segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

'THE WITCHER': CRÍTICA DA PRIMEIRA TEMPORADA

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Série Original Netflix entrega o que promete - Henry Cavill faz seu melhor protagonista há muito tempo
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SINOPSE:

Um grupo de jovens com habilidades peculiares encara a difícil missão de combater as criaturas mais perigosas do planeta Terra.

Conhecidos como bruxos, cada membro desenvolveu muito cedo capacidades sobrenaturais a fim de encararem uma desafiante caçada aos monstros e manterem a humanidade em segurança.

CRÍTICA:

Há dezoito anos, Peter Jackson provava para o mundo que adaptações cinematográficas poderiam se igualar aos romances originais e, por vezes, ultrapassá-los no quesito emocional: em 2001, nascia a versão audiovisual da icônica saga ‘Senhor dos Anéis’, com longas narrativas que nunca deixaram de representar um marco na indústria do entretenimento.

Uma década mais tarde, chegou a vez da obra de George R.R. Martin ser transformada  pela HBO na série ‘Game of Thrones’, que também quebrou recordes de premiações e capturou a trágica essência de Westeros para as telinhas (com exceção da apressada e desconexa oitava temporada).

Com esse lucrativo filão aberto, é até natural que a gigante Netflix reclamasse seu lugar no pódio das melhores releituras de ficção fantástica.

Nascia assim o show baseado na franquia de livros e de games ‘The Witcher’, que estreou na Netflix nesta sexta, 20.12

A história, do romancista polonês Andrzej Sapkowski, faz parte do segundo boom da literatura do gênero em questão e traz um expansivo e visceral mundo povoado por criaturas sobrenaturais e terrenas que constantemente entram em conflito – e que são acrescidas com pertinentes críticas sociais.

Quando Lauren Schmidt Hissrich (conhecida por seus trabalhos em ‘The West Wing’ e ‘Justice’) anunciou que levaria o intrincado enredo focado em Geralt de Rivia para a Netflix – prometendo superar todas as expectativas e manter-se fiel à sua própria identidade artística e aos escritos de Sapkowski - os fãs aplaudiram.

Para a primeira temporada, a trama revisita justamente a origem de tudo: os vários contos que Sapkowski escreveu até o começo da década de 1990, compilados em O Último Desejo e A Espada do Destino.

O foco é a figura de Geralt (Henry Cavill), um mutante altamente habilidoso em combate, que presta serviços de matador de monstros e outras criaturas mágicas para quem precisa (e paga).

Há certa simplicidade conceitual no bruxo que o faz adaptável para toda situação, o que cria um vasto potencial narrativo.

Então o autor - e a série, por extensão - complica as coisas ao fazer com que os demais personagens menosprezem e tentem manipular a moralidade do protagonista.

Isso é o que rendeu tantas histórias na literatura, e o seriado honra tal conceito ao encaixar o máximo de contos que consegue.

Cada capítulo adapta uma trama, e introduz novos rostos, lugares e situações para o bruxo encarar.

Isso ajuda a desenvolver o personagem em uma variedade de cenários, e também dá ritmo intenso ao programa.

Sempre em movimento, Geralt pega contratos em uma vila, ou então atua de guarda-costas para um banquete real.

Há bastante riqueza narrativa nesse formato e o que dá consistência à tudo é a atuação de Cavill, em um papel que pode não parecer, mas é bastante delicado: pelas mutações o protagonista não é extremamente expressivo, porém compensa com certo charme niilista e um humor sombrio e cético.

O ator mostra que entende a essência do que deveria ser Geralt, mesmo que sua entrega soe bastante com a de Dougle Cockle, voz do matador de monstros na trilogia da CD Projekt RED.

A Netflix garante que se inspirou apenas nos livros, mas é certo que os games moldaram a performance de Cavill, um fã assumido de The Witcher 3: Wild Hunt.

A estética da série também remete aos cenários e artes conceituais do estúdio polonês - o que nem de longe é ruim, já que ajuda a criar consistência no imaginário popular da franquia sem entrar no território de cópia.

The Witcher é uma adaptação extremamente fiel ao trabalho de Sapkowski, e usa até mesmo passagens das obras originais, como o monólogo do bruxo sobre a natureza do mal em “O Mal Menor”.

Enquanto isso cria um prato cheio para os fãs, também resulta nos maiores problemas do seriado.

Acontece que o autor polonês não era exatamente um escritor quando criou esse universo, apenas um leitor ávido.

Isso fica evidente nas primeiras obras, que têm dificuldades em estabelecer os temas como subtexto ao invés de escancará-los.

A série segue isso religiosamente, o que resulta em muitos diálogos óbvios e explicativos.

Não é preciso saber previamente que a saga é motivada por família e destino; todos os personagens fazem questão de ressaltar isso diversas vezes por episódio, por exemplo.

O guerreiro foi privado de ter uma infância normal e, por isso, não tem uma relação “amigável” com outras pessoas – que normalmente o encaram como um ser demoníaco, fruto do pecado e que não deve ser confiado.

As coisas mudam quando ele cruza caminhos com outras figuras totalmente fora do padrão: a maga Yennefer de Vengerberg (Anya Chalotra) e a jovem princesa refugiada Cirilla (Freya Allan).

Assim, até metade do terceiro capítulo temos certeza absoluta de que os três arcos protagonistas irão se juntar mais cedo ou mais tarde em uma convergente reviravolta ou algo do tipo, amarrando as pontas soltas e caminhando para um competente season finale.

Só que não é isso o que acontece: na verdade, o trio em questão se situa em linhas temporais diferentes cujas delineações brincam com as ideias de passado, presente e futuro – ou ao menos tentam fazer isso.

A série tem incrível potencial e se desenvolve numa zona de conforto que, ao mesmo tempo, busca explicar tudo o que existe no universo apresentado.

Não é à toa que a sensação inicial é episódica, colocando Geralt acima das outras personagens em aventuras pontuais que forçosamente se entrelaçam na “batalha final”.

Mais do que isso, o roteiro não sabe equilibrar a dosagem cênica dos personagens principais, por vezes se esquecendo da importante representação de Ciri, ou então nos envolvendo na poderosa e arrepiante transformação de Yennefer apenas para reinventar um cânone pré-estabelecido.

Apesar dos erros, a produção acerta em aspectos imprescindíveis para o envolvimento da audiência: desde a perfeição dos cenários até a performance de seus atores, é inegável dizer que o show pensa com exímia cautela na atmosfera de cada uma das cenas, ainda que recorra a certas obviedades.

A série faz bom uso do que foi colocado, com Chalotra nos roubando a atenção por uma atuação narcótica e agonizante – e que detém o único sólido desenvolvimento desse primeiro ano.

Outros aspectos técnicos são teatrais demais para serem levados à sério: eventualmente, Ciri foge do ataque à sua terra natal e encontra-se nas misteriosas florestas de Brokilon, protegida pelas dríades - onde a fotografia excede a um gritante nível de saturação que é impossível crer na possibilidade daquele lugar pertencer ao Continente – pior ainda, é muito fácil observar a fragmentada união de certos elementos (que também não são ajudados por uma previsível trilha sonora).

Outro acerto da produção são as excelentes cenas de ação.

Como dito, Sapkowski não era muito experiente em seus primeiros trabalhos, algo que foi se desenvolvendo ao ritmo que escrevia mais e mais romances.

As lutas dos contos, portanto, são um pouco confusas, com o autor afirmando que Geralt é alguém ágil e habilidoso, mas através de descrições truncadas.

Na série, a briga ganha atenção extra já que Cavill (que fez as próprias cenas) e a equipe criam um estilo próprio pro bruxo, que combina violência de precisão cirúrgica com movimentação quase artística, ainda que não tão exagerada e cheia de saltos e piruetas como o escritor polonês visualizou.

No fim das contas, o saldo é bastante positivo.

A série pende mais pro lado da obra original, mas traz elementos próprios o suficiente para ter voz própria, especialmente na forma como ordena os contos em uma única trama.

Essa estrutura traz uma dinâmica que é rara em produções medievais e mostra que o foco aqui não é na política (como Game of Thrones) ou em grandes eventos (como em Vikings), mas sim em personagens.

A família improvisada de Geralt, Yennefer e Ciri é o enorme coração da franquia e o seriado entende bem isso com sólido desenvolvimento de todos e atores claramente apaixonados pelos papéis.

Não é a toa que Sapkowski, conhecido por ser ranzinza com as adaptações de seu trabalho, deu sua benção ao projeto, chegando até a visitar o set e se reunir diversas vezes com a showrunner.

A já garantida segunda temporada deve mudar bastante ao tomar um formato mais linear, graças à progressão da história a partir do romance O Sangue dos Elfos.

Isso não deve ser motivo de preocupação: Hissrich e sua equipe demonstraram carinho e entendimento profundo pelo material-base.

Os fãs podem não só ficar tranquilos como também ansiosos por todo o drama, violência, monstros e traições que vêm por aí.

GALERIA DE IMAGENS:
Foto Henry Cavill

Henry Cavill como Geralt de Rivia em The Witcher, da Netflix





Foto


TRAILER:


FICHA TÉCNICA:
THE WITCHER
Título Original:
THE WITCHER
Gênero:
Aventura, Fantasia
Direção:
Lauren Schmidt Hissrich
Elenco:
Henry Cavill, Freya Allan, Anya Chalotra e outros
Ano de Produção:
2019
Países:
EUA, Polônia
Duração dos Episódios:
60 min

COTAÇÃO DO KLAU:

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