segunda-feira, 11 de outubro de 2010

ABORTO E A ELEIÇÃO NO SÉCULO XII

O destaque nesse segundo turno da campanha à presidência, é o tema da descriminalização do aborto.

Questão complexa, que por envolver convicções pessoais e religiosas, só poderia ser decidida legitimamente pela mulher que deseja abortar, ou por meio de uma consulta popular, o tal "plebiscito sobre", de que tanto martelou no primeiro turno Tia Marina Silva Clorofila ex-Malafaia.

Nem por isto é fora de questão que o tema se torne presente no debate eleitoral, já que é direito do eleitor conhecer as opiniões dos candidatos sobre o tema.

Só que, em vez de ocasionar uma discussão racional e franca, a disputa sucessória tem-se caracterizado por uma atitude retrógrada, ignorante e obscurantista.

Obscurantista, não pela rasa identificação que se costuma fazer entre a firmeza de convicções religiosas e um espírito medieval de caça às bruxas, já que se pode perfeitamente ser contra o aborto em qualquer circunstância, sem ser um fanático fundamentalista - e mesmo sem professar nenhuma religião como eu, que sou ateu.

O obscurantismo marca a campanha eleitoral quando o que se procura é, antes, confundir o eleitor do que esclarecer as próprias posições.

O exemplo maior disso é o slogan do "direito à vida", que aparece na propaganda eleitoral de ambos os candidatos ao segundo turno.

Como se sabe, essas palavras têm um sentido claro para o eleitorado católico - e cristão de modo geral -, já que podem ser traduzidas como uma condenação do aborto, mesmo nos casos já admitidos na lei brasileira -o de gravidez por estupro e o de risco de morte para a mãe.

Nenhum dos dois candidatos propõe a revogação desse dispositivo mas, que lancem mão ao lema do tal "direito à vida" é sintoma da dificuldade de ambos em defender o que já existe na legislação, contrário às ideias dos eleitores que pretendem conquistar.

Pessoalmente, considero que a legislação vigente deve ser flexibilizada, de modo a permitir que, já sofrendo numa circunstância evidentemente dramática e dolorosa, qualquer mulher em solo brasileiro possa interromper a gravidez, sem que seja considerada criminosa por isso.

Cerca de 1,1 milhão de abortos clandestinos são feitos anualmente no país, na grande maioria das vezes em condições precaríssimas, em ambientes que mais parecem um açougue de quinta categoria do que uma sala de cirurgia.

Os abortos mal feitos dão um gasto de mais de R$ 850 milhões por ano ao SUS, e são a terceira causa de mortalidade materna no Brasil.

Em 56 países, que representam 40% da população mundial, o aborto é permitido sem restrições até a 12ª semana de gravidez - limite máximo que se poderia admitir, e com o qual eu concordo.


Com certeza, políticas públicas de esclarecimento e garantia de acesso a meios anticoncepcionais - como a pílula do dia seguinte -, poderiam, se amplas, intensivas e duradouras, prevenir a gravidez indesejada e reduzir de maneira drástica o número de mulheres que se valem, numa situação extrema, do traumático recurso.

Só que alguns setores religiosos, como é certo e sabido, são contra até mesmo o uso de anticoncepcionais e da camisinha - que nos dias atuais não serve só para não ter filhos, mas principalmente para evitar contágio por doenças sexualmente transmissíveis.

A sociedade felizmente evoluiu na direção oposta, e hoje os jornais já trazem a informação que o tema do aborto só fez cerca de 1% dos eleitores mudarem seu voto em 3 de outubro.

Fica provado, assim, que tivemos segundo turno muito mais pelo tráfico de influência da companheira Erenice na Casa Civil - e o salto alto de Dona Dilma, Luiz Inácio e companhia bela - do que pela pregação religiosa/medievalesca que pastores e padres fizeram contra a petista.

O Brasil precisa com urgência de um plebiscito sobre o aborto, para que a população seja esclarecida sobre os vários aspectos envolvidos na questão, longe das religiões todas que, para mim, só servem para levar a Humanidade ao começo do século 12, para dizer o mínimo.

Confira a coluna de hoje em vídeo, já postado no YouTube e no UOL:

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