sábado, 11 de maio de 2019

'COISA MAIS LINDA': CRÍTICA DA PRIMEIRA TEMPORADA


SINOPSE:

Uma dona de casa paulistana chega ao Rio dos anos 50 para encontrar o marido e descobre que foi abandonada.

Em vez de sofrer, ela decide ficar na cidade e abrir um clube de bossa nova.

CRÍTICA:

Produções de época são comuns no entretenimento, pela curiosidade do público em saber como viviam as pessoas em tempos passados.

Enquanto nos EUA vários períodos são retratados em séries e filmes, no Brasil essa prática é mais comum com as novelas, que muitas vezes exibem belos cenários e figurinos.

É dentro deste contexto que a Netflix lançou Coisa Mais Linda, série original brasileira situada entre o final da década de 50 e o começo dos anos 60.

É uma época mágica, quando o samba e a bossa nova começam a tomar forma, mas também é uma época de luta para alguns grupos da sociedade, principalmente as mulheres.

É impossível falar sobre a série e não ressaltar o quanto cada protagonista é diferente - e justamente por isso traz uma discussão nova.

Malu (Maria Casadevall) é filha de uma família rica de São Paulo, que se casa, tem um filho e imagina ter uma vida perfeita para os padrões que a aquela sociedade exigia dela.

Mas um dia Maria Luísa vai para o Rio de Janeiro e descobre que seu marido fugiu com outra e a deixou cheia de dívidas.

Ela tem duas escolhas: ou voltar para a casa dos pais e procurar outro casamento, ou seguir sua vida independente.


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Malu (Maria Casadevall), em cena da série - Fotos dessa postagem: Divulgação/Netflix

Lígia (Fernanda Vasconcellos) tem uma realidade parecida: jovem, bonita e casada, seu próximo passo na vida social do Rio de Janeiro é ser mãe.

Só que o sonho de Lígia sempre foi cantar, mas seu marido não aceita ter uma esposa que trabalhe na noite.


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Lígia (Fernanda Vasconcellos) em cena
A terceira mulher desse grupo é Adélia (Pathy DeJesus), uma mulher negra que vive no morro e trabalha duro para sustentar a filha.

Ela conhece e ajuda Malu e as duas se tornam grandes amigas.


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Adélia (Pathy DeJesus) em cena
Fechando o quarteto há Theresa (Mel Lisboa), que acabou de voltar de Paris e tem o que seria o relacionamento mais desconstruído naquele tempo: ela tem um trabalho importante em uma editora, tem um relacionamento sincero com o marido e não é maltratada por ele (como acontece com outras).


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Theresa (Mel Lisboa) em cena
Talvez seja demais descrever cada uma das personagens, mas há uma riqueza importante aqui.

Malu, Adélia, Theresa e Lígia são de origens diferentes e possuem dores diferentes.

Mas todas elas sofrem com os preconceitos do dia a dia e por isso se unem.

Cada uma delas apoia a outra e serve de suporte, mesmo antes de uma grande amizade ser estabelecida.

Quando as quatro estão juntas e conversam, cada uma traz um pouco de sua vivência e, mesmo que aquela não seja a dor da outra, há uma sororidade bonita entre elas, sem julgamentos.

Em uma realidade que muitas personagens femininas diferentes são colocadas na tela como rivais, é gratificante ver como essas quatro forças entenderam a importância de trabalharem juntas.

A música é parte importante do seriado através de Lígia, Capitão (Ícaro Silva) e Chico (Leandro Lima).


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Leandro Lima é Chico
Enquanto Malu tem a ideia de abrir um clube de bossa nova para tocar a vida sem precisar ser sustentada por ninguém, são esses três personagens acima que cantam, tocam e emocionam.

Na verdade, havia até mais espaço para a música no seriado, mas os momentos dedicados a isso funcionam muito bem dentro da trama e enriquecem a história.

A parte técnica/visual é praticamente impecável: figurinos, design de produção e cenários são caprichados e a fotografia é realmente um capítulo à parte.

Há muita cor, principalmente nas cenas ao ar livre e na praia, que ressalta o calor do Rio de Janeiro e traz reconhecimento para quem já visitou a cidade e sabe como ela é quente.

O contraponto disso é a meia-luz das boates de música, que deixam o fundo e a plateia com menos luz para acentuar a bela música que é cantada no palco.

Por tudo isso, Coisa Mais Linda já é uma série que se torna relevante para assistir.

Infelizmente há alguns pontos negativos e eles aparecem principalmente entre o meio e o final.

Se a série começa bem, apresenta suas personagens, estabelece as tramas e propõe desenvolvimentos interessantes, como o mercado de trabalho machista em que Theresa está inserida, esse ritmo cai bastante entre o quinto e o sexto, já que a narrativa é apressada para que as personagens concluam logo o seu arco e cheguem ao gancho final - que, aliás, é muito bom.

Ao fazer isso, a série tira o peso de algumas situações e problemas.

Em certo momento, por exemplo, uma personagem tem problemas com a maternidade - ms o impasse é resolvido e superado dentro de um episódio.

Há emoção na atriz que interpreta tudo isso, mas o curto espaço de tempo torna difícil uma relação mais profunda.

Além disso, a série ainda sofre com alguns vícios novelescos, como o excesso de falas explicativas: várias cenas são construídas para passarem uma mensagem sozinhas, sem a necessidade de diálogo, mas mesmo assim o personagem que está em cena narra o óbvio, tirando o brilho e a imersão do público, que começa a construir o significado do que está vendo na tela, mas rapidamente ganha a resposta pronta.

Outro problema é a marcação de núcleos com a trilha sonora: se a cena está no Rio, toca bossa nova; se há um corte para o morro, começa a tocar um samba - ou seja: utilizar isso para pontuar núcleos é desnecessário.

Felizmente, os problemas citados não atrapalham o objetivo principal da série, que é retratar a juventude e a realidade social de uma época.

As mulheres estão na linha de frente e cada uma aborda um tema.

Quando descobre que o marido a abandonou por outra, Malu precisa aprender a cuidar do próprio dinheiro e resolver sua vida sozinha, já que até então essas tarefas eram consideradas masculinas.

Lígia tem um marido que não concorda com sua carreira de cantora e é interessante perceber como, no começo, a personagem mente para si mesma, dizendo que também concorda com aquilo e não seria boa nisso no fim das contas.

No fundo do coração, ela não pensa dessa forma, mas prefere mentir para se adequar e evitar brigas, comportamento muito comum entre as mulheres com relacionamentos complicados.

Theresa, que tem a relação mais desconstruída de todas, traz para o seriado a questão do mercado de trabalho.

Ela escreve para uma revista feminina da época, mas é a única mulher da redação: a publicação é totalmente escrita por homens que assinam os textos com nomes de mulheres.

Não é segredo o quanto revistas de comportamento influenciam jovens e adultas e o resultado de um material escrito totalmente por homens é que são eles que ditam o que é tendência e quais são os comportamentos “adequados” daquela sociedade.

Além disso, há o próprio dia a dia da redação, em que Theresa ouve os pequenos preconceitos que estão normalizados ali: já temos uma mulher, não precisa de outra; mulheres são muito emotivas; essa é muito jovem, vai engravidar logo.

E há Adélia, a mulher negra que traz uma luta totalmente diferente de todas essas citadas acima, porque além de lidar com tudo isso, ela também enfrenta o racismo.

A série é certeira ao mostrar que não são grandes vilões e monstros que discriminam Adélia pela cor de sua pele.

Ela ouve isso de pessoas cruéis, mas também ouve das próprias amigas e pessoas próximas, revelando que o preconceito pode estar em qualquer pessoa e precisa ser trabalhado.

Há ainda outro ponto interessante: assim como as outras mulheres, Adélia conquista seu espaço com o desenvolvimento dos episódios, mas o racismo não muda: ele está do primeiro ao último episódio, evidenciando o quanto o peso que ela carrega é muito maior do que das outras.

Por fim, a série mostra o quanto o machismo daquele tempo também prejudica os homens.

Claro, a carga deles é menor, mas eles também sofrem, por exemplo, quando uma mãe chama os filhos de “fracos” porque eles demonstram sentimentos.

Se as mulheres da época precisavam ser delicadas e donas de casa, os homens tinham o papel de ser fortes e provedores - e qualquer coisa que saísse desse padrão era considerado errada.

Como dito anteriormente, a série termina com um gancho interessante para a segunda temporada- já confirmada pela Netflix, com todos esses temas, há muito potencial para o desenvolvimento de discussões e personagens interessantes.

É preciso corrigir a questão do ritmo e dos diálogos expositivos, tão comuns na TV aberta, mas se tiver coragem para fazer isso, Coisa Mais Linda é uma aposta promissora (e encantadora) para o futuro.

CONFIRA O ANÚNCIO DA SEGUNDA TEMPORADA: 


CONFIRA ENTREVISTA COM O ELENCO:


TRAILER:



FICHA TÉCNICA:
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Coisa Mais Linda
Status:
Em andamento (2019- )
Estrelando:
Maria Casadevall, Pathy Dejesus, Fernanda Vasconcellos, Mel Lisboa
Criação:
Heather Roth, Giuliano Cedroni
Primeiro ano:
7 episódios
Exibição:
Netflix

COTAÇÃO DO KLAU:


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