terça-feira, 28 de janeiro de 2014

'HOMELAND': TERCEIRA TEMPORADA COLOCA NOVAMENTE PROTAGONISTAS CARRIE E BRODY NA ZONA DE DESCONFORTO E LEVANTA A TRAMA


Carrie (Claire Danes), internada numa clínica psiquiátrica, após depoimento de seu chefe e mentor, Saúl (Mandy Patinkin) ao Senado americano.

Nicholas Brody (Damian Lewis), acusado pelo ataque terrorista que destruiu a sede da CIA em Langley, reaparecendo, baleado, na Venezuela.

Esqueça a modorrenta segunda temporada de 'Homeland' - uma das mais premiadas séries da TV americana - e prepare-se para momentos de puro êxtase - ao menos o ritmo dos três primeiros episódios da aguardada nova temporada mostram isso.

A terceira temporada começou com os dias posteriores ao ataque terrorista que dizimou o aparato de inteligência dos Estados Unidos, e deu inicio à perseguição ao terrorista mais buscado no mundo – Nick Brody .

Enquanto Carrie e Saúl, agora chefe supremo da CIA, tentam recompor suas vidas - tanto profissionais quanto pessoais - eles ficam imersos na tempestade de fogo que envolveu esse ataque terrorista e a consequente busca pelo paradeiro de Brody - que de herói nacional condecorado agora é, perante a opinião pública e o governo, o mais perigoso terrorista do mundo.

Carrie - para mim a mais sensacional personagem da TV em muitos anos - deixou de tomar seus remédios para controlar sua bipolaridade, e está completamente surtada.

Saúl, seu chefe e mentor, sabe que ela conhece o paradeiro de Brody e, para isso, não tem escrúpulos em deixa-la na linha de tiroteio da CIA e da mídia - o que acaba por levar Carrie a ser internada numa clínica psiquiátrica.

Saúl (Mandy Patinkin) depõe em comissão do senado - Divulgação

Por sua vez, Brody, que é acusado injustamente (?) de ter feito o atentado, e que tinha sido levado por Carrie até a fronteira do Canadá na sua fuga, reaparece,baleado, na fronteira da Venezuela e Colômbia e é resgatado por um grupo de bandidos nada bolivarianos, que o tratam e o levam, meio que prisioneiro, para uma favela vertical na capital, Caracas.

Ou seja: a nova temporada começou cheia de rupturas, muito mais ousada que em toda sua trajetória, com os produtores Howard Gordon e Alex Gansa mostrando por quê essa parceria de anos vem dando novamente certo aqui.

O maior sucesso da carreira deles - a histérica '24 Horas' - inaugurou a era de ganchos obrigatórios - ou seja, episódios que sempre entregassem reviravoltas insanas semana após semana - uma ideia ótima e desbravadora, agora repetida com sucesso em 'Homeland', que conseguiu um respeito crítico jamais alcançado por '24 Horas' por uma simples razão: incorporou à sua genética nervosa um pouco de minimalismo.

Estamos na era dos dramas sutis, silenciosos, apoiados também em trabalho de ator, essencialmente - e o trio protagonista, Claire Danes, Damian Lewis e Mandy Patinkin é primoroso nesse quesito.

Gordon e Gansa jamais tiveram a intenção de abandonar seu estilo "cada final é uma surpresa", mas aprenderam a revestir seu produto de elegância, mas também com muitas surpresas e no choque.

Assim, Carrie começa esse ano jogada às traças.

Carrie internada em clínica: batendo cabeça - Divulgação
O caminho deixado pelo segundo ano não tinha sido muito promissor, com ela e Brody vivenciando um amor perigoso para o futuro da série e com ele amaldiçoado pela culpa no novo e devastador ataque à CIA (uma das especialidades dos criadores da série).

Assim, agora todos os esforços de Carrie estão em encontrar aliados e formas de começar sua caminhada nessa direção.

Inteligentemente, a missão da protagonista é desacreditada de cara - isso não deixa de ser interessante, já que a série sempre foi sobre ambiguidades e, a despeito de suas patentes ou reputações, os personagens não são símbolos de confiança.

Carrie tem sempre sua bipolaridade depondo contra ela, Brody nunca está de lado nenhum de modo plenamente fiel e Saul nunca tem o poder.

O papel deles nessa trama é o de sempre nos fazer desconfiar e esperar que eles sejam capazes de qualquer coisa.

Por isso, quando os primeiros episódios começaram a insinuar que Carrie seria desprezada pelo próprio país, uma reviravolta justa, todos acharam que ao menos era uma abordagem nova, que impediria o programa de continuar correndo em círculos, como o foi na segunda temporada com o modorrento romance.

As extremidades pra onde os personagens tinham sido jogados não permitiria mais o mesmo jogo de espião e espionado, adiando o destino de Brody e mostrando o inferno instaurado na vida de Carrie.

A desmoralização da personagem era realmente ousada e se categorizou desde o primeiro episódio, quando as reações dela, sozinha em casa, vendo as declarações de Saul - em comissão do senado e ferrando com ela - deixavam claro que aquele era o único e irremediável caminho da dramaturgia.

Se ninguém esperava que Carrie traísse seu país ao dar guarida a um suposto terrorista por amor , um embarque nessa possibilidade poderia abrir ótimos campos, com ela fazendo um jogo individual, usando o inimigo para encontrar e inocentar Brody.

Brody (Damian Lewis)  reaparece no terceiro episódio e tenta fugir dos seus protetores e refugiando-se numa mesquita em Caracas - Divulgação

Episódio após episódio dessa primeira parte da temporada, a fundamentação dessas bases foi se fortalecendo, com os personagens motivados por isso e havia uma quantidade tão grande de confirmações desses planos, que qualquer embuste parecia completamente impossível.

E quando estávamos seguros nessa direção...

A revelação de que a derrocada de Carrie era um plano não caiu bem pois, se muitas reservas já vinham nos afligindo desde a metade do ano dois, com essa "surpresa", o estrago foi feio.

Se as surpresas num roteiro são muito bem-vindas, em casos como esse - em que o telespectador foi enganado por tanto tempo, a revelação precisa resistir a uma conferência, e não foi isso que aconteceu.

A reação de Carrie enquanto via o depoimento de Saúl, lá no episódio de estreia, era de absoluta indignação e não importa o quanto os criadores insistam em dizer que "planejar e ver acontecer são coisas diferentes", no final das contas, eles fizeram-na reagir daquele jeito para nos fazer acreditar numa mentira que não era contada só entre eles, mas para o público, do modo mais cretino e oportunista possível.

A revelação foi uma bomba que ficou devendo uma série de explicações básicas, tirando também o telespectador de sua zona de conforto - como também ficou sem saber o que fazer em relação à gravidez de Carrie.

O roteiro parecia confuso, querendo manter a sanidade da protagonista sempre em vigência, mas usando de bobagens que não contribuíam pra isso.

Bipolarismo não significa burrice e aquele absurdo dos testes que ela fazia repetidamente e guardava, só deixou a coisa mais ridícula.

O bebê, em si, já era preocupante, visto que a luta de Carrie não deveria ser por um homem e sim pelo próprio pais - essa era a essência, a fundamentação de 'Homeland' e da série israelense que ela foi baseada.

Tudo sempre foi uma questão de pátria e ver as atitudes da personagem focando só no "amor", muitas vezes colocando missões em risco, não era justo com ela - Carrie sempre foi instável, mas sua inteligência era capaz de superar isso.

Enfim, sem a 'zona de conforto amorosa' que vivenciamos na segunda temporada, continuar com missões de espionagem focados no trio Carrie/Brody/Saul seria o mesmo que entregar mais do mesmo, infinitamente.

Em algum momento, Carrie teria que parar de querer ferrar tudo "por amor", Brody precisaria tomar um partido definitivo e Saúl começar a ser respeitado pela CIA.

Sendo assim, os criadores decidiram colocar Brody numa encruzilhada definitiva, tornando a exposição dele como traidor dos EUA num modo totalmente irreversível.

Visto numa perspectiva da metade da temporada em diante, o plano todo de Saúl para se infiltrar no Irã acabou se revelando muito interessante e até as partes que deram errado nos levaram para caminhos melhores.

Porém, para chegar a um quarto com confiança, 'Homeland' precisava matar seus equívocos, sacrificar seus confortos e pra nossa sorte, foi exatamente o que eles fizeram.

Pouco a pouco, a série foi aparando suas arestas, corrigindo os percursos e, principalmente, reconhecendo seus erros.

Aquela era a Carrie que sempre quisemos ver, incapaz de se comprometer com nada além do trabalho que a define.

Eles quiseram expurgar-na de tudo, deixar o caminho livre para um futuro que nos soa praticamente como uma nova estreia.

Ficou pelo caminho uma estrela de mentira, para condecorar um herói meia boca.

Muitas surpresas ainda estão por vir e, assim, a quarta temporada vai começar totalmente do zero, reconhecendo, enfim, que mais importante que preservar personagens é preservar a dignidade.

Confira trailer da terceira temporada:
*****
'HOMELAND' - TERCEIRA TEMPORADA
País de produção:
EUA , 2013
Série Dramática em:
12 episódios
Roteiro:
Alex Gansa, Gideon Raff, Howard Gordon
Elenco:
Claire Danes, Damian Lewis, Mandy Patinkin, Morena Baccarin, Morgan Saylor, Jackson Pace, Rupert Friend, Sarita Choudhury, F. Murray Abraham, Tracy Letts
Onde:
FX
Quando:
Domigos
Horário:
23h
Cotação do Klau:

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