quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

'MINHA FAMA DE MAU': CINEBIOGRAFIA CORRETA E INSPIRADA, QUE MOSTRA A JOVEM GUARDA COMO QUEREMOS VER


SINOPSE:

Lutando para sobreviver e se virando com pequenos trabalhos, o jovem Erasmo Carlos (Chay Suede) alimenta uma paixão: o rock and roll.

Fã de Elvis Presley, Bill Halley & The Comets e Chuck Berry, ele aprende a tocar violão e passa a perseguir a ideia de viver da música.

Misturando talento e um pouco de sorte, ele conquista a admiração do apresentador de TV Carlos Imperial (Bruno de Luca), um cara influente no meio artístico, e através dele conhece o cantor Roberto Carlos (Gabriel Leone), com quem começa a compor diversas canções.

A parceria dá muito certo e o sucesso logo chega, transformando para sempre a vida de Erasmo.

CRÍTICA:

Em meio a tantos projetos envolvendo ícones da música popular brasileira, no cinema e no teatro, era de se estranhar que nada tenha sido desenvolvido abordando o universo da Jovem Guarda, movimento ícone dos anos 1960 que balançou corações e mentes dos jovens da época.

Minha Fama de Mau, que estreia nesta quinta (14) vem suprir esta lacuna, tendo por base a vida de um dos principais nomes do movimento: Erasmo Carlos.

Dirigido por Lui Farias, o longa-metragem é hábil ao encampar a Jovem Guarda não apenas como fenômeno musical, mas também comportamental - especialmente ao ressaltar ser esta a principal característica do movimento.

Não se trata de denegrir as canções e músicos, esforço empreendido por vários críticos da época, mas de contextualizar o momento do país de forma a melhor compreender sua explosão popular, tendo sempre por base a carreira do próprio Erasmo.

Até por isso, o longa foge do tema político, sequer lembrando o espectador de que os fatos narrados aconteceram em plena ditadura militar.

Gabriel Leone (Roberto Carlos), Malu Rodrigues (Wanderléa) e Chay Suede (Erasmo Carlos) - Fotos dessa postagem: Divulgação/Downtown Filmes

Se para o filme a informação não importa, isso deixa ainda aberta a lacuna acerca do filme definitivo sobre a Jovem Guarda, em toda sua abrangência.

A partir da efervescência musical do bairro carioca da Tijuca, berço também de Tim Maia (Vinícius Alexandre, em boa composição do estilo inconfundível do cantor, mesmo na juventude), o filme acompanha a saga de Erasmo antes mesmo de aprender música de fato, quando era um mero fã do que vinha lá de fora - empolgado com o ritmo e visual alheios, ele busca o rock'n'roll style ao dedilhar suas primeiras notas e se arriscar no microfone.

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Vinícius Alexandre é Tim Maia
Sua jornada é apresentada a partir de um mix de estilos narrativos, que nem sempre dialogam bem entre si.

Da quebra da quarta parede à presença de um narrador em off, o longa passa ainda por mudanças de formato de tela, personagens desenhados a mão, sonhos, enquadramento no estilo quadrinhos, imagens de época e uma atriz que se desdobra em vários personagens, sempre em participações bem pequenas - e, muitas vezes, sem qualquer importância.

E tudo com diálogos que transmitem a ansiedade em rapidamente proporcionar ao espectador o reconhecimento dos personagens em cena.

Por mais estranha que seja, a estrutura narrativa tem justificativa, dada pelo próprio filme.

Em determinada cena, Roberto e Erasmo Carlos estão juntos em um ônibus, compondo a letra de "Parei na Contramão".

Um deles pergunta: "mas como você quer fazer uma música sobre carros que tenha um ritmo lento?"

Chay Suede é o protagonista Erasmo Carlos

Lui Farias segue a mesma tática: ao rodar um filme sobre juventude, mesmo que de época, ele busca a novidade como formato narrativo, no sentido de dialogar esteticamente com sua matéria-prima.

Por mais que até seja uma proposta interessante, a má execução de boa parte de tais tentativas traz ao filme um ar de estranhamento, em seu terço inicial.

É apenas quando sossega nas experimentações, assumindo um ritmo mais tradicional, que o filme se encontra de fato - não por acaso, é quando a Jovem Guarda inicia.

Em meio à histeria decorrente do sucesso, brilha o talento de Chay Suede e Gabriel Leone.

Se o primeiro como Erasmo migra da luta por algum espaço para o posto de ídolo de uma geração, Leone é a personificação precisa do jeito de ser de Roberto Carlos - sem recorrer a caricaturas, como tantas vezes acontece.

Malu Rodrigues, grande atriz de musicais, completa o trio como Wanderléa, em uma atuação mais dedicada a replicar os trejeitos da cantora do que propriamente no desenvolvimento da personagem - demérito do roteiro, que foca apenas na proteção (e desejo) da dupla Roberto & Erasmo à caçula do grupo, sem dar a ela alguma profundidade.

Esta, é sempre bom lembrar, é a história de Erasmo e assim, vemos apenas o que interessa.

Claro que a amizade com Roberto Carlos ganha um bom espaço.

É interessante também reparar que, pela quantidade de filmes já feitos envolvendo ícones da MPB, certas lacunas presentes em aqui são preenchidas por outras produções.

Por exemplo, a ausência de Tim Maia da Jovem Guarda, mesmo integrando o mesmo grupo, está na cinebiografia do eterno síndico.

Erasmo já curtindo o sucesso proporcionado pela Jovem Guarda

A importância de Carlos Imperial - e seu jeito impositivo e muitas vezes destrutivo - vai além da caricatura aqui apresentada por Bruno de Luca e é (bem) melhor esmiuçada no documentário Eu Sou Carlos Imperial.

Mesmo Elis Regina, aqui apenas mencionada, tem sua ojeriza às guitarras apresentada em Elis.

É a história dos ídolos da música nacional formando, indiretamente, um imenso painel multifacetado sobre uma época tão rica e também complexa.

Lui Farias entrega um filme correto, que tenta agradar aos fãs na representação dos bastidores da Jovem Guarda e, ao mesmo tempo, capturar a atenção dos mais jovens pela proposta narrativa empregada, apesar dos claros problemas de unidade.

Seu ponto forte é o elenco, bem escolhido e caracterizado, que canta muito bem e que muitas vezes supera as fragilidades de roteiro e mesmo estruturais, quando claramente percebe-se que havia um orçamento limitado ao rodar certas cenas - especialmente as que mostram a saída da rádio onde Carlos Imperial trabalhava.

Retrato sonoro e comportamental de uma época, o longa atende ao objetivo de trazer às telonas a história de vida de Erasmo Carlos - mesmo que, para tanto, tenha que desviar o foco de certos ângulos interessantes, e até mesmo necessários à história do movimento.

Paula Toller como a maior fofoqueira de celebridades da época, Candinha

Como curiosidade, vale prestar atenção na breve participação da cantora Paula Toller, como a icônica fofoqueira do rádio Candinha - uma ótima referência a quem viveu a época.

TRAILER:


FICHA TÉCNICA:
MINHA FAMA DE MAU
Título original:
MINHA FAMA DE MAU
Gênero:
Drama, Biografia, Musical
Direção:
Lui Farias
Elenco:
Chay Suede, Gabriel Leone, Malu Rodrigues, Isabela Garcia, Bruno de Lucca, Bianca Comparato, Gabriel Gracindo, João Vitor Silva, Vinícius Alexandre, Paula Toller
Roteiro:
Lui Farias, Letícia Mey - baseados na autobiografia de Erasmo Carlos
Produção:
Marco Altberg, Lui Farias
Diretor de Fotografia:
Gui Gonçalves
Diretor de Arte:
Tiago Marques
Estúdios:
LMC LaToller, Indiana Produções, Globo Filmes, Tele Cine Productions
Distribuição:
Downtown Filmes
País:
Brasil
Ano de Produção:
2019
Duração:
1h56

COTAÇÃO DO KLAU:

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