segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

FESTIVAL DE BERLIM 2015 : JAFAR PANAHI LEVA URSO DE OURO E BRASILEIRO 'QUE HORAS ELA VOLTA?' É O MELHOR PELO PÚBLICO


Com a última exibição do documentário "Cobain - Montage of Heck" às 23h deste domingo (15), a Berlinale encerrou sua 65ª edição.

Em 2015, o Festival de Berlim exibiu 400 filmes e recebeu 310 mil espectadores, dez mil a mais do que no último ano, reafirmando seu status de maior público em festivais de cinema.

A première  mundial de "Cinquenta Tons de Cinza", a volta dos diretores alemães Wim Wenders e Werner Herzog com produções de elenco hollywoodiano, a onipresença de James Franco e o Urso de Ouro para Jafar Panahi por seu "Taxi" foram os principais destaques.

Ponto alto também foi a estreia do brasileiro "Que Horas Ela Volta?", de Anna Muylaert  e estrelado por Regina Casé - favorito do público entre 60 filmes.

Nicole Kidman, Natalie Portman e Christian Bale passaram pelo tapete vermelho em uma edição mais morna em relação ao último ano, quando Lars Von Trier e Shia LaBeouf criaram polêmicas na estreia de "Ninfomaníaca - Parte 1".

Nicole Kidman no red carpet de Berlim - AFP
Os exageros do cinema americano foram levados com ironia  - prova disso foram as risadas da crítica na première mundial de "Cinquenta Tons de Cinza" de Sam Taylor Wood e na primeira cena de Robert Pattinson em "Queen of The Desert", quando o galã da saga "Crepúsculo" surgiu vestindo um pomposo turbante.

Entre as ficções brasileiras, as atenções se voltaram para a comédia "Que Horas Ela Volta?", de Anna Muylaert, e do melancólico "Ausência", de Chico Pinheiro.

O comentário geral é de que as duas produções são reflexo das mudanças políticas e sociais do país, tocando em temas como o PEC das domésticas, falhas da educação e as ausências na vida de um jovem pobre que amadurece precocemente.

Em 2014, o público escolheu "Hoje Eu Não Quero Voltar Sozinho", de Daniel Ribeiro.

Red carpet à frente do Palácio dos Festivais em Berlim, onde acontece todos os anos a Berlinale - AFP
Confira agora o que de melhor rolou nessa 65ª edição da Berlinale:

JAFAR PANAHI LEVA URSO DE OURO POR 'TÁXI' - VEJA OUTROS GANHADORES

O cineasta iraniano Jafar Panahi levou o Urso de Ouro, prêmio máximo do Festival de Berlim.

Proibido de filmar pelo governo de seu país, Panahi rodou em segredo o longa-metragem, que se passa dentro de um táxi no Irã, com o diretor interpretando o motorista e pegando passageiros diversos pelas ruas de Teerã.

Aos 54 anos, Panahi é celebrado pelos cinéfilos em todo o mundo, mas está proibido de realizar sua atividade no Irã, onde o regime considera subversiva sua visão crítica da sociedade.

Ele foi detido por causa de um documentário que estava filmando sobre os distúrbios a respeito da polêmica eleição presidencial de 2009 e foi proibido de fazer novos filmes por 20 anos "por atentado contra a segurança do Estado e ato de propaganda contra o regime".

Sobrinha de Panahi, Hanna Saeidi sobe ao palco e se emociona  ao receber em nome do tio o Urso de Ouro - prêmio máximo da Barlinale - Yahoo News
"Taxi" é o terceiro filme que Panahi dirige após a condenação.

Confira um clipe de 'Táxi':


Apesar de não ter permissão de viajar ao exterior, o iraniano foi muito aplaudido em Berlim e recebeu estímulo para seguir desafiando a proibição.

O longa também foi eleito melhor filme pela Federação Internacional de Críticos de Cinema (FIPRESCi) entre os 19 aspirantes da seção em competição do Festival de Berlim.

Em 2013, o iraniano já havia vencido o Urso de Prata pelo filme "Cortinas Fechadas".

Presidido por Darren Aronofsky - diretor de "Cisne Negro" - o júri do festival alemão premiou ainda a atriz Charlotte Rampling e o ator Tom Courtney, além do diretor Pablo Larrain, vencedor do Grande Prêmio do Júri por "The Club".

A atriz Charlotte Rampling aceita seu Urso de Prata de Melhor Atriz - Miami Herald
O prêmio de melhor roteiro foi para o documentário "The Pearl Button", de Patricio Guzman.

'A QUE HORAS ERA VOLTA' LEVA PRÊMIO DO PÚBLICO E OUTROS LONGAS BRASILEIROS TAMBÉM FORAM MUITO ELOGIADOS

Sem filmes concorrendo na competição oficial, o cinema brasileiro participou da 65ª edição da Berlinale nas Mostras Panorama, Generation e Forum - mas isso não quer dizer que a seleção tenha sido desprestigiada.

O público do festival esgotou sessões de "Que Horas Ela Volta?", de Anna Muylaert, para quem deu o prêmio de melhor filme do festival.

"Ausência", de Chico Teixeira, foi igualmente elogiado, com o público participando ativamente dos debates com o diretor no final da exibição.

Ambas as histórias mostram de alguma forma as questões sociais pelas quais o país está passando.

Estrelado por Regina Casé, "Que Horas Ela Volta" conta a história de Val, que deixa uma filha pequena no Nordeste e parte em direção a São Paulo, onde se emprega na casa de uma família e acaba sendo uma "segunda mãe" do filho do casal.

Treze anos depois, a sua filha Jessica (Camila Márdila, também premiada no festival por sua performance), vai ao encontro da mãe para prestar vestibular.

Wieland Speck, curador da Panorama, diz que viaja anualmente para o país e neste ano queria mostrar "que o Brasil não é mais aquele lugar onde os mais ricos fazem filmes sobre os mais pobres".

Para ele, a seleção "apresenta um retrato atual das mudanças no cenário brasileiro político e social brasileiro".

O comentário geral é de que o Brasil exibiu sua seleção mais interessante em 2015.

"'Que Horas Ela Volta?' prova que uma comédia por ser engraçada e ao mesmo inteligente e sutil", comentou o jornalista francês Malik Berkati.

Em artigo no espanhol "La Vanguardia", é mencionado que o filme mostra "uma sociedade em processo de mudança com amostras de uma emancipação das classes menos privilegiadas."

Veja o trailer de 'Que Horas Ela Volta?':


Em entrevista no fim da última exibição de "Ausência", a estudante alemã Ilwyn Siwsiay, 29, disse que este "é um filme muito autêntico na forma que ele transporta os sentimentos de perda e solidão. O garoto tentando ter amor de qualquer um e sendo rejeitado, foi muito difícil de ver. Mas é um filme muito importante para que as pessoas vejam como crianças crescem em uma atmosfera onde não podem criar uma personalidade saudável."

Chico Pinheiro contou que "Ausência" veio de uma aposta em suas observações em São Paulo.

Roteiro que surgiu no Co-Production Market da Berlinale, o longa mostra a solidão adulta dos jovens brasileiros que amadurecem cedo por causa das obrigações e necessidades da família. 

"Esse filme mostra um garoto que está entrando na vida pela porta dos fundos. Esse filme veio de uma inquietação minha. Não quero falar de favela e tiros. Me interessa falar de gente, do ser humano, da complexidade que é a humanidade. Todo mundo é traído, é abandonado, não é fácil viver", comentou.

Para a catalã Carlota Monsegui, o longa do carioca "poderia ser o melhor da Berlinale".
Ela escreve que "a presença do Brasil no festival foi fundamental para esta edição".

"Nas quatro sessões principais, temos títulos muito interessantes, como 'Beira-Mar'. Mas a grande revelação veio com 'Ausência', um filme que mostra uma extrema crueldade humana."

"Beira-Mar", da dupla iniciante Filipe Matzembacher e Marcio Reolon, foi exibido como parte da mostra Forum, que destacou as dificuldades e abusos que os adolescentes sofrem nos dias de hoje.

De Lírio Ferreira, "Sangue Azul" foi exibido também na Panorama.

O grupo de amigos John Ewald, 28, Christian Becker, 29, e Allan Griegs, 25, disse que o filme é bonito, mas não surpreende.

"Trouxe meus amigos porque visitei Fernando de Noronha, e gostei muito das cenas no início e da fotografia. Mas depois não entendi, para que tanto sexo?", questiona Ewald.

Para Lírio, "'Sangue Azul' é uma expedição de ficção científica sobre o cinema, sobre o circo e sobre a impossibilidade do amor".

"Estamos passando por uma transição muito forte na forma de fazer cinema. Dos últimos cinco anos para cá o cinema tem passado por mudanças tecnológicas muito grandes. A presença do circo é uma metáfora: É um arte que já 'capengou' e que foi se reinventando. E o cinema está vivenciado um processo semelhante, de reinvenção."

'CINQUENTA TONS DE CINZA', RECEBIDO COM DEBOCHE PELA CRÍTICA E HISTERIA DOS FÃS

Com cosplay de Christian Gray, adolescentes histéricas e descaso da crítica, a adaptação cinematográfica do soft pornô de E. L. James estreou como assunto paralelo no festival.

O ator Jamie Dornan, no red carpet de Berlim - Getty Images
Mesmo sem ter mostrado a que veio,o protagonista Jamie Dornan assinou autógrafos em pôsteres e tirou selfies com as fãs  dos gritos mais estridentes, em sua passagem pelo tapete vermelho do festival.

TERRENCE MALICK APRESENTOU SEU PIOR FILME

Para a "Variety", "o sétimo longa do diretor Terrence Malick é vazio como o estilo de vida que exibe".

A 'BBC' considerou "Knights of Cups" como o pior filme do recluso cineasta, com um roteiro déjà vu sobre a superficialidade da vida em Los Angeles e um personagem principal raso.

Christian Bale e Natalie Portman em Berlim - AFP
Os protagonistas do longa são Natalie Portman Christian Bale.

O ator, que começou a filmar com Malick na mesma semana em que acabou de rodar 'O Cavaleiro das Trevas Ressurge' - disse em encontro com jornalistas que improvisou nas cenas e atuou sem roteiro no drama.

URSO DE OURO PARA JAFAR PANAHI REAFIRMA VIÉS POLÍTICO DA PERLINALE

"Ele criou uma carta de amor ao cinema", disse o presidente do júri, Darren Aronofsky, ao entregar o Urso de Ouro para a pequena Hanna Saeidi, sobrinha do iraniano Jafar Panahi, no momento mais emocionante da premiação que aconteceu neste sábado (14), no Berlinale Palast.

O diretor americano Darren Aronofsky, presidente do júri da Berlinale 2015 - Contact Music
Justificando a escolha do júri, o curador Dieter Kosslic disse que a "Berlinale é e sempre foi um festival político."

'VICTORIA': RODADO AO VIVO E SEM EDIÇÕES, É O FILME ALEMÃO DE 2015

Em um ano com estreias de grandes nomes do cinema alemão, como "Everything Will Be Fine", de Wim Wenders, e "Queen of The Desert", de Werner Herzog, um filme de baixo orçamento e muita criatividade foi o mais elogiado pelo público e pela crítica.

Vencedor do prêmio de Contribuição Artística Excepcional, "Victoria" é um "Corra, Lola, Corra" contemporâneo, mas chamou a atenção pela forma como foi produzido.

O longa de Sebastian Schipper foi filmado em plano sequência e em único take de 160 minutos, um thriller que levou apenas três filmagens para ser finalizado.

Lala Costa beija o diretor Sebastian Schipper - The Local
Com roteiro improvisado cena a cena, o longa acompanha a trajetória de 24 horas de Victoria (a espanhola Lala Costa) que se envolve com um grupo de quatro jovens alemães e é persuadida a dirigir o carro da fuga em um assalto a um banco.

A ONIPRESENÇA DE JAMES FRANCO

Era difícil caminhar pelas ruas da Potsdamer Platz, onde o festival é realizado, sem esbarrar em algum dos pôsteres de divulgação do festival com o rosto de James Franco.

Situação semelhante aconteceu nas telonas, onde o ator protagonizou os longas de Wenders e Herzog, a produção independente "I Am Michael" e a exibição paralela de "A Entrevista".

James Franco no Red carpet de Berlim - Contact MusicEm entrevista, Franco diz que este é um reflexo de diferentes trabalhos que está perseguindo.
"As pessoas gostam de dizer que são muitas coisas, mas eu vejo que tudo que faço está conectado de uma forma ou de outra. E atrás de tudo isso está meu interesse em coisas diferentes e perseguir novas formas de criatividade, de reinventar e encontrar novas abordagens. Seja na produção, na escrita ou na direção, elas são apenas saídas alternativas."

Ao mesmo tempo que interpreta quatro personagens diferentes - um escritor, o amante de uma grande aventureira, um ex-ativista gay e um jornalista vaidoso - a impressão é de que os seus esforços para se desenvolver como ator são grandes, mas nas telas o efeito ainda é praticamente o mesmo, com atuações muito semelhantes.

Mas que ele sabe causar, sabe!

A MULHER NO CINEMA E CENSURA FORAM PAUTAS IMPORTANTES

A Berlinale anunciou antecipadamente seu esforço em criar uma edição mais feminista e esse foi o assunto que pautou as discussões.

A espanhola Isabel Coixet - que fez a abertura com "Nobody Wants The Night" - comentou que "não se limita cinema pelo gênero".

Já a diretora polonesa Malgorzata Szumowska preferiu comemorar: 
"Sou diretora, sou mulher e estou aqui hoje", comentou ao receber o Urso de Prata de Melhor Direção com o drama performático "Body".

A diretora polonesa Malgorzata Szumowska aceita seu Urso de Prata - UK News/Yahoo
A censura também foi um tema recorrente nas discussões com a imprensa.

Diretor do elogiado longa mexicano sobre os amores do cineasta soviético Serguei Einsenstein, Peter Greenway comentou a censura de seu filme na Rússia, que negou ter proibido o roteiro.

"Nós sabemos sobre a censura que acontece no seu país. Vamos nos perguntar porque a Rússia nunca fez um bom filme sobre Eisenstein? Porque ele é homossexual", discutiu com o repórter russo que insistia em dizer que não existe censura na Rússia - sen-sa-cio-nal!

CONVIDADA PARA DEBATE SOBRE LIBERDADE DE EXPRESSÃO, 'CHARLIE HEBDO' RECUSA, MAS ENVIA CARTUM PARA A BERLINALE

O Cinema Fund, evento paralelo à Berlinale que arrecada fundos e incentiva a produção cinematográfica sobre a paz, convidou os jornalistas do "Charlie Hebdo" para uma conversa sobre liberdade de expressão.

A revista recusou enviando um desenho onde uma pomba branca com um galho de oliveira na boca pergunta: "Você está falando comigo?".

 Integrantes da banda punk Pussy Riot em Berlim - Interaksyon
No mesmo evento, integrantes da banda punk Pussy Riot fizeram uma homenagem ao artista chinês Ai Weiwei, que deu um depoimento em vídeo.
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Até o ano que vem!!

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