo à exaustão.

"Trabalhei com ele 50 anos. É a maior perda do humor brasileiro. Ele era um mestre, um gênio. Basta ver, é só a ligar a TV" 
Castrinho, ator e humorista

Se hoje a televisão tem programas muito mais gravados, editados, sonorizados e bunitinhos com imagem em HD, quando Chico começou, a TV era à lenha e ele foi o primeiro a usar o recurso do video tape, não para ser inovador, mas para poder fazer seus personagens contracenarem entre si no seu programa na TV Rio - o recurso foi utilizado por ele em todos os seus programas, e ninguém conseguia dizer que era o mesmo ator contracenando consigo mesmo, Chico levou esse recurso à perfeição para melhorar sua performance enquanto ator.

"Lamento muito, ele sofreu tanto até aqui... Para mim, é um amigo de tantos anos... Trabalhamos juntos muitos e muitos anos e continuamos juntos no [canal] Viva. Diariamente mato as saudades com ele... É a vida. Também já vou fazer 93 anos, sinto muito, não tenho palavras para descrever. Que descanse em paz" 
Orlando Drummond, o Seu Peru da "Escolinha do Professor Raimundo"

Até o começo dos 90, ainda sob a batuta de Boni, a Globo dava a Chico um horário semanal à noite e também um no final de tarde, onde "A Escolinha do Professor Raimundo" - primeiro semanal, depois diária - fazia um mix interessantíssimo de humoristas veteranos - Grande Otelo, Costinha, Mário Tupinambá - com jovens talentos que Chico ia buscar onde quer que estivessem Brasil afora - Tom Cavalcante, Cláudia Gimenez, Eri Johnson...

"Ele me lapidou quando eu cheguei do Ceará. Ele era devoto de São Francisco e tinha esse lado franciscano de compartilhar, ajudar o próximo. Há uma frase de Chico que não me esqueço. Ele dizia: 'Tom, há dois tipos de humor, o que faz rir e o que não faz rir. A morte dele encerra um ciclo de humor e de dramaturgia do Brasil" 
Tom Cavalcante, humorista

Com a saída de Boni e a ascenção de Marluce Dias como toda poderosa global, Chico foi perdendo espaço, até termos o absurdo de não o termos mais no ar - fora as participações esporádicas em novelas.

"No humor existe um AC e um DC: antes de Chico e depois de Chico. Isso mostra o impacto dele no universo do humor. Sempre muito gentil, conversava e ouvia a todos. Ele era grande no que fazia e, ao mesmo tempo, muito generoso e afável com a nova geração. Uma grande perda"
Rafael Cortez, humorista

Chico Anysio tinha passado - como muitos outros humoristas brasileiros - toda a ditadura militar dando murro em ponta de faca, seus personagens eram a cara do Brasil, ele sabia fazer sátira de costumes e de política como ninguém.

Por quê, então, seus programas de humor continuavam fora do ar?
Essa é uma pergunta que a Globo ainda terá de responder aos seus muitos fãs.

"É um luto nacional. Chico é um herói nacional. Ele é um guerreiro, lutou até o último minuto. Estou com o meu coração dilacerado, de tanto que amava esse homem"
Agildo Ribeiro, humorista

Felizmente, seus livros estão aí, seus vídeos estão no YouTube e seus programas são reprisados no canal Viva - o que nos ajudará a superarmos essa saudade imensa do seu carisma e talento.

"Nunca mais vai ter Pelé e nunca mais vai ter Chico Anysio. Nenhum ator que eu conheça conseguiu fazer a quantidade de personagens do Chico" 
Ziraldo, cartunista e escritor

Quando começou seu calvário hospitalar no ano passado, Chico chegou a pedir para que os jovens não fumassem, pois o fumo o estava matando.

Perdemos o maior ator comediante do mundo. Nunca houve na história da comédia mundial quem tenha feito o que o Chico Anysio fez. Foi um grande colega, um grande amigo, uma pessoa extraordinária" 
Paulo Silvino, ator e humorista

Mais que o fumo, o ostracismo em que a maior emissora de TV deste país colocou um dos seus maiores gênios foi o que realmente o matou.

"Eu não tenho medo de morrer. Só tenho pena..." 
Chico Anysio

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