A história do filme peruano "Contracorrente" pode ser definida como um mix de "Dona Flor e Seus Dois Maridos" com "O Segredo de Brokeback Mountain" - onde o destaque é a melancolia do segundo, em vez da comédia do primeiro - e marca uma bem-sucedida estreia em longas do peruano Javier Fuentes-Léon, que também assina o roteiro.
A trama se passa num pequeno vilarejo no Peru perdido no tempo e no espaço e, não fossem algumas tecnologias atuais que vez ou outra aparecem, o espectador seria levado a crer que a história se passa há algumas décadas, já que a mentalidade local parece parada no passado remoto.
O pescador Miguel - o bunito Cristian Mercado - tem um romance com o fotógrafo e pintor Santiago - Manolo Cardona - e a relação entre os dois sempre acontece longe do vilarejo, em praias isoladas, onde podem dar vazão à paixão que os une.
Só que Miguel é casado com Mariela - Tatiana Astengo -, que está grávida, e o pescador vive um conflito muito grande: apaixonado por Santiago e também por sua mulher, ele fica dividido entre o dever e seu coração.
Enquanto isso, no vilarejo onde moram, Santiago é visto com hostilidade - ninguém fala com ele e crianças atiram ovos em suas janelas - mas seu amor por Miguel é tão grande que, mesmo morto, ele continua aparecendo para o pescador - como Vadinho para Dona Flor.
Só que aqui não estamos no romance de Jorge Amado ou no filme de Bruno Barreto - já que não há espaço para risos no inusitado da situação - e Santiago conta para Miguel que não consegue abandoná-lo, ao que seu amante também não quer.
Miguel fica assim numa situação privilegiadíssima: com Santiago morto, pode viver seu romance e manter o casamento hétero.
O diretor Fuentes-Léon dribla com criatividade as limitações orçamentárias, e o cotidiano do vilarejo incorpora os temas que o diretor pretende discutir com seu filme - como o amor entre dois homens, a descoberta e aceitação da identidade de cada um - e as pessoas com quem Miguel se relaciona no seu dia-a-dia, como sua mulher, outros pescadores, seu filho, levam a narrativa adiante.
Mas o que traz força para essa história até simples são suas personagens muito humanas, e carregadas de nuance: desde o pescador que nem sempre sabe lidar com sua bissexualidade, até o fotógrafo bem resolvido, passando pela mulher de Miguel, que fica dividida entre o amor pelo marido e o preconceito enraizado em sua educação - educação, aliás, estranha, como na cena onde Mariela dá um sorriso sem graça ao dizer para as amigas que Miguel vê a reprise da novela brasileira "Direito de Amar", e que gosta muito de Lauro Corona!
Ganhador de diversos prêmios, entre eles o de público do Festival de Sundance do ano passado, "Contracorrente" é, com sua delicadeza, um filme muito bom, pois, ao falar do amor, faz um apanhado muito verdadeiro da hipocrisia.
Confira o trailer do filme:
Título original: Contracorriente
Diretor: Javier Fuentes-León
Produção:
Elcalvo Films
Dynamo Producciones
La Cinéfacture
Neue Cameo Film
Distribuição Brasileira: Alberto Bitelli Intl. Films
Elenco: Tatiana Astengo
Manolo Cardona
José Chacaltana
Cindy Díaz
Cristian Mercado
Gênero: Drama, Fantasia
Duração: Nada cansativos 100 min.
Ano: 2009
Data da Estreia: 08/04/2011
Cor: Colorido
Classificação: Não recomendado para menores de 14 anos
Países: Peru, Colômbia, França, Alemanha
Site Oficial: http://www.contracorrientelapelicula.com/
Um comentário:
Gostei muito da sua crítica, porque você usou o termo certo: bissexualidade. Estou escrevendo uma resenha para o meu blog (http://www.analista.psc.br/blog), fiquei com a impressão de que a divisão do Miguel não foi bem explorada. Ele não entendia o que se tratava e negava. Penso que parte do público pode achar que ele era apenas um homossexual no armário ...
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